Post on 05-Mar-2021
ORGANIZADORES
Marcelo Rodrigues Gonçalves
Roberto Nunes Umpierre
Otávio Pereira D’Avila
Ricardo Heinzelmann
Lígia Trevisan
Erno Harzheim
UFRGS
2017
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
2
Marcelo Rodrigues Gonçalves
3
Roberto Nunes Umpierre
Otávio Pereira D’Avila
Ricardo Heinzelmann
Ligia Trevisan
Erno Harzheim
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE NO BRASIL
Porto Alegre
2017
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
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Permitida a reprodução parcial ou total da obra, desde que citada a fonte e que não envolva fins comerciais.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
Faculdade de Medicina
Programa de Pós-Graduação em Epidemiologia
TelessaúdeRS-UFRGS
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E-mail: contato@telessauders.ufrgs.br
Organização:
Marcelo Rodrigues Gonçalves
Roberto Nunes Umpierre
Otávio Pereira D’Avila
Ricardo Heinzelmann
Lígia Trevisan
Erno Harzheim
Colaboração:
Anderson Beltrame
João Paulo Pinheiro
Lucas Matturro
Maria Aparecida Araújo
Priscila Santos
Vinicius Silva da Silveira
Revisão:
Ana Célia da Silva Siqueira
Ana Paula Borngraber Correa
Normalização:
Rosely de Andrade Vargas
Capa:
Carolyne Vasques Cabral
Desafios da atenção primária à saúde no Brasil / Marcelo Rodrigues
Gonçalves.... [et al.]. – Porto Alegre : UFRGS, 2017. 85 p.
ISBN: 978-85-63843-21-0
1. Atenção primária à saúde. 2. Gestão em saúde. 3. Sistema Único de
Saúde. I. Gonçalves, Marcelo Rodrigues. II. Título.
NLM: W 84.6
SUMÁRIO
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SUMÁRIO
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS 7
INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO 1 - ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE NO BRASIL 10
CONCEITOS E ATRIBUTOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE 10
Cobertura de APS e acesso 12
Financiamento e responsabilidades interfederativas 13
Infraestrutura das unidades básicas de saúde 13
Gestão do trabalho e da educação na saúde 14
Planejamento, monitoramento e avaliação 16 Articulação e estruturação dos sistemas de apoio e logístico 16
CAPÍTULO 2 - ACESSO NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE 18
ACESSO NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE 18 Ampliação do acesso: por onde começar? 21
CAPÍTULO 3 - MUDANÇAS PARA AMPLIAÇÃO DO ACESSO À SAÚDE
ORGANIZAÇÃO DO ACESSO E AGENDA DOS PROFISSIONAIS 24
Modelo tradicional 24
Sistema com Vagas 24
Acesso Avançado 25
Revisão da conformação do trabalho 27 Processo de trabalho 30
CAPÍTULO 4 - GERENCIAMENTO DA AGENDA 34 PLANEJAR E MONITORAR PARA MELHORAR O ATENDIMENTO 34
CAPÍTULO 5 - ORGANIZAÇÃO DAS EQUIPES 38
Reuniões de equipes 38
Carteira de serviços na APS 41
Procedimentos a serem realizados nas UBS 42
Organização de grupos de usuários 43 Visitas e atendimentos domiciliares 44
CAPÍTULO 6 - GRUPOS NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE 46
Tipos de grupos 47
Pontos a considerar na formação de grupos 50
Condução dos grupos 51
Grupos realizados na APS: considerações 52
Tabagismo 52
Gestantes 53
Grupo de cuidadores 54
Grupos e saúde mental 54
Terapia comunitária 56
Consulta coletiva 57
Grupos & Educação em Saúde 58
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
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CAPÍTULO 7 - GESTÃO MUNICIPAL: AÇÕES PARA QUALIFICAR OS SERVIÇOS
60 Estrutura organizacional da APS nas Secretarias Municipais de Saúde 61
Apoio institucional das equipes 61
Gestão do trabalho 62
Financiamento da APS 64
Planejamento, monitoramento e avaliação 65
Educação permanente 67
Assistência farmacêutica 69
Informatização das redes de APS 70 Controle social e participação popular
72
REFERÊNCIAS 73
7
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AB Atenção Básica
ABRASCO Associação Brasileira de Pós-graduação em Saúde Coletiva
ACE Agente de Combate às Endemias
ACS Agente Comunitário de Saúde
APS Atenção Primária à Saúde
ASB Auxiliar de Saúde Bucal
CAPS Centro de Atenção Psicossocial
CIAP Classificação Internacional de Atenção Primária
CID-10 Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde
CIES Comissão de Integração Ensino-Serviço
CONASEMS Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde
CONASS Conselho Nacional de Secretários de Saúde
CNES Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde
CRAS Centro de Referência de Assistência Social
DATASUS Departamento de Informática do SUS
DPOC Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica
ESF Estratégia de Saúde da Família
INCA Instituto Nacional de Câncer
NASF Núcleos de Apoio à Saúde da Família
PEP Programa de Educação Permanente de Médicos de Família
PMAQ Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade
PNAB Política Nacional de Atenção Básica
PNH Política Nacional de Humanização
PNEPS Política Nacional de Educação Permanente em Saúde
PSF Programa de Saúde da Família
RAS Rede de Atenção à Saúde
SBMFC Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade
SIAB Sistema de Informação de Atenção Básica
SIOPS Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Saúde
SISAB Sistema de Informação da Atenção Básica
SUS Sistema Único de Saúde
TE Técnico em Enfermagem
TSB Técnico em Saúde Bucal
UBS Unidade Básica de Saúde
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
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INTRODUÇÃO
No Brasil, em 1990, com a nova Constituição, a influência das Conferências
Nacionais e Internacionais de Saúde e da realidade política e sanitária do país, cria-se
um novo arranjo na saúde pública (CONNIL, 2008). O Sistema Único de Saúde (SUS),
resultado deste cenário, estabelece como princípios de saúde a universalidade do
acesso, a integralidade do cuidado e a equidade (BRASIL, 1990). A partir desse
momento, ocorrem transformações nos serviços de saúde pública brasileiros, no
sentido de organizar o sistema a partir de uma Atenção Primária à Saúde (APS) que
represente um serviço que ofereça a entrada para todas as necessidades em saúde,
forneça atenção as condições de saúde mais frequentes e coordena a atenção
fornecida, conforme o proposto por Starfield (2002). Esse esforço culminou com a
criação do Programa Saúde da Família (PSF) em 1994, hoje reconhecido como
elemento estratégico na reorientação do modelo de saúde no país, que passou a ser
denominado Estratégia Saúde da Família (ESF) (CONNIL, 2008).
Países ou regiões que conseguiram organizar uma APS mais forte apresentam
melhores desfechos de saúde. As evidências sugerem que serviços de APS melhor
organizados estão associados com menores taxas de internações por condições
sensíveis à APS e menor crescimento dos gastos em saúde (TRINDADE, 2007;
GONÇALVES, 2013; KRINGOS 2013). Desta forma, a APS tem se caracterizado por
representar uma grande aposta para o desenvolvimento de um sistema de saúde
organizado em rede e coordenado a partir da mesma.
Esse e-book reúne uma coletânea de textos elaborados para um curso de
atualização em Atenção Primária à Saúde, denominado Qualifica APS, que teve como
público-alvo profissionais de saúde que atuam na APS.
O livro é composto por sete capítulos divididos em:
1. Atenção Primária à Saúde no Brasil: apresenta conceitos e atributos da APS
e um panorama geral da estruturação da APS no Brasil e desafios a serem
superados.
2. Acesso na Atenção Primária à Saúde: discorre a respeito das características
fundamentais do acesso e sua organização a partir da Política Nacional de
Atenção Básica (PNAB).
3. Mudanças para Ampliação do Acesso à Saúde: descreve ferramentas para
ampliação do acesso, em especial, o acesso avançado. Além disso, especifica
atribuições de cada componente da equipe no processo de trabalho
proposto.
4. Gerenciamento da Agenda na Atenção Primária à Saúde: aborda
mecanismos de gerenciamento da agenda serve para evitar que a
disponibilidade de agenda esteja muito distante e para que a APS possa
9
atender os casos de urgência, evitando encaminhamentos para pronto-
atendimentos, sendo essencial para garantir a resolutividade do acesso.
5. Organização da Equipe de Atenção Primária à Saúde – Atividades
Estratégicas: neste capítulo, são apontadas algumas temáticas que merecem
atenção por parte das equipes e gestores, por fazer parte do cotidiano, sem
muitas vezes se dar o seu devido olhar estratégico para qualificação dos
serviços. Mais do que a sistematização de evidências da literatura, são
apontamentos no formato de reflexões e sugestões a partir da observação
e acompanhamento de diversas experiências de conformação e organização
das equipes de APS em muitas cidades brasileiras.
6. Grupos na Atenção Primária à Saúde: apresenta metodologias utilizadas
para atividades em grupos na APS e considerações quanto a alguns aspectos
referentes a grupos que são realizados com frequência nesse contexto.
7. Gestão Municipal – Ações Estratégicas Para Qualificação dos Serviços: são
listados alguns eixos estratégicos que servem de sugestões para organizar a
ação da gestão municipal de saúde no sentido de qualificar os serviços de
APS.
A Atenção Primária à Saúde tem se tornado cada vez mais reconhecida como
elemento fundamental na estruturação de sistemas de saúde. Apesar disso, ela ainda
sofre da não efetivação de suas características e sob o constante risco de ter suas
funções simplificadas e banalizadas. Nesse sentido, é preciso superar os desafios e
instituir um novo ciclo que permita a APS se consolidar em seu papel organizacional
de uma rede de atenção à saúde.
Este e-book tem como objetivo apresentar ferramentas para instrumentalizar
os profissionais da APS quanto a organização do processo de trabalho nas Unidades
Básicas de Saúde (UBS), onde atuam a partir de experiências relatadas e evidências
publicadas nos últimos anos. Além disso, objetiva sensibilizar os leitores para uma
mudança em hábitos e rotinas estabelecidas em seus ambientes de trabalho para um
caminho que permita a construção de uma APS forte, resolutiva e coordenadora de
uma rede de serviços.
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
10
CAPÍTULO 1
ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE NO BRASIL
CONCEITOS E ATRIBUTOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
Diversos estudos internacionais apontam a superioridade de sistemas de saúde
que têm uma Atenção Primária à Saúde (APS) fortalecida, sendo coordenadora do
cuidado e ordenadora das Redes de Atenção à Saúde. No livro Atenção Primária:
Equilíbrio entre Necessidades de Saúde, Serviços e Tecnologias, Starfierld (2002) cita
uma pesquisa que coordenou, em 1994, para medir “a força da Atenção Primária” em
12 países, industrializados e considerados ricos, com sistemas de saúde distintos. Os
resultados indicam que a ausência de APS gera pior desempenho em saúde e maior
custo para o sistema.
Starfield (1992) define a APS como o primeiro nível de assistência dentro do
sistema de saúde, caracterizando-se, principalmente, pela continuidade e
integralidade da atenção, além da coordenação da assistência dentro do próprio
sistema, da atenção centrada na família, da orientação comunitária das ações e da
competência cultural dos profissionais. A APS é o centro de comunicação da rede de
atenção à saúde, no qual se coordenam os fluxos e os contrafluxos do sistema de
serviços de saúde.
A definição operacional da APS sistematizada por Starfield é largamente
utilizada no Brasil. A partir dessa definição, conceituam-se os quatro atributos
essenciais dos serviços de APS (STARFIELD, 2002):
1. Acesso de primeiro contato do indivíduo com o sistema de saúde:
acessibilidade e utilização do serviço de saúde como fonte de cuidado a
cada novo problema ou novo episódio de um mesmo problema de
saúde, com exceção das verdadeiras emergências e urgências médicas.
2. Longitudinalidade: existência de uma fonte contínua de atenção, assim
como sua utilização ao longo do tempo. A relação entre a população e
sua fonte de atenção deve se refletir em uma relação interpessoal intensa
que expresse a confiança mútua entre os usuários e os profissionais de
saúde.
3. Integralidade: leque de serviços disponíveis e prestados pelo serviço de
atenção primária. Ações que o serviço de saúde deve oferecer para que
os usuários recebam atenção integral, tanto do ponto de vista do caráter
biopsicossocial do processo saúde-doença, como ações de promoção,
prevenção, cura e reabilitação adequadas ao contexto da APS, mesmo
que algumas ações não possam ser oferecidas dentro das unidades de
11
APS. Incluem os encaminhamentos para especialidades médicas focais,
hospitais, entre outros.
4. Coordenação da atenção: pressupõe alguma forma de continuidade seja
por parte do atendimento pelo mesmo profissional, seja por meio de
prontuários médicos, ou ambos, além do reconhecimento de problemas
abordados em outros serviços e a integração deste cuidado no cuidado
global do paciente. O provedor de atenção primária deve ser capaz de
integrar todo cuidado que o paciente recebe através da coordenação
entre os serviços.
Outras três características, chamadas atributos derivados, qualificam as ações dos
serviços de APS (STARFIELD, 2002):
1. Orientação familiar: na avaliação das necessidades individuais para a
atenção integral deve-se considerar o contexto familiar e seu potencial
de cuidado e, também, de ameaça à saúde, incluindo o uso de
ferramentas de abordagem familiar.
2. Orientação comunitária: reconhecimento por parte do serviço de saúde
das necessidades em saúde da comunidade através de dados
epidemiológicos e do contato direto com a comunidade; sua relação com
ela, assim como o planejamento e a avaliação conjunta dos serviços.
3. Competência cultural: adaptação do provedor (equipe e profissionais de
saúde) às características culturais especiais da população para facilitar a
relação e a comunicação com a mesma.
Lançada em 2006, a Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) foi revisada e
atualizada em 2011. Segundo a PNAB, a APS caracteriza-se por um conjunto de ações
de saúde, no âmbito individual e coletivo, que abrange a promoção e a proteção da
saúde, a prevenção de agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação, redução
de danos e a manutenção da saúde com o objetivo de desenvolver uma atenção
integral que impacte na situação de saúde e autonomia das pessoas e nos
determinantes e condicionantes de saúde das coletividades. É desenvolvida por meio
do exercício de práticas de cuidado e gestão, democráticas e participativas, sob forma
de trabalho em equipe, dirigidas a populações de territórios definidos, pelas quais
assume a responsabilidade sanitária, considerando a dinamicidade existente no
território em que vivem essas populações. Utiliza tecnologias de cuidado complexas
e variadas que devem auxiliar no manejo das demandas e necessidades de saúde de
maior frequência e relevância em seu território, observando critérios de risco,
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
12
vulnerabilidade, resiliência e o imperativo ético de que toda demanda, necessidade
de saúde ou sofrimento devem ser acolhidos.
A APS é desenvolvida com o mais alto grau de descentralização e capilaridade,
próxima da vida das pessoas. Deve ser o contato preferencial dos usuários, a principal
porta de entrada e centro de comunicação da Rede de Atenção à Saúde (RAS).
Orienta-se pelos princípios da universalidade, da acessibilidade, do vínculo, da
continuidade do cuidado, da integralidade da atenção, da responsabilização, da
humanização, da equidade e da participação social. A APS considera o sujeito em sua
singularidade e inserção sociocultural, buscando produzir a atenção integral à saúde
(BRASIL, 2011). Portanto, temos a necessidade de reorientar o modelo de atenção à
saúde a partir do fortalecimento da APS. Observa-se que há uma clara opção da
Política Nacional de Atenção Básica pelo incentivo à Estratégia de Saúde da Família
(ESF).
O desafio é ainda maior considerando o cenário de transição epidemiológica
do país. Há um aumento considerável de demandas de cuidados relacionados às
condições crônicas (neoplasias, hipertensão, diabetes, doenças respiratórias como
Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica - DPOC e asma), ao mesmo tempo em que há
ampliação da mortalidade por causas externas (violência, acidentes de trânsito) e
persiste a importância das doenças transmissíveis no perfil epidemiológico brasileiro,
a exemplo da sífilis, HIV/AIDS, hepatites, meningites e tuberculose (MENDES, 2012).
Nosso sistema de saúde ainda está voltado para atenção de eventos agudos e
agudização das condições crônicas. Ainda há um grande caminho a percorrer para
darmos conta desta reorientação de modelo de atenção à saúde necessária para o
melhor cuidado da nossa população (MENDES, 2011) que passa pelo fortalecimento
da APS. São inúmeros os desafios neste sentido, sendo que alguns são apontados ao
longo deste texto.
Cobertura de APS e acesso
Um primeiro desafio é a expansão de cobertura da APS, tendo como referência
a Estratégia Saúde da Família. No Brasil, há muitos municípios onde uma parcela
significativa da população não é coberta por equipes da APS, em especial a população
dos grandes centros urbanos. No processo, deve-se atentar à noção de acesso, pois
ter cobertura de saúde da família, não significa automaticamente ter um bom acesso
a cuidados de APS. Pesquisas realizadas em diversas cidades brasileiras apontam que,
em relação aos atributos da APS, o acesso/primeiro contato é o atributo pior avaliado,
mesmo em municípios com boas coberturas de Saúde da Família (CHOMATAS, VIGO,
HARZHEIM, 2010; HARZHEIM, HAUSER, PINTO, 2015).
Em muitas UBS, conforme organização do processo de trabalho, se observa que,
de forma involuntária, são criadas barreiras de acesso aos usuários, como o uso de
fichas para marcação de consultas como único formato de acesso, ou restrição da
agenda dos profissionais para cuidados de grupos programáticos, como, por
13
exemplo, criação de turnos de atendimento apenas de hipertensos e/ou diabéticos.
Muitas vezes apenas uma parcela da população adstrita na área da UBS utiliza os
serviços da UBS (BRASIL, 2013).
Financiamento e responsabilidades interfederativas
Outro aspecto essencial é a lógica de financiamento do SUS. O financiamento
público na saúde no Brasil ainda é pequeno se comparado com outros países e, em
especial, quando se tem a proposição de um sistema de saúde universal. Em 2007,
por exemplo, apenas 8,4% do Produto Interno Bruto (PIB) foi gasto com a saúde. A
proporção pública da despesa com saúde no ano, segundo Paim et al. (2011), foi de
41,8%, um valor baixo quando comparado a países da Europa, como Reino Unido
(82%), Itália (77,2%) e Espanha (71,8%), e também inferior a de países da América do
Norte, como EUA (45,5%) e México (46,9%).
Também deve ser considerado que em função da lógica tributária no Brasil, há
uma profunda dependência dos municípios em relação ao repasse de recursos das
outras esferas de gestão, em especial do Governo Federal. De certa forma, isso inibe
a possibilidade dos municípios desenvolverem arranjos de APS diferentes da proposta
financiada pelo Ministério da Saúde. Em alguns casos, essa é uma grande limitação,
por não reconhecer grandes diferenças regionais que demandam diferentes arranjos
organizacionais da APS a exemplo da Amazônia, cidades do interior do nordeste e
grandes centros urbanos do sudeste e sul do país.
Ao analisar a série histórica de repasses de recursos do Ministério da Saúde,
observa-se uma contradição do orçamento federal para saúde. Apesar de se buscar
a construção de uma APS fortalecida, com ampla cobertura da população e
capacidade resolutiva, o seu financiamento ainda é muito pequeno se comparado
com os valores repassados para atenção especializada e hospitalar (MENDES;
MARQUES, 2014). Há uma contradição na lógica de financiamento, sendo indutor da
manutenção do sistema centrado na realização de procedimentos de alto custo,
voltado para cuidados de condições agudas.
Infraestrutura das unidades básicas de saúde
Um estudo recente, que toma por base a avaliação externa do Programa de
Melhoria do Acesso e da Qualidade (PMAQ), aponta para a necessidade de revisão
completa da estrutura física, equipamentos e insumos de parcela significativa das
Unidades Básicas de Saúde (GIOVANELLA et al., 2015). As UBS devem ser estruturadas
de forma a garantir o desenvolvimento pleno do conjunto de ações da equipe, a
exemplo da realização de procedimentos, curativos, imunizações, consultas médica,
do enfermeiro e do cirurgião-dentista, espaço reservado para a escuta inicial do
acolhimento do usuário, sala de observação, sala de reuniões, recepção. Deve-se
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
14
garantir padrão mínimo de ambiência visando o conforto dos usuários e dos
profissionais das equipes. Um exemplo é a oferta de brinquedotecas nas UBS e
poltronas de aleitamento materno.
Muitas vezes equipamentos básicos para funcionamento da Unidade estão
ausentes, a exemplo de estetoscópio, foco de luz, maca para exame ginecológico
entre outros. Pode parecer absurdo imaginar UBS sem estes equipamentos, mas é a
realidade de muitas Unidades de Saúde em cidades de grande e pequeno porte.
Para serem resolutivas, as UBS precisam estar bem equipadas, com mobiliário
adequado e elenco de insumos. Glicosímetro, nebulizador, oftalmoscópio, otoscópio,
sonar/detector fetal são exemplos de equipamentos que contribuem para aumento
da resolutividade da equipe. Também é necessária a disponibilização de carros para
deslocamento das equipes para realização de atendimento domiciliar em UBS, em
especial nas áreas rurais ou UBS com grande extensão territorial de referência.
Deve-se acelerar o processo de incorporação de diversas Tecnologias no
cotidiano da APS. O uso de Prontuários Clínicos e de Encaminhamento possibilitam
uma melhor resolutividade na APS, melhor organização da UBS, ampliação da
capacidade clínica/assistencial dos diversos profissionais da equipe, bem como
otimização de recursos. O prontuário eletrônico é um exemplo da importância do uso
de Tecnologias de Informação e Comunicação para melhoria da gestão da clínica na
APS. A partir dele também se pode garantir uma melhor integração com outros
serviços de saúde e pontos da Rede de Saúde.
Gestão do trabalho e da educação na saúde
A valorização dos trabalhadores da APS é também um passo importante. O
estabelecimento de processos de provimento e fixação de profissionais em municípios
de menor porte populacional e em periferias de grandes centros urbanos são passos
necessários neste sentido (GIRARDI, 2010). A implantação de carreiras para
profissionais da APS atreladas à remuneração variável e avaliação de desempenho
servem de estímulo para parcela significativa dos profissionais. É fundamental o
investimento contínuo em ações de educação permanente dos profissionais que já
atuam na APS, com ofertas de cursos, oficinas, rodas de discussão e atualizações
coerentes com as demandas dos profissionais, das necessidades de saúde da
população e prioridades da gestão.
Outro aspecto fundamental se relaciona à formação de profissionais voltada
para a APS. Além do aprofundamento da mudança na graduação dos cursos da área
da saúde, a ampliação da Residência em Medicina de Família e Comunidade e
Multiprofissional em Saúde da Família são aspectos essenciais para o avanço da APS
no Brasil. A formação em nível técnico também precisa ser aprofundada
15
principalmente em relação aos Técnicos de Saúde Bucal (TSB), Técnicos de
Enfermagem (TE) e aprimoramento da formação dos Agentes Comunitários de Saúde
(ACS). Cada vez mais, as UBS devem se tornar um espaço de ensino-aprendizagem.
De forma predominante, as ofertas de educação para equipes de APS são
confundidas com processos de atualização e treinamentos para manejo de condições
especificas. Embora tenham a devida importância como ação de educação
continuada, da forma como são conduzidos, esses processos não permitem, na maior
parte das vezes, a adequada reflexão sobre temas e demandas estratégicos para o
bom funcionamento das equipes. A própria metodologia utilizada nas atualizações e
treinamentos pode ser questionada no momento em que na maioria dos casos não
se produz a mudança da prática profissional que se esperava.
Nos momentos de educação, a análise e busca de aprimoramento do processo
de trabalho das equipes devem ser priorizados. Um exemplo é a mudança de fluxos
dentro da UBS para adoção acesso avançado durante todo o tempo de
funcionamento da Unidade, definição de critérios para priorização de visitas e
atendimentos domiciliares, revisão da oferta e funcionamento de grupos de usuários,
formato das reuniões de equipe e fluxos para garantia da realização de
procedimentos, curativos, nebulização, testes rápidos, vacinas também durante todo
o horário de funcionamento da UBS. Esses são aspectos essenciais no debate sobre a
qualificação do processo de trabalho das equipes da APS. Para ocorrer, tal debate
necessita de maior suporte e aproximação com gestões municipais. A adoção da
proposta de apoio institucional pode ser utilizada para provocar reflexões, trocas de
experiências e disparar mudança das práticas de cuidado na APS. Algumas
experiências no país relatam o uso do apoio institucional como dispositivo para
melhor aproximação da gestão com as equipes de cuidado e melhor
acompanhamento da dinâmica e demandas do cotidiano de produção dos serviços
de saúde (FALLEIRO, 2014; FAGUNDES et al., 2014).
O envolvimento de usuários com a criação de dispositivos de ampliação da
participação da população no dia a dia da UBS são aspectos que devem aparecer no
movimento de reorganização das UBS. Estratégias de adoção de pesquisas de
satisfação de usuários, ouvidoria ativa, conselhos locais de saúde tendem a melhorar
a relação da equipe de APS com a população adscrita à UBS, melhorando vínculo,
adesão a ofertas de atividades de prevenção e promoção da saúde. A relação é
fundamental no processo de mudança do processo de trabalho das equipes, a
exemplo da implantação do acolhimento à demanda espontânea e superação do
modelo arcaico de distribuição de fichas para atendimento.
A adoção de diretrizes orientadoras do Modelo de Atenção às Condições
Crônicas demanda uma repactuação das atribuições de cada profissional na equipe,
com ampliação da capacidade clínica/assistencial dos enfermeiros e técnicos de
enfermagem. Neste processo é fundamental a estratificação de risco dos usuários
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
16
com condições crônicas para definição do melhor manejo clínico para cada caso. A
utilização de ferramentas de vigilâncias das condições de saúde da população
adscrita, a exemplo das planilhas eletrônicas, auxilia em muito no aprimoramento das
ofertas de cuidado de forma singular com a necessidade de cada usuário. Este
movimento ajuda em muito também na ampliação do leque de ofertas da equipe,
tirando o foco da consulta médica como único recurso terapêutico.
Planejamento, monitoramento e avaliação
Todos os aspectos mencionados até aqui devem fazer parte de um amplo
movimento de planejamento, seguido de monitoramento e avaliação. Monitoramento
e Avaliação devem ser incorporados como parte do cotidiano das práticas de cuidado
e da gestão na APS (BRASIL, 2011). Trabalhar com definição de metas e análise de
indicadores auxilia de forma determinante no processo de organização e
aprimoramento da qualidade do cuidado que se oferta na APS. As equipes devem
periodicamente analisar indicadores de produção (número de consultas agendadas,
consultas de demanda espontânea, consultas de pré-natal, tratamento odontológico
concluído, visitas e atendimentos domiciliares, etc.) e comparar com estimativas de
planilhas de parâmetros de programação de atendimento. Desta forma, pode-se
identificar possíveis falhas na busca ativa de usuários ou no acompanhamento de
pacientes com condições crônicas. A gestão deve acompanhar este processo
fornecendo apoio para solucionar possíveis dificuldades da equipe.
Articulação e estruturação dos sistemas de apoio e logístico
Parcela significativa das equipes de APS no país ressente-se da limitação da sua
capacidade resolutiva em função de não poder contar em tempo oportuno serviços
de apoio diagnóstico e terapêutico. A lógica de distribuição de cotas mensais de
exames e consultas especializadas por UBS, sem prévia análise de critérios
epidemiológicos e clínicos, nem adoção de protocolos, ainda é hegemônica no Brasil.
Em diversos municípios esta situação é ainda pior, quando o próprio usuário com a
solicitação de exame ou consulta especializada em mãos precisa peregrinar em busca
do agendamento. O resultado disso são filas de espera de meses para consultas com
especialidades ou realização de exames, o que prejudica o manejo adequado de
usuários na APS.
Destaca-se aqui um dos maiores entraves para mudança do Modelo de Atenção
à Saúde que é a necessidade de melhor articulação da APS com os demais pontos de
atenção das Redes de Saúde, a exemplo da atenção especializada e hospitalar e o
aprimoramento dos sistemas de apoio e sistemas logísticos das Redes (ALMEIDA;
FAUSTO; GIOVANELLA, 2011). Para além da melhor estruturação de processos
regulatórios com protocolos pactuados e a devida integração regional/estadual, a
melhoria do grau de informatização da rede com adoção de prontuários eletrônicos
17
e eficientes sistemas de informação podem facilitar o acesso regulado, ágil e em
tempo oportuno dos usuários que demandem a realização de consultas
especializadas e exames, garantindo-se a contrarreferência para as equipes (MENDES,
2011).
Complementar a este processo, o transporte em saúde de pessoas para
consultas e exames eletivos necessita ser melhor problematizado e pactuado nas
instâncias gestoras do SUS. Sem a padronização e financiamento para este
componente do sistema logístico das Redes, mantém-se entraves de acesso e
algumas iniquidades, a exemplo daqueles usuários que vivem em municípios mais
distantes e de menor renda terem que contar com transportes improvisados ou sem
a devida padronização de prefeituras ou recursos próprios para locomoção até as
cidades que ofertam serviços especializados.
A melhor organização da assistência farmacêutica no âmbito da APS e o uso
racional de medicamentos também merecem ser apontados. O acesso a
medicamentos essenciais, definição de local de dispensação/entrega, atenção
farmacêutica, aprimoramento do elenco de medicamentos são temas que necessitam
aprofundamento para operacionalização na APS. São grandes desafios para termos
no Brasil uma Atenção Primária à Saúde ordenadora das Redes de Atenção e
Coordenadora do Cuidado. Movimentos no sentido da maior valorização social e
política da APS no Brasil são fundamentais. Todos os profissionais e gestores do SUS
se deparam com estes temas estratégicos no seu cotidiano de trabalho.
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
18
CAPÍTULO 2
ACESSO NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
A APS caracteriza-se por ações de saúde que abrangem promoção à saúde,
prevenção de agravos, diagnóstico, tratamento e reabilitação, além da redução de
danos. Visa desenvolver uma atenção integral que impacte na situação de saúde, na
autonomia das pessoas e nos determinantes ou condicionantes de saúde (BRASIL,
2011). A tarefa da APS não é simples. A APS precisa dar resposta a uma ampla gama
de problemas, o que exige um planejamento de ações baseado em evidências. O
funcionamento da unidade tem que ser organizado de modo a dar reposta tanto para
eventos agudos quanto para condições crônicas.
As condições crônicas são condições ou patologias que têm um ciclo de vida
superior a três meses e que não se autolimitam (VON KORFF et al., 1997). Assim,
exigem que a equipe se organize para o acompanhamento do usuário ao longo do
tempo. São exemplos tanto doenças como Hipertensão e Diabetes como também
condições como a gestação e a primeira infância. Infecções como Síndrome da
Imunodeficiência Adquirida (SIDA ou AIDS) e tuberculose podem ser incluídas nessa
classificação. Muitos quadros agudos atendidos nas emergências e pronto-
atendimentos poderiam ser solucionados na APS.
Do ponto de vista clínico, a APS recebe queixas na maioria das vezes
inespecíficas, o que exige do profissional um raciocínio clinico apurado e intervenções
diferentes dos serviços de especialidades, que, em geral, recebem as pessoas com
quadros mais definidos ou mesmo já diagnosticadas (GUSSO; LOPES, 2012). O bom
funcionamento da APS está ligado a uma série de fatores, entre eles o acesso. A
facilidade/dificuldade do acesso está diretamente relacionada à possibilidade da APS
ser ponto de primeiro contato no sistema de saúde. De acordo com Starfield (2002)
“A Atenção ao primeiro contato implica acessibilidade e uso do serviço a cada novo
problema ou novo episódio de um problema pela qual as pessoas buscam atenção à
saúde” (p. 61). Um serviço não oferece atenção ao primeiro contato a menos que seus
usuários o percebam como acessível e isso se reflita na sua utilização. Muitas questões
influenciam na acessibilidade tais como barreiras geográficas (proximidade do local
em que as pessoas residem) e barreiras organizacionais como, por exemplo,
disponibilidade de atenção depois do horário comercial, dias de espera para obter
uma consulta e tempo na sala de espera até consultar.
Pesquisa que descreveu e analisou ações empreendidas em quatro centros
urbanos para fortalecer a Estratégia Saúda da Família, principal formato da APS no
Brasil, concluiu que:
[...] os municípios brasileiros enfrentam problemas que comprometem a condição da APS como porta de entrada preferencial do sistema, como por exemplo, horários restritos de funcionamento, dificuldade de manejo da demanda espontânea e baixa resolutividade (ALMEIDA; FAUSTO; GIOVANELLA, 2011, p. 92).
19
O estudo mostrou que parte importante dos usuários entrevistados não buscou
a ESF em seu episódio mais recente de adoecimento, o que poderia estar associado
às barreiras de acesso para atendimento da demanda espontânea na ESF, agravadas
pelas longas filas de espera e dificuldades de integração com a atenção especializada.
Outra pesquisa, que envolveu a participação de 41% das equipes de ESF no país e de
usuários revelou que, em relação à condição de ser porta de entrada preferencial,
segundo os usuários, muitas equipes utilizam o sistema de fichas, sendo necessário
fazer fila antes da abertura da unidade para realizar marcação de consultas (FAUSTO
et al., 2014).
A percepção das Equipes de ESF em geral é mais positiva do que a dos usuários.
Enquanto os profissionais percebem seus serviços como “porta aberta”, os usuários
avaliam que é preciso realizar avanços quanto à organização funcional, no que diz
respeito ao acolhimento, à disponibilidade para consultas de urgência e às formas de
acesso às consultas (FAUSTO et al., 2014; CASTRO, 2009). Os dados indicam que é
necessário que profissionais e gestão realizem mais escuta ativa dos usuários e que
existem desafios a serem enfrentados para que a APS se configure como porta aberta
e serviço de primeiro contato, garantindo a universalidade do acesso e uso contínuo
aos serviços de APS.
O Caderno de Atenção Básica n° 28 cita o acolhimento como uma ferramenta
que quer trazer para o debate o papel de cuidador do profissional de saúde e a
importância da responsabilização pelo usuário. É um modo de operar os processos
de trabalho em saúde, de forma a atender a todos que procuram os serviços de
saúde, ouvindo seus pedidos e assumindo no serviço uma postura capaz de acolher,
escutar e dar respostas mais adequadas aos usuários. Ou seja, requer prestar um
atendimento com resolutividade e responsabilização, orientando, quando for o caso,
o paciente e a família em relação a outros serviços de saúde, para a continuidade da
assistência, e estabelecendo articulações com esses serviços, para garantir a eficácia
desses encaminhamentos (BRASIL, 2010b, p. 21).
Qualificar o acesso não é a mesma coisa que triagem ou aferição de sinais vitais
pelo técnico de enfermagem – não se trata de uma etapa para chegar na consulta
médica. Tal prática, quando obrigatória para todos os usuários atendidos na APS,
resulta numa burocratização do acesso ao invés de uma facilitação. O atendimento
através de quotas ou fichas também não é condizente com acolhimento, porque,
apesar de oferecer atendimento para o mesmo dia para alguns, leva a exclusão de
usuários sem escuta - geralmente daqueles menos organizados para pegar a ficha (e
que, em geral, mais precisam) desrespeitando o princípio da equidade.
Existem muitas formas de fazer modificações para ampliar o acesso, com
potencialidades e dificuldades em cada modelagem adotada. Além disto, os fluxos
adotados por cada equipe podem ser provisórios, de forma que sejam realizados
ajustes necessários no dia-a-dia de trabalho. Alguns padrões, no entanto, podem ser
afirmados sobre os fluxos dos usuários nas UBS. Abordaremos alguns deles através
do exemplo apresentado na figura a seguir.
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
20
Figura 1 - Exemplo de fluxograma de atendimento aos usuários na APS
Fonte: Brasil. Ministério da Saúde. Acolhimento à demanda espontânea. Brasília: Ministério da Saúde,
2013. v. 1, p. 28.
21
Na figura 1, é possível verificar que o usuário que chega à UBS com uma
atividade agendada (consulta, grupos), já é diretamente encaminhado à atividade. O
mesmo ocorre caso necessite de um atendimento de rotina da unidade, como, por
exemplo, vacina, procedimentos ou nebulização. As orientações aos usuários, nestes
casos, devem ser fornecidas na recepção da unidade, não necessitando passar por
uma escuta inicial, evitando esperas desnecessárias com potencial de confusão na
recepção.
Para os usuários em que se faz necessária a escuta inicial, é realizado o
acolhimento das demandas e uma avaliação de risco ou vulnerabilidade, para
definição da oferta mais condizente com suas demandas. No exemplo de fluxograma,
as demandas foram classificadas inicialmente em agudas e não agudas. Caso seja
aguda, a classificação de risco determina se o atendimento precisa ser imediato –
como, por exemplo, no caso de parada cardiorrespiratória, dificuldade respiratória
grave ou convulsão; prioritário – caso de crise asmática leve ou moderada, febre sem
complicação, gestante com dor abdominal ou pessoas com ansiedade significativa;
ou do dia – caso de disúria, tosse sem sinais de risco, dor lombar leve, renovação de
medicamento de uso contínuo que já terminou, conflito familiar ou usuário que não
conseguirá acessar o serviço em outro momento.
Nos casos em que a demanda é aguda, podem ser ofertadas diversas ações.
Entre elas, pode-se citar, por exemplo, agendamento de uma consulta,
encaminhamento para outros serviços, seja da saúde – centros de especialidades,
Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), entre outros – ou de outros setores – Centro
de Referência de Assistência Social (CRAS), centros de convivência, de esporte e lazer,
etc. – ou adiantamento de ações previstas em protocolos. É o caso, por exemplo, da
gestante que tem consulta marcada somente dentro de 15 dias, mas que procura a
UBS, ansiosa, com alguns sintomas, e que pode ter sua consulta adiantada.
A equipe que realiza a escuta inicial pode ser composta de diferentes categorias
profissionais. O profissional responsável pode ser o técnico de enfermagem, podendo
em alguns casos contar também com a participação de ACS, desde que tenham
suporte do enfermeiro. Algumas equipes optam por ter o enfermeiro à frente da
escuta inicial nos momentos de maior procura por atendimento na unidade (início
dos turnos). De toda a forma, os trabalhadores encarregados de realizar a escuta
inicial das demandas sem agendamento prévio devem ter capacidade de analisá-las
(identificando riscos/vulnerabilidade), clareza das ofertas existentes na Unidade,
possibilidade de diálogo com outros colegas para discussão de caso/realização de
interconsulta, algum grau de resolutividade e respaldo do restante da equipe (BRASIL,
2013).
Ampliação do acesso: por onde começar?
As modificações necessárias para ampliação do acesso envolvem mudanças no
trabalho de toda a equipe. Desta forma, trata-se de um processo que não se encerra
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
22
em uma reunião. A construção de um plano de ação deverá definir metas (a curto,
médio e longo prazo) e responsáveis e poderá ser revisto na medida da necessidade.
É importante iniciar com uma sensibilização, já que é necessário que todos (ou
pelo menos uma grande parte da equipe) percebam as mudanças como necessárias
e positivas para a equipe. É útil identificar aqueles profissionais parceiros e aqueles
que ainda terão de ser sensibilizados.
As reuniões precisam proporcionar uma discussão aberta, em que todos tenham
oportunidade de falar sobre seus receios e fantasias e em que se crie um ambiente
favorável para o planejamento das ações, com pactuações das responsabilidades de
cada profissional. A participação dos trabalhadores na análise e decisão sobre os
modos de acolher a demanda espontânea é fundamental para a sustentabilidade da
proposta (BRASIL, 2013).
A equipe pode partir do levantamento/análise da atual organização do serviço,
identificando as principais dificuldades enfrentadas para ampliação do acesso na
opinião dos profissionais. Também é importante a realização de estudos de demanda
– ou seja, levantamentos das principais solicitações/problemas que chegam à UBS –
para que a equipe identifique os mais frequentes e formule estratégias para dar
resposta de forma condizente às necessidades locais.
O estudo de demandas pode ser realizado através de pesquisas em sala de
espera, sistematização das principais demandas registradas na escuta inicial ou
utilizando dados gerados pelos sistemas de informação. No e-SUS, por exemplo, na
funcionalidade “relatórios consolidados” é possível saber quais os principais
agravos/sintomas e problemas mais diagnosticados, seja pela Classificação
Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10) ou pela
Classificação Internacional de APS (CIAP) (BRASIL, 2015).
No planejamento das mudanças, será necessário definir o modo como cada
profissional participará do acolhimento. Alguns exemplos de questões que precisarão
ser definidas em equipe são: quem será responsável pela escuta inicial, como avaliar
o risco e a vulnerabilidade desse usuário e como será garantida a “retaguarda clínica”
para ele (com quem poderá discutir o caso/realizar interconsulta se necessário),
quando encaminhar/agendar uma consulta médica, como organizar a agenda dos
profissionais, que outras ofertas de cuidado (além da consulta) podem ser necessárias,
entre outras. É fundamental ampliar a capacidade clínica da equipe de saúde (BRASIL,
2013).
A equipe pode contar com a literatura disponível, entrando em contato com
experiências bem-sucedidas para ampliação do acesso na APS, Cadernos de Atenção
Básica e protocolos clínicos embasados em evidências. Buscar o apoio da comunidade
é um passo essencial. As lideranças comunitárias precisam ser acionadas para que,
através de assembleias e reuniões, as pessoas possam ser esclarecidas sobre os
objetivos das mudanças que ocorrerão. As alterações no acesso podem, em um
23
primeiro momento, desagradar muitos usuários que estão habituados com o modo
de funcionamento da UBS.
Cabe ressaltar que a resolutividade da APS é influenciada por diversos fatores,
como a integração da rede assistencial para garantia de exames e de consultas na
atenção especializada, por exemplo, (ALMEIDA; FAUSTO; GIOVANELLA, 2011). Desta
forma, é importante que as mudanças para ampliação do acesso não sejam um
movimento isolado da equipe e, sim, parte de um processo mais amplo, que conte
com a indução/apoio da gestão em toda a rede assistencial.
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
24
CAPÍTULO 3
MUDANÇAS PARA AMPLIAÇÃO DO ACESSO À SAÚDE
ORGANIZAÇÃO DO ACESSO E AGENDA DOS PROFISSIONAIS
As pesquisas atuais sobre a APS no Brasil têm revelado que a Atenção Primária
não tem alcançado a resolutividade necessária para que seja porta de entrada
preferencial no sistema de saúde. Isto ocorre, ainda segundo as pesquisas, devido à
existência de barreiras de acesso (ALMEIDA; FAUSTO; GIOVANELLA, 2011; CASTRO et
al., 2012). No capítulo anterior, abordamos um aspecto essencial, que diz respeito a
reestruturar os fluxos dos usuários através de pactuações em equipe. Neste capítulo,
abordaremos mais dois pontos importantes: a necessidade de organizar o acesso e a
agenda dos profissionais e de revisar a conformação do trabalho em equipe.
Uma primeira questão a ser enfrentada quando queremos ampliar o acesso é
alterar o modo como a equipe oferta o cuidado e como sua agenda está organizada
para dar reposta às demandas. A forma como ocorre a marcação de consultas é
central na definição de uma abertura maior ou menor do acesso, gerando
repercussões na resolutividade da APS. Murray e Tantau (2000) definem três tipos de
sistemas relacionados à questão do acesso: modelo tradicional, sistema com vagas e
acesso avançado. A seguir, são apresentadas as características de cada um:
Modelo tradicional
Neste sistema, todos os dias, o médico inicia seu trabalho com a agenda já cheia
de pacientes, saturada. São agendamentos de rotina, de pessoas que agendaram sua
consulta há semanas ou meses. Casos urgentes precisam ser encaixados entre as
consultas. São criadas tentativas infrutíferas para controlar a demanda, como
restrições e classificações complexas de atendimento (saúde do homem, saúde da
mulher, diabéticos, consultas de retorno). Este funcionamento gera alta taxa de
absenteísmo e uma abundância de consultas de urgência, que tem custo mais alto
para o sistema de saúde e resulta em quebra na relação com o médico que
acompanha o paciente na APS. O mote deste sistema é: “Faça o trabalho do último
mês hoje”.
Sistema com Vagas
Neste sistema, são destinadas algumas vagas para atendimentos de demandas
urgentes no dia e o restante para agendamento com antecedência. Embora tal
modelo traga uma melhoria em relação ao modelo tradicional, são encontrados nele
ainda vários problemas. Pacientes que tem demandas não urgentes continuam tendo
suas necessidades adiadas por longos períodos, postergando o trabalho da equipe.
Por isso se diz que o mote desse sistema é “Faça uma parte do trabalho de hoje,
hoje”. Outro complicador é que o número adequado para oferta de consultas de
urgência é difícil de ser definido de forma precisa, o que pode gerar espaços perdidos
25
na agenda. Este sistema gera também uma tensão entre os pacientes marcados e os
atendidos por urgência. Outra questão são os pacientes que não se enquadram em
nenhum dos dois tipos de vagas - pois não têm uma demanda urgente, mas também
não podem esperar até o próximo dia disponível na agenda - o que gera
complicações no manejo da agenda e saturação.
Acesso Avançado
Neste sistema, 65% a 75% das vagas de atendimento estão abertas quando o
serviço abre suas portas. O Acesso Avançado elimina a distinção entre consultas de
urgência e de rotina, ofertando atendimentos no mesmo dia para todos. O mote
desse sistema é “faça o trabalho de hoje, hoje”. O objetivo é dar resposta às demandas
no próprio dia, iniciando o próximo com a agenda aberta. A disponibilidade da
agenda é, assim, maximizada.
O acesso avançado é um sistema mais simples, mas que requer uma mudança
de paradigma. Sua proposta altera a lógica de organização do trabalho que guia a
atenção à saúde de forma geral, que é partir de uma distinção entre pacientes que
necessitam de atendimento agora (que estão se sentindo mal) e aqueles que
poderiam esperar, para ter como meta atender todos no mesmo dia. Por envolver
mudanças radicais, a implantação do acesso avançado não ocorre rapidamente e
implica em investimento de alguns meses de trabalho pesado. A equipe necessita ir
reduzindo aos poucos o número de agendamentos e provavelmente atender mais
pacientes durante um período de transição, num tempo estimado de seis a oito
semanas (MURRAY; TANTAU, 2000).
Algumas equipes no Brasil vêm adotando o acesso avançado como estratégia
para ampliar o acesso na APS, como é o caso dos municípios de Curitiba,
Florianópolis, Rio de Janeiro e São Paulo (CURITIBA, 2013; VIDAL, 2013). Mesmo que
não seja adotado em sua totalidade, o modelo traz potencialidades que podem
auxiliar qualquer equipe que tenha interesse em ampliar o acesso.
A seguir, são listadas quatro importantes questões que as experiências de
Acesso Avançado podem trazer, contribuindo para um melhor aproveitamento da
agenda (CURITIBA, 2013).
Abrir mão de uma agenda fragmentada por grupos, patologias ou faixas
etárias para ampliar o acesso, eliminando as reservas de vagas por
programas (dias específicos para consultas para gestantes, crianças,
hipertensos ou diabéticos, etc.). Adotar uma agenda que tenha a maioria
dos espaços disponíveis para demandas que serão atendidas no mesmo
dia;
Desburocratizar o acesso e adequar a agenda à procura diária das pessoas
para atender melhor às necessidades da população que atende;
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
26
Evitar pré-agendamentos prolongados, pois podem gerar desperdício de
tempo (aumenta chances de absenteísmo e pode ser que o usuário venha
à unidade por outras demandas antes de chegar o dia agendado). A
equipe precisa definir qual o tempo limite para um pré-agendamento,
considerando que este não deveria se dar para mais que uma semana;
Envolver todos os profissionais disponíveis na APS, oferecendo os
melhores recursos de acordo com as necessidades da população. Cada
profissional (médico, enfermeiro, cirurgião-dentista, auxiliares e técnicos
de enfermagem, agentes comunitários de saúde), precisa se perguntar se
é o profissional mais adequado para oferecer o atendimento naquele
momento ou se outra pessoa poderia resolver da mesma forma.
Uma estratégia utilizada para reduzir a demanda pré-existente é aproveitar ao
máximo cada encontro com o usuário, perguntando durante o atendimento sobre
outras demandas existes, para evitar a geração de uma consulta futura. Por exemplo,
se o usuário vai à UBS para consultar por uma questão aguda, mas tem uma condição
crônica, pode-se aproveitar a ocasião para realizar as ações previstas na consulta de
revisão. Assim, numa única consulta é possível tratar de uma infecção respiratória e
da diabetes do usuário. Durante o processo de implantação do acesso avançado, esta
estratégia por ser especialmente útil, eliminando da agenda as consultas de rotina
previstas para as próximas semanas ou meses.
Outra estratégia para ganhar mais capacidade da agenda é rever a frequência
com que são agendados os retornos dos pacientes. É importante que os intervalos
sejam baseados em indicações clínicas e não em intervalos padrão por diagnóstico.
Ou seja, o tempo estimado para retorno pode variar de acordo com o quadro de
cada usuário (MURRAY; TANTAU, 2000).
Tais mudanças visam garantir o atendimento quando o usuário sente
necessidade de consultar, no momento em que busca a UBS. Parte-se do princípio
que, caso encontre barreiras de acesso quando precisar, o usuário pode desmotivar-
se e reduzir sua confiança na equipe de saúde da unidade. E isto pode, inclusive,
interferir na sua escolha por qual serviço buscar numa nova situação de saúde
(CURITIBA, 2013).
Atendendo demandas do momento atual, as consultas tornam-se mais objetivas
e rápidas, gerando mais satisfação nos profissionais. Diferentemente de um
atendimento programático, sem uma necessidade evidenciada pelo paciente ou
profissional, os profissionais passam a lidar com situações reais das pessoas
(problemas concretos, alívio de sofrimento), com condições clínicas para as quais
podem ser resolutivos (CURITIBA, 2013; MURRAY; TANTAU, 2000; BERWICK, 2003).
As condições de saúde previstas nos programas e outras que demandam
atenção contínua pela equipe – outras condições sensíveis à APS, como tuberculose
27
e asma, além de retornos de exames urgentes, casos de negligencia e violência
familiar, entre outras – não deixam de ser acompanhadas e precisam ter
monitoramento frequente. A diferença é que a equipe passa a não utilizar a agenda
como forma de controlar se os usuários estão vindo consultar regularmente ou não.
É necessário que a equipe desenvolva outras formas de monitoramento dessas
condições. Para isso, é possível utilizar planilhas, que podem ser compartilhadas em
tempo real entre os diferentes profissionais da equipe, garantindo comunicação ágil
para realizar busca ativa quando necessário. Este tipo de recurso possibilita, inclusive,
qualificar a vigilância das condições crônicas, adicionando à análise classificações de
risco que deem destaque para usuários que tem mais urgência.
Revisão da conformação do trabalho
Outra questão importante quando a equipe pretende ampliar o acesso é fazer
uma análise das ações que cada profissional vem desempenhando e como vem se
organizando para trabalhar em equipe. Em geral, os usuários buscam a UBS para
solicitar atendimento médico. Uma escuta qualificada, no entanto, pode identificar
que nem todos necessitam consultar com o médico. Por trás deste pedido, podem
estar diversas demandas, como retirar uma sutura, fazer uma consulta de pré-natal,
renovar uma receita de medicamento, fazer uma medicação injetável, consultar
porque não está se sentindo bem ou outras tantas para as quais não necessariamente
a consulta médica seja a melhor resposta.
Assim, é importante que a equipe defina quais são os casos que necessitam ser
vistos pelo médico e quais podem se beneficiar de outras ofertas, como por exemplo,
atendimento clínico com enfermeiro, com cirurgião-dentista, orientação na própria
escuta inicial ou encaminhamento a outro serviço, grupos, entre outras. O
atendimento médico deve ser uma das ofertas de uma equipe de APS. Se for a única,
teremos uma demanda reprimida muito grande, além de profissionais subutilizados
em sua capacidade.
A revisão deste aspecto é importante, pois quando a consulta médica segue
sendo a única oferta para atendimento para toda a demanda espontânea existe um
risco muito grande de que estratégias para ampliação do acesso como o acolhimento
acabem se reduzindo a uma triagem para o atendimento médico. Para além de uma
divisão de trabalho, é necessário que a equipe invista na ampliação da clínica dos
profissionais (BRASIL, 2013).
No país, a APS é desenvolvida por uma equipe multiprofissional. A presença de
diferentes categorias profissionais e um alto grau de articulação entre eles é essencial
não somente para compartilhar as ações, mas também para o enriquecimento do
campo comum de competências, ampliando, assim, a capacidade de cuidado de toda
a equipe (BRASIL, 2012).
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
28
Para isso, é preciso que os profissionais não apenas trabalhem lado a lado, mas
que possam estabelecer um trabalho cooperado, ou seja, que não sejam um
agrupamento, em que ocorre uma sobreposição de ações e fragmentação do
trabalho e, sim, uma equipe integração, em que ocorre a articulação das ações e a
interação dos agentes, estabelecendo tarefas conjuntas (PEDUZZI, 2001).
Estratégias como o Acesso Avançado preveem transferir do médico, enfermeiro
e cirurgião-dentista funções que podem ser feitas por outros profissionais. Isso
significa dar maiores níveis de responsabilidade, sob bem concebidas diretrizes, para
toda a equipe (CURITIBA, 2013).
Os técnicos de enfermagem, frequentemente, têm sua prática restrita nas UBS.
Entretanto, muitas ações que tomam a agenda do enfermeiro talvez pudessem ser
divididas com este profissional. Os técnicos de enfermagem podem, contando com
supervisão, realizar a primeira escuta, fazer avaliação de risco e realizar ações de
rotina da unidade, como por exemplo, verificação do estoque de insumos e solicitação
de materiais. Muitas questões que não demandam avaliação clínica podem ser
resolvidas no próprio acolhimento com o técnico de enfermagem, através de
orientações como, por exemplo, sobre higiene, sobre uma boa pega para a
amamentação, cuidados com pequenas lesões (escoriações em geral), entre outras.
A coordenação de alguns grupos pode ser realizada tanto por técnicos quanto por
Agentes Comunitários de Saúde, com supervisão do enfermeiro.
Delegar tarefas não é simples. Delegar implica em atribuir uma tarefa a uma
pessoa, que terá liberdade em sua execução, sem deixar de acompanhá-la. É
necessário preparação para delegar tarefas e, portanto, investimento de tempo e
esforço. Este processo pode, inclusive, gerar aumento de trabalho no momento, mas
traz vantagens a médio e longo prazo, na medida em que sobra mais tempo para a
realização de tarefas mais complexas e para se capacitar, além de gerar mais
flexibilidade na organização do trabalho (DIAS; NOGUEIRA, 2012).
É preciso fazer uma análise sobre as ações que cada um desempenha. É
importante que os profissionais se questionem sobre quais tarefas realizam, mas
poderiam ser feitas por outras pessoas, e quais tarefas precisam seguir sob sua
responsabilidade – aquelas que podem ser feitas apenas por eles – e, ainda, aquelas
que não precisam mais ser realizadas – ou seja, tarefas que, embora executadas, são
dispensáveis (DIAS; NOGUEIRA, 2012).
Do ponto de vista do acesso às demandas espontâneas, é conveniente que o
trabalho possa ser compartilhado entre médicos e enfermeiros. Um estudo recente
de Toso, Filippon e Giovanella (2016) analisou a ampliação das funções do enfermeiro
na APS no Serviço Nacional de Saúde britânico, o National Health Service, e as
repercussões para a prática profissional. Financiado pelo Estado por meio de recursos
fiscais, o National Health Service é universal, tem ampla cobertura e oferece acesso
gratuito aos cidadãos.
29
Na Inglaterra, os enfermeiros exercem várias atividades clinicas e não clínicas –
como prescrição de medicamentos, solicitação e interpretação de exames e manejo
de casos, principalmente das condições crônicas – numa prática guiada por
protocolos de cuidado e amparada pela equipe. Conforme os autores, o estudo
mostra que, com a ampliação das ações clínicas do enfermeiro, houve melhora no
acesso aos serviços de saúde por redução de barreiras organizacionais, além de
aumento no tempo de duração da consulta. Houve melhora na qualidade da relação
profissional-paciente, na adesão ao tratamento e no seguimento e acompanhamento.
Entre os resultados, destaca-se também um maior reconhecimento profissional por
parte de pacientes e demais profissionais e maior satisfação no trabalho, em função
do aumento da resolutividade das práticas do enfermeiro (TOSO, FILIPPON,
GIOVANELA 2016).
Outras pesquisas realizadas demonstram que a atuação do enfermeiro na APS
pode gerar altos níveis de satisfação dos pacientes e cuidados de elevada qualidade,
permitindo comparações com os desfechos de cuidado prestados por médicos. A
literatura britânica sugere que a combinação de habilidades médicas e de
enfermagem no trabalho em equipe proporciona serviços mais abrangentes e flexíveis
para os pacientes do que a fornecida apenas por médicos (HORROCKS; ANDERSON;
SALISBURY, 2002; VENNING et al., 2000). Estes estudos podem trazer importantes
aspectos quando analisamos as atuais funções desempenhadas pelos enfermeiros na
APS em nosso país.
Algumas iniciativas no sentido de ampliação da autonomia do enfermeiro em
suas práticas clínicas têm surgido no Brasil, como a aprovação de protocolos de
enfermagem por municípios de diferentes portes populacionais (FLORIANÓPOLIS,
2010; FLORIANÓPOLIS, 2015; SAPUCAIA DO SUL, 2013; PORTO ALEGRE, 2015; JÓIA,
2014; CONSELHO DE ENFERMAGEM DO RIO DE JANEIRO; SECRETARIA MUNICIPAL
DO RIO DE JANEIRO, 2015; BRASÍLIA, 2016). Os protocolos permitem que enfermeiros
possam prescrever algumas medicações e solicitar exames, agilizando o atendimento
das demandas.
Os protocolos de Florianópolis preveem ações em hipertensão arterial sistêmica,
Diabetes Mellitus, tabagismo, rastreamento de problemas associados com doenças
cardiovasculares, e em saúde da mulher. Já os de Sapucaia do Sul preveem ações na
saúde da mulher (autorizando o enfermeiro a solicitar diversos exames, incluindo
mamografia e também prescrição de anticoncepcionais), pré-natal (além de
acompanhar as consultas, solicitar exames diversos e prescrever alguns
medicamentos), em doenças sexualmente transmissíveis e saúde da criança.
A atuação em equipe multiprofissional na APS possibilita que o
compartilhamento de tarefas seja feito de forma segura, estabelecendo uma parceria
entre o médico e o enfermeiro, através da supervisão clínica, discussão de caso e, por
exemplo, interconsultas.
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
30
PROCESSO DE TRABALHO
Responsáveis: todos os profissionais da equipe de saúde.
Quando: diariamente, durante todo o horário de funcionamento da UBS.
Como proceder:
1. Escuta inicial
Atender o paciente, idealmente, em um ambiente privado (sala específica ou
um consultório que esteja vago), permitindo o diálogo aberto de forma
acolhedora.
Observar, reconhecer, descrever sinais e sintomas e identificar a queixa
principal.
Avaliar a vulnerabilidade e/ou risco biológico e psicossocial do usuário para
definir se sua demanda pode ser resolvida no próprio acolhimento ou se ele
necessita de avaliação com profissional de nível superior/consulta.
Caso necessite de uma consulta, avaliar se sua urgência demanda um
atendimento no mesmo turno ou no mesmo dia ou se ele pode ser atendido
em 24h, 48h, ou ainda se pode ser agendado para outra data. A classificação
de risco pode ser realizada com base em protocolos validados (como, por
exemplo, os do Caderno de Atenção Básica nº 28 volume II) ou a partir de
instrumentos próprios do município e deve levar em conta tanto o risco
biológico quanto a vulnerabilidade psicossocial.
Em caso de dúvida sobre como proceder, consultar os profissionais de nível
superior para discussão de caso ou interconsulta.
2. Seguimento
Caso necessite de atendimento com profissional de nível superior, ofertá-lo
em tempo oportuno (ou seja, em tempo hábil para atender às necessidades
do usuário), garantindo a resolutividade do acolhimento.
Caso o usuário necessite ser referenciado para outro serviço, viabilizar o
encaminhamento de forma responsável - realizar contato telefônico prévio
com o outro serviço para discussão do caso, preencher adequadamente o
documento de referência com o motivo do encaminhamento e, se necessitar
de remoção, avaliar a necessidade de um profissional da equipe
acompanhá-lo.
3. Atribuições de cada profissional no acesso
Todos os profissionais acolhem os usuários, informam sobre os fluxos da
UBS e as formas de acesso e participam das decisões que influenciam no
funcionamento da UBS.
31
Agente Comunitário de Saúde: acolhe e realiza orientações nos domicílios. Pode
participar da escuta inicial em conjunto com outros profissionais da equipe e sob
supervisão do enfermeiro/médico.
Técnico de Enfermagem: realiza a escuta inicial, presta orientações em saúde e
classifica o risco, a partir de protocolos e pactuações com a equipe e sob supervisão
do enfermeiro, médico e cirurgião-dentista. Presta cuidado dos usuários que ficam
em observação até estabilização ou remoção para outro serviço.
Enfermeiro: realiza consultas agendadas e de urgência na APS, na UBS e no domicílio.
Supervisiona a equipe que realiza escuta inicial, dando retaguarda através da
discussão de casos e de interconsultas. Presta cuidado aos usuários que ficam em
observação até estabilização ou remoção para outro serviço. Realiza monitoramento
das condições que exigem vigilância (vigilância de gestantes, puericultura,
hipertensos, diabéticos, casos sob investigação - em especial, de HIV e tuberculose –
com ênfase nos casos que envolvem vulnerabilidade psicossocial, entre outros). Pode
participar diretamente da escuta inicial em alguns momentos (naqueles em que há
maior procura por atendimento), dando mais resolutividade à primeira escuta.
Médico: realiza consultas agendadas e de urgência na APS, na UBS e no domicílio.
Supervisiona a equipe que realiza escuta inicial, dando retaguarda através da
discussão de casos e de interconsultas. Presta cuidado aos usuários que ficam em
observação até estabilização ou remoção para outro serviço. Realiza monitoramento
das condições que exigem vigilância.
Cirurgião-dentista: realiza consultas agendadas e de urgência na APS, na UBS e no
domicílio. Supervisiona a equipe que realiza escuta inicial, dando retaguarda através
da discussão de casos e de interconsulta nas demandas que envolvem a odontologia.
Supervisiona o Técnico em Saúde Bucal (TSB) no atendimento das consultas
agendadas e na avaliação de risco em odontologia e o Auxiliar de Saúde Bucal. Realiza
monitoramento das condições que exigem vigilância (por exemplo cárie, doença
periodontal, má oclusão, más formações congênitas, traumatismo dentário, fluorose
e câncer bucal).
Técnico em Saúde Bucal: participa da escuta inicial, fazendo avaliação de risco das
demandas odontológicas e realiza atendimentos, sob supervisão do cirurgião-
dentista. Auxilia/assessora o cirurgião-dentista em atendimentos programados e de
urgência e no monitoramento das condições que exigem vigilância;
Auxiliar de Saúde Bucal: auxilia e assessora o cirurgião-dentista em atendimentos
programados e de urgência. Pode participar da escuta inicial em conjunto com outros
profissionais da equipe e sob supervisão do cirurgião-dentista.
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
32
Pontos essenciais a considerar:
1. Escuta inicial: é preciso definir qual(is) profissional(is) faz(em) a escuta inicial e
como garantir a sua retaguarda, através de discussão de caso para eventuais
dúvidas e realização de interconsulta. A equipe deve definir a melhor
composição de acordo com as características de cada profissional e suas
habilidades. Comumente a escuta inicial é realizada pelo técnico de
enfermagem ou por uma dupla composta pelo técnico de enfermagem e o
ACS, com a supervisão do enfermeiro. Muitas equipes optam por ter o
enfermeiro diretamente na escuta inicial em horários de maior procura por
atendimento na unidade – das 8 horas às 10 horas e das 13 horas às 15 horas
– ou mesmo reservar todo o turno da segunda-feira pela manhã para o
acolhimento (considerando a demanda represada do final de semana). A
escuta inicial necessita ser resolutiva, ou seja, capaz não apenas de identificar
a urgência de cada demanda para a priorização da ordem de atendimento
dos usuários, mas também de solucionar diversos problemas/ necessidades
sem gerar consultas necessariamente. Alguns exemplos: renovação de receita
de uso continuado de usuários que fazem acompanhamento regular com a
equipe; orientações gerais sobre higiene, amamentação; encaminhamentos
para outros serviços como CAPS, oftalmologista; retorno de exames de rotina
sem alteração, entre outros. É importante que não demore muito tempo entre
a chegada do usuário na UBS e a oferta da escuta inicial.
2. Fluxos da unidade: deve-se planejar os fluxos na unidade, desburocratizando
ao máximo o acesso. A escuta inicial deve ser ofertada apenas para quem vem
por demanda espontânea - quem veio realizar uma vacina, retirar uma
medicação ou tem uma consulta marcada, por exemplo, pode acessar
diretamente os profissionais. É preciso definir em equipe como se dará o
agendamento. A forma de marcação deve garantir o acesso tanto à demanda
espontânea quanto às demandas que podem ser agendadas previamente
(não utilizar mais fichas para regular a porta de entrada, pois barra o acesso,
limitando o número de atendimentos sem realizar avaliação de risco). O tempo
entre a procura e a oferta de atendimento não deve ser muito grande, pois
aumentam as chances de absenteísmo e insatisfação do usuário,
comprometendo a resolutividade da APS.
3. Processo de trabalho: a equipe precisa preparar-se para a implantação do
acolhimento, redefinindo tarefas, estudando protocolos/diretrizes clínicas das
demandas mais comuns em APS e capacitando os profissionais que farão a
escuta inicial para avaliação de risco. É necessário repensar as tarefas que cada
profissional vem desempenhando na equipe, aproveitando o potencial de
cada um. Devem ser privilegiadas as consultas na agenda do médico,
33
enfermeiro e cirurgião-dentista, dividindo atividades não assistenciais com os
demais profissionais da equipe. A resolutividade da organização do acesso
depende de alguns elementos, como por exemplo: do estabelecimento de um
trabalho cooperado, a garantia de retaguarda para quem realiza a escuta
inicial e a ampliação da prática clínica do enfermeiro (através da aprovação de
protocolos municipais, diretrizes clínicas claras e da parceria do trabalho do
médico e do enfermeiro).
4. Agenda: deve ser gerenciada de modo a proporcionar melhor aproveitamento
do tempo dos profissionais de nível superior e garantir que, quem necessita,
consiga consultar no mesmo turno ou no mesmo dia. Precisa ser flexível,
possibilitando encaixes de atendimentos com tempo variável, de acordo com
a necessidade do usuário. É necessário que, todos os dias, existam horários
disponíveis para atendimento no mesmo turno/dia, evitando sempre que
possível o agendamento de consultas, a não ser que esta seja uma opção do
usuário. Metade da oferta de consultas com o médico/enfermeiro ou mais
deve estar disponível para atendimento às demandas espontâneas, garantindo
que possamos atender as pessoas com menos tempo de espera possível.
5. Odontologia: é necessário pactuar como acontecerá o acolhimento das
demandas odontológicas. Algumas equipes optam por estabelecer uma
escuta inicial específica da odontologia, ficando sob responsabilidade do TSB
e ASB, com supervisão do cirurgião-dentista. Em outras, todas as demandas
da equipe, incluindo as da odontologia, são recebidas pela mesma equipe de
escuta inicial. Neste caso, é necessário assegurar momentos de capacitação
para identificação dos sinais de risco mais comuns a serem observados e
garantir a retaguarda para discussão de caso/interconsulta de forma facilitada.
De toda forma, a sintonia entre os todos os profissionais é muito importante.
A odontologia não é uma equipe em separado – precisa atuar de forma
integrada ao restante da equipe.
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
34
CAPÍTULO 4
GERENCIAMENTO DA AGENDA
PLANEJAR E MONITORAR PARA MELHORAR O ATENDIMENTO
Responsáveis pelo gerenciamento da agenda: profissionais de nível superior e
profissionais da equipe de APS envolvidos na escuta inicial e no agendamento de
consultas.
Quando: diariamente, em todo o horário de funcionamento da unidade de saúde.
OBJETIVO: planejar e monitorar a agenda dos profissionais de nível superior de modo
a garantir o atendimento em tempo oportuno para todos os tipos de demandas,
sejam elas programadas ou espontâneas. A meta é conseguir uma agenda flexível,
que proporcione encaixes de atendimentos com tempo variável, de acordo com a
necessidade do usuário. O gerenciamento da agenda serve para evitar que a
disponibilidade de agenda esteja muito distante e para que a APS possa atender os
casos de urgência, evitando encaminhamentos para pronto-atendimentos, sendo
essencial para garantir a resolutividade do acesso.
Como proceder: a seguir, são listados nove pontos básicos relacionados ao
gerenciamento da agenda na APS.
1. Aumentar as possibilidades de reposta da equipe à demanda espontânea
O atendimento médico deve ser uma das ofertas de uma equipe de APS. Se for
a única, teremos uma demanda reprimida muito grande, além de profissionais
subutilizados em sua capacidade. Assim, é importante que a equipe defina quais
são os casos que necessitam ser vistos pelo médico e quais podem se beneficiar
de outras ofertas da equipe, como atendimento clínico com enfermeiro, com
cirurgião-dentista, orientação na própria escuta inicial ou encaminhamento a
outro serviço, grupos, entre outras.
2. Evitar reservas de vagas por condições de saúde ou programas
A agenda deve permitir que qualquer usuário seja atendido na APS,
independente de sexo, idade ou problema de saúde, nos horários mais
convenientes para ele. Reservas de turnos específicos para cada condição
desconsideram a disponibilidade do usuário e dificultam o acesso de outros
perfis de usuários. As condições de saúde previstas nos programas, como
hiperdia, puericultura e gestação, e outras que precisam ser acompanhadas pela
equipe, como retornos de exames urgentes, casos de negligencia e violência
familiar, devem ter garantidas previsão do retorno através de monitoramento
frequente. Para isso podem ser utilizadas planilhas, que podem ser
compartilhadas em tempo real entre a equipe, garantindo comunicação entre
os profissionais para realizar busca ativa quando necessário.
35
3. Organizar a agenda dos profissionais de nível superior para ofertar consultas no
mesmo dia
É necessário que a equipe tenha disponível, sempre que possível, horários para
atendimento no mesmo turno ou dia, evitando, sempre que possível, o agendamento
de consultas, a não ser que esta seja uma opção do usuário. Metade da oferta de
consultas com o médico, enfermeiro ou cirurgião-dentista ou mais deve estar
disponível para atendimento às demandas espontâneas, garantindo que possamos
atender as pessoas com menos tempo de espera possível. A oferta das consultas
precisa estar vinculada a uma escuta inicial que identifique os usuários que precisam
ser priorizados, com maior risco biológico. É o caso da gestante com sangramento,
do paciente com febre acima de 39 graus, pressão arterial elevada ou dor abdominal
intensa, ou do paciente apresenta grande vulnerabilidade psicossocial. O atendimento
da demanda do usuário no menor tempo possível gera mais satisfação com o
atendimento e diminui as chances de absenteísmo.
Em relação ao cirurgião-dentista, especificamente, a Política Nacional de Saúde Bucal
sugere que entre 75% a 85% da agenda seja destinada a procedimentos clínicos.
Aumentar o acesso e a resolutividade do trabalho clínico odontológico pode
representar uma tarefa difícil para a equipe visto que, para ser completado, este
tratamento pode levar muitas consultas. Neste sentido, torna-se um desafio otimizar
consultas odontológicas, analisando quantas consultas, em média, é preciso para
completar o tratamento de um paciente e organizando a assistência clínica para
otimizar atendimentos e melhorar a relação resolutividade – acesso.
4. Aproveitar ao máximo a capacidade da agenda
É conveniente proporcionar o encaixe de outras demandas, evitando postergar o
atendimento e “protegendo” a agenda, na medida em que evita agendamento
posterior desnecessário. É importante aproveitar ao máximo cada encontro com o
usuário – por exemplo: quando uma pessoa com hipertensão consulta por uma
infecção respiratória, a equipe pode ofertar o cuidado necessário para revisão de
pressão arterial, evitando o agendamento de uma consulta programada.
5. A equipe ou profissional que faz a escuta inicial precisa ter livre acesso para
agendamento
Assim, permite o encaixe a partir da urgência da demanda do usuário. A agenda
precisa ser ocupada de forma a equilibrar as necessidades dos usuários (a partir da
avaliação de risco/ vulnerabilidade) com a disponibilidade na agenda. Sempre que
houver dúvida, o profissional de nível superior deve ser consultado.
6. Ênfase no trabalho em equipe
O estabelecimento de ações cooperadas na APS favorece o uso racional da agenda.
Se o técnico de enfermagem realiza a escuta inicial, contando com a disponibilidade
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
36
do médico ou enfermeiro para discussão de casos/supervisão clínica, então muitas
questões que demandariam uma consulta podem ser solucionadas no próprio
acolhimento. O mesmo vale para a relação médico-enfermeiro: muitas demandas
podem ser resolvidas a partir de uma discussão de caso ou interconsulta, agilizando
o atendimento do usuário e garantindo retaguarda para atuação clínica do
enfermeiro.
7. Liberar a agenda para atendimentos
É importante discutir as atividades que cada um vem desempenhando na equipe
para que todos sejam aproveitados em seu potencial, proporcionando a divisão de
tarefas. A agenda do médico, enfermeiro ou cirurgião-dentista deve ter foco no
atendimento. A coordenação de alguns grupos pode ser através de rodízio ou ficar
sob a responsabilidade de técnicos de enfermagem e agentes comunitários, contando
com a participação do médico, enfermeiro e cirurgião-dentista em momentos
específicos. Atividades não assistenciais que tomam a agenda do enfermeiro – como
realizar verificação ou solicitação do estoque de insumos na unidade, por exemplo –
podem ser desenvolvidas pelo técnico de enfermagem supervisionado.
8. Reservar alguns “horários-chave” na semana para garantir encaixes, retornos e
demandas administrativas
Deve-se reservar alguns horários na semana, preferencialmente no fim dos
turnos, para demandas variadas, como usuários que, pela análise clínica, podem
aguardar 24 horas ou 48 horas para serem atendidos ou pessoas com as quais se faz
necessária reavaliação. Estes horários podem ser também utilizados para dar retornos
por e-mail ou telefone para usuários, discussão de casos com outros serviços e para
emissão de laudos e atestados (para perícia, para escola – liberação para educação
física - e para obtenção de passe livre).
9. Evitar fechar a agenda durante um turno inteiro
É importante que a realização de atividades como, por exemplo, reunião de
equipe, atendimentos domiciliares e grupos não ocupem um turno inteiro da agenda,
garantindo alguns horários de atendimento em todos os turnos da unidade. Por
exemplo, os atendimentos domiciliares podem ser distribuídos na agenda ao longo
da semana (ocupando metade do turno ao invés de um turno único), evitando o
afastamento do profissional durante muito tempo da unidade e ofertando
atendimento domiciliar com mais frequência. A reunião de equipe pode ter duração
de duas horas.
Pontos essenciais a considerar
1. A oferta de consultas deve ser feita com base em uma análise da equipe sobre
a demanda do usuário e não por ordem de chegada. O agendamento por livre
37
demanda gera como consequências o esgotamento da oferta de atendimentos
médicos em curto prazo e fila de espera. O acesso por fichas desrespeita os
princípios da universalidade e equidade. A equipe não atende em tempo
oportuno as demandas, aumentando as chances de absenteísmo, a insatisfação
do usuário e gera a não efetivação da APS como porta de entrada preferencial.
Muitas pessoas que poderiam ter seu problema resolvido numa orientação na
escuta inicial ou numa consulta com outro profissional/outro serviço ficam
aguardando por atendimento, ocupando a vaga de pessoas que necessitariam
de uma consulta de fato. Cabe ressaltar que, para iniciar mudanças na rotina de
trabalho da unidade, é muito importante contar com a participação dos
usuários: a equipe deve esclarecer as razões para a mudança em espaços
abertos de diálogo como reuniões com associação de moradores, conselho
local de saúde, assembleia, etc.
2. A agenda reflete o modo de funcionamento da equipe – para compartilhar a
agenda é necessário planejamento e comunicação entre os profissionais,
garantindo alinhamento, de modo que esteja claro para todos os critérios para
o uso racional da agenda. Por exemplo, é necessário trabalhar em reuniões de
equipe com protocolos clínicos, para que fique claro para todos quando uma
demanda é considerada de urgência ou quando pode aguardar. É também
preciso criatividade para experimentar diferentes estratégias e formatos de
agenda até chegar à conformação mais interessante para a equipe.
3. Para que o gerenciamento da agenda seja eficaz é pré-requisito que a equipe
tenha mais ofertas do que apenas atendimento médico – ou seja, que algumas
demandas possam ser resolvidas no próprio acolhimento a partir da discussão
de caso ou interconsulta com o médico/enfermeiro e que o enfermeiro também
realize atendimento à demanda espontânea, contando com o apoio do médico
para os casos em que for necessário. Desta forma, aumentam o número de
consultas disponíveis na agenda.
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
38
CAPÍTULO 5
ORGANIZAÇÃO DAS EQUIPES
No processo de qualificação da APS, a organização das atividades desenvolvidas
pelas equipes assume um lugar fundamental. Como é essencialmente desenvolvida
com trabalho em equipe multidisciplinar, a APS necessita repensar arranjos e garantir
espaços de pactuação de fluxos, responsabilidades e atividades dos membros da
equipe.
Ainda é escassa a produção brasileira sobre alguns temas relevantes que fazem
parte do dia a dia das equipes e constituem grandes desafios no âmbito dos serviços.
De forma geral, profissionais são alocados em Unidades Básicas de Saúde sem a
devida reflexão e pactuação do trabalho em equipe. Cada trabalhador carrega
consigo suas vivências de trabalhos anteriores e acúmulos dos processos formativos
que podem ter grandes diferenças entre eles no momento de configuração da
equipe. A necessidade de alinhamento do trabalho a ser feito a múltiplas mãos é
determinante para o sucesso da produção do cuidado na APS.
Neste capítulo, são apontadas algumas temáticas que merecem atenção por
parte das equipes e gestores, por fazer parte do cotidiano, sem muitas vezes se dar
o seu devido olhar estratégico para qualificação dos serviços. Mais do que a
sistematização de evidências da literatura, são apontamentos no formato de reflexões
e sugestões a partir da observação e acompanhamento de diversas experiências de
conformação e organização das equipes de APS em muitas cidades brasileiras.
Reuniões de equipes
De acordo com a Política Nacional da Atenção Básica, são atribuições comuns
a todos os profissionais “realizar reuniões de equipe a fim de discutir em conjunto o
planejamento e a avaliação das ações da equipe, a partir da utilização dos dados
disponíveis” (BRASIL, 2011). Objetiva-se, com isso, discutir, elaborar e decidir
estratégias para o desenvolvimento de ações consideradas necessárias para o
cuidado da saúde da população moradora do território adstrito às UBS (GRANDO;
DALL’AGNOL, 2010).
Toda equipe de APS deve ter em sua agenda um espaço para reunião de
equipe, prevendo a participação de todos os profissionais. Na reunião de equipe
orienta-se a realização da programação semanal, escalas da agenda e de férias,
revisão de fluxos de trabalho, discussão de casos, monitoramento de indicadores da
equipe, priorização de visitas e atendimentos domiciliares, planejamento de ações,
informes, questões administrativas, entre outros.
As reuniões de equipe devem ocorrer nos horários de menor demanda da UBS.
Observa-se, de forma geral, que boa parte das UBS têm o horário de menor pico de
demanda das 15 horas às 17 horas. Momentos de educação permanente sobre
39
temáticas de interesse de todos os membros da equipe podem ser feitos
aproveitando o espaço de reunião ou quando necessário em outros momentos com
esta finalidade exclusiva.
Sugere-se um encontro diário rápido (dez minutos) entre todos os profissionais
da equipe, preferencialmente no início ou no término do dia, para avaliar e planejar
ações cotidianas e agilizar a tomada de decisões pela equipe. Para o bom
aproveitamento das reuniões semanais, orienta-se a observância aos seguintes itens:
Disponibilidade de infraestrutura adequada: local, na UBS ou fora dela, com
capacidade de acomodação de todos os participantes da reunião, idealmente
em roda, e dos recursos estruturais necessários à condução da mesma, tais
como quadro de anotações ou projetor de material multimídia, cartazes, entre
outros.
Organização das pautas: os pontos a serem abordados devem ser
previamente organizados e divulgados aos participantes, a fim de potencializar
a capacidade de contribuição dos presentes com as discussões, assim como
definir as melhores estratégias metodológicas à abordagem dos mesmos.
Definição da figura de coordenação da reunião: cabe ao(à) coordenador(a) da
reunião mediar a discussão, em tempo hábil e com qualidade, de todos os
pontos de pauta destacados para a reunião de equipe, assim como
sistematizar os encaminhamentos apontados para cada um desses pontos.
Manutenção atualizada da memória das reuniões: é importante manter
atualizado e disponível para toda equipe o registro dos principais pontos
discutidos e os encaminhamentos dados aos mesmos em cada reunião. Indica-
se que o relator (que pode ser qualquer um dos membros da equipe) tenha
sempre em mãos as memórias das últimas reuniões, a fim de retomá-las,
quando necessário.
É indispensável ao bom proveito das reuniões e do trabalho em equipe, além
dos itens acima listados, a capacidade de conviver com a diferença, respeitando-a e
fazendo da variedade de perspectivas e opiniões substrato para a composição de um
trabalho em equipe integrado e resolutivo. As reuniões de equipe são momentos
proveitosos ao desenvolvimento de atividades variadas, a depender das necessidades
identificadas pelas equipes em cada momento, tais como:
Encaminhamento de questões administrativas: realização de combinações
acerca de questões relativas ao funcionamento da UBS, como a organização
de escala de folgas, férias, trabalho na recepção, divisão do tempo de uso dos
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
40
computadores disponíveis na UBS, definição de escala de trabalho no terceiro
turno, se houver, entre outros.
Monitoramento e avaliação de indicadores: levantamento e análise coletiva
dos resultados produzidos pela equipe nos indicadores de saúde relativos à
Atenção Básica, assim como definição de ações necessárias à qualificação do
processo de trabalho da equipe relativo aos indicadores que tenham
apresentado resultado insatisfatório. Indicamos que reuniões com pauta
especifica de monitoramento e avaliação dos indicadores sejam realizadas
trimestralmente.
Planejamento de ações: as reuniões de equipe também podem ser utilizadas
para organizar ações como campanhas de vacina, reuniões do Conselho Local
de Saúde, oferta de grupos de usuários, atividades nas escolas e espaços
comunitários do território, análise e atualização do mapa do território, dentre
outros.
Discussão de caso: todas as equipes desenvolvem o cuidado de usuários que
apresentam variados graus de complexidade de suas condições de saúde.
Muitas vezes, faz-se necessário realizar discussões multiprofissionais de alguns
desses casos, a fim de criar estratégias de compartilhamento,
corresponsabilização e qualificação do cuidado, o que também pode ser feito
nas reuniões de equipe. Orienta-se a priorização dos casos, conforme
estratificação de risco.
Distribuição das demandas por visita e atendimento domiciliar: parte
importante do trabalho das equipes de Atenção Básica consiste na realização
de visitas domiciliares pelos ACS e de atendimentos domiciliares pelos demais
membros. Pode-se utilizar o espaço das reuniões para que os ACS e/ou outros
profissionais socializem as necessidades identificadas de atendimento
domiciliar a usuários e/ou famílias específicas, procedendo-se o agendamento
dos mesmos e definindo quais profissionais devem participar do atendimento
domiciliar.
Análise e revisão do processo de trabalho: segundo a Política Nacional de
Humanização (PNH) é importante que as equipes de saúde analisem
permanentemente o próprio processo de trabalho, definindo assim a
reorganização do mesmo quando necessário, a exemplo da organização do
acesso de usuários na UBS, implantação do acolhimento com classificação de
risco etc. (BRASIL, 2010). Tal exercício pode ser desenvolvido nas reuniões de
equipe, e pode se tornar mais proveitoso com a presença de apoiadores
institucionais e/ou matriciais.
41
Realização de capacitações: em consonância com a PNH, a Política Nacional
de Educação Permanente em Saúde (PNEPS) ressalta a importância de as
equipes de saúde realizarem e/ou participarem de capacitações que
qualifiquem seus processos de trabalho, organizadas a partir da análise do que
nele carece de aprimoramento (BRASIL, 2009).
Por fim, enfatizamos que as reuniões de equipe se constituem em importante
estratégia de qualificação do trabalho na APS, tendo em vista a implementação de
seus princípios e objetivos. Como apontam Cruz e colaboradores (2008, p. 177-178):
Aprendemos que as reuniões quentes e mais horizontalizadas
fortalecem a equipe, transformam o trabalho, modificam os
integrantes, criam suportes para enfrentar os desafios, geram
motivações para o trabalho, além de propiciarem a criação de
espaços para dividir angústias e sofrimentos.
Carteira de serviços na APS
O estabelecimento da Carteira de Serviços da APS se coloca como algo
estratégico para definição clara do elenco de ações e serviços prestados pelas UBS de
cada município. As equipes têm singularidades e algumas características, como
composição da equipe e especificidades do território, podem demandar ações
diferenciadas, mas existem ações mínimas que todas as equipes deveriam realizar.
A partir da carteira de serviços são definidos padrões de atendimento, formas
de organização e horário de funcionamento da UBS, escopo de atuação clínica/
assistencial dos profissionais, procedimentos a serem ofertados, entre outros. Com
estas definições, tornam-se mais objetivas também as demandas e recursos
necessários para estruturação dos serviços, a exemplo de:
a) processos de atualização ou capacitação para alguns temas específicos
sobre os quais algum profissional da UBS não tenha segurança em
desempenhar, a exemplo da coleta de cito patológico, drenagem de
abscesso ou realização de teste rápido;
b) insumos ou equipamentos para realização de procedimentos previstos
na Carteira, a exemplo de fio para sutura ou sonar para realização de
pré-natal;
c) utilização de protocolos clínicos e de encaminhamento para atenção
especializada.
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
42
Pode-se destacar algumas capitais brasileiras que têm trabalhado com a
proposta de Carteira de Serviços no sentido de organizar a sua rede de APS. Como
exemplos se pode citar Curitiba, Florianópolis, Natal e Rio de Janeiro.
A construção da Carteira de Serviços deve ser um processo coletivo de
pactuação entre a gestão municipal e o conjunto de profissionais das equipes da APS.
Por isso, é importante a discussão coletiva envolvendo gestão e profissionais pode
não apenas tornar mais rica a carteira de serviços em termos de conteúdo, mas ter
como consequência a qualificação do trabalho das equipes a partir da discussão
estabelecida. Esse processo ajuda também a dar mais transparência e visibilidade às
ações e serviços ofertados pelo município no âmbito da APS, é importante que sejam
disponibilizadas versões resumidas junto aos Conselhos de Saúde e usuários.
Procedimentos a serem realizados nas UBS
Para serem efetivamente resolutivas, as UBS precisam estruturar a oferta de um
grande leque de procedimentos. Sem dúvida, ao se tornarem mais resolutivas, a APS
tende a ter maior reconhecimento social e político da população. No quadro abaixo,
são listados exemplos de procedimentos que devem ser ofertados pelas UBS.
Quadro 1 - Exemplos de procedimentos realizados em UBS
Deve-se buscar ofertar os diversos procedimentos ao longo de todo o horário
de funcionamento da UBS. Vacinas, nebulizações, testes rápidos, suturas,
43
cantoplastias, curativos, colocação de DIU, são exemplos de procedimentos que
exigem uma organização da equipe e certa flexibilidade na agenda para que, em
havendo a procura do usuário na UBS, tais procedimentos possam ser ofertados sem
a necessidade de agendamento especifico.
A oferta desses procedimentos retrata muito bem exemplos de quando
abordamos sobre a importância da APS não ser centrada no profissional/equipe, mas
na necessidade do usuário. Um exemplo é a oferta do Teste rápido para HIV. Algumas
UBS destinam turnos específicos para a realização do Teste rápido, ou então agendam
o procedimento no momento de procura do usuário.
É fundamental nos colocarmos no lugar do usuário e imaginarmos que o
momento em que ele busca a UBS talvez tenha sido o grande momento em que ele
se encorajou para tirar a dúvida sobre possível contaminação após uma exposição de
risco. Não aproveitar este momento, pode fazer com que se perca a chance do
diagnóstico de HIV de um usuário, pois ele pode não reunir tanta coragem
novamente para procurar pela segunda vez a UBS para realização do teste no dia
agendado ou o dia em que é melhor para equipe.
Outro exemplo é o da vacina. Investe-se muito tempo e recursos em campanhas
de vacinação, mas muitas vezes a agenda da UBS para oferta da vacina torna-se uma
barreira de acesso ao usuário. Como a criança depende de seus pais para ir à UBS se
vacinar, qualquer limitação no horário de disponibilização da vacina pode impedir
que pais que trabalhem o dia todo levem o seu filho no momento que surge uma
brecha no seu trabalho, como o primeiro horário da manhã ou no final da tarde perto
do horário da UBS fechar.
Nem sempre o melhor para a equipe é o melhor para o usuário. A oferta de
atividades e procedimentos deve ser centrada no que for melhor para o usuário,
facilitando o seu acesso. No planejamento e organização da oferta dos
procedimentos na UBS, deve-se analisar o responsável por cada um, buscando
melhor distribuição do trabalho e evitando sobrecargas. Para tanto é importante a
análise das competências e habilidades técnicas de cada membro da equipe e de
forma solidária investir em processos de atualização/capacitação daqueles que se
sentirem inseguros ou despreparados.
Reitera-se a necessidade de maior investimento no papel e na capacidade do
técnico de enfermagem que pode assumir diversos procedimentos realizados até
então pelo enfermeiro. Da mesma forma, deve haver uma solidária pactuação e
divisão de trabalho entre médicos e enfermeiros, evitando sobrecargas de trabalho.
Organização de grupos de usuários
Um dos aspectos importantes no cotidiano da APS é a organização de grupos
de usuários. Muitas vezes, quando se fala no papel da APS na promoção da saúde e
prevenção de doenças, se associa diretamente a realização das atividades de grupos
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
44
como único espaço estratégico para estas práticas. Este entendimento já carrega em
si mesmo alguns desvirtuamentos sobre as potencialidades e finalidades do trabalho
em grupo e da não observância da transversalidade das práticas de prevenção e
promoção que devem perpassar também pelo âmbito da clínica no momento da
consulta individual.
A realidade do dia a dia de boa parte das equipes da APS aponta que a
organização de grupos se torna um desafio e muitas vezes a causa de frustrações
para os profissionais que conduzem. São diversas as questões que devem ser
aprofundadas no planejamento e organização de grupos. Mas um primeiro aspecto
é que no âmbito da formação profissional em saúde, de forma geral, pouco se aborda
e apreende sobre processos de condução de grupos (FURLAN, 2010). Há a demanda
de formação dos profissionais que estão nas equipes para desenvolvimento desta
atividade. Neste sentido, é fundamental observar as finalidades dos grupos,
metodologias e formas de condução.
Os grupos compõem a agenda da equipe e devem ser organizados de forma a
não sobrecarregar nenhum dos profissionais e nem mesmo desfalcar a prática do
cuidado no âmbito das consultas individuais de enfermagem, médica e odontológica.
Os grupos devem ser encarados como mais um importante recurso da equipe para
desenvolvimento de ações em diversas frentes, desde a promoção da saúde, a
exemplo dos grupos de convivência, mas também como recurso terapêutico no
âmbito da clínica, a exemplo dos grupos pacientes com condições crônicas
(diabéticos, hipertensos e gestantes).
Visitas e atendimentos domiciliares
A possibilidade de profissionais da UBS realizarem atendimentos no âmbito do
domicilio do usuário com restrição ou dificuldade de locomoção, a partir da
identificação de uma condição clínica ou de vulnerabilidade especifica, é um dos
diferenciais da Atenção Primária à Saúde. Para melhor organização da agenda da
equipe e definição do profissional que fará o atendimento domiciliar, é necessária a
utilização de ferramentas que possibilitem a estratificação de risco familiar e
protocolos que definam o tipo de abordagem e cuidados a serem ofertados em cada
caso.
Nos últimos anos, diversas equipes passaram a utilizar a proposta de
classificação de risco familiar sistematizada por Savassi, Lage e Coelho (2012). A
utilização da classificação de risco familiar pode contribuir para o melhor
planejamento das atividades de visita domiciliar do ACS e de atendimento domiciliar
realizado pelos profissionais, ainda mais quando se considera o grande número de
pessoas adscritas na maioria das UBS, o que demanda a construção de estratégias de
priorização na agenda de visitas/atendimentos domiciliares. Da mesma forma,
planejar quem realiza cada atendimento é fundamental, tendo-se o cuidado de
45
manter a UBS em funcionamento com atendimento dos usuários. Neste sentido, é
fundamental evitar que médico e enfermeiro se ausentem da UBS no mesmo turno.
No âmbito do atendimento domiciliar a utilização de ferramentas para
priorização do cuidado individual, com sistematização de possíveis ações e
responsáveis pelo cuidado é essencial (SAVASSI, 2012). A partir da análise dos
pacientes acamados ou domiciliados, classificação de risco e definição de ofertas de
cuidado, a equipe pode atuar de forma mais equitativa, evitando que uma rotina de
agenda sem planejamento prévio colabore com a piora do quadro clínico de muitos
usuários, por não terem possibilidade de encaixe na escala de atendimentos muito
cheia. Da mesma forma, é fundamental o planejamento de ações educativas junto a
familiares e cuidadores deste segmento da população, sendo um exemplo de
atividade a oferta de minicursos com orientações básicas para cuidadores e familiares.
Para diferenciação como registro para o Sistema de Informação da Atenção
Básica (SISAB), a visita domiciliar é realizada pelo agente comunitário de saúde e
agente de combate às endemias, enquanto profissionais de nível superior e
profissionais de nível médio realizam e registram no SISAB atendimentos domiciliares.
Por fim, deve-se lembrar que os atendimentos realizados fora da UBS também
podem ser feitos em escolas ou creches, abrigos ou instituições de longa
permanência, unidades prisionais, unidades socioeducativas, unidades móveis e na
rua. Todos estes locais de atendimento são passíveis de registro no SISAB e
demandam processos de planejamento da agenda da equipe.
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
46
CAPÍTULO 6
GRUPOS NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
O uso da palavra grupo indicando um conjunto de elementos é relativamente
recente. Foi na metade do século XVIII que passou a designar não somente um
conjunto de coisas, mas também uma reunião de pessoas (NERI, 1999). Grupo pode
ser definido como “um conjunto de pessoas em uma ação interativa com objetivos
compartilhados” (OSÓRIO, 2000, p. 11). Um grupo não é um somatório de pessoas,
ele se constitui como uma nova entidade, com leis e mecanismos próprios e
específicos, no qual as pessoas estão reunidas em torno de uma tarefa ou objetivo
comum aos seus interesses (ZIMERMANN; OSÓRIO, 1997).
A utilização de grupos como estratégia de intervenção em saúde remonta ao
início do século XX com as iniciativas de Joseph Pratt com pacientes tuberculosos, em
um hospital geral de Boston, em 1905 (BECHELLI; SANTOS, 2004; CASANOVA;
OSÓRIO; DIAS, 2012). Seu formato era assumidamente educativo, consistindo em uma
breve palestra sobre higiene e tratamento da doença, seguida de uma sessão de
perguntas e discussões, permitindo troca de experiências sobre o enfrentamento da
doença. Esse modo de intervenção atravessou a história das práticas de saúde
ocidentais, tanto no âmbito público quanto nos grupos não governamentais de ajuda
mútua.
No contexto atual da APS, o trabalho com grupos é uma atividade
frequentemente realizada, tendo como foco principalmente a promoção da saúde e
prevenção de agravos. Furlan (2010) destaca algumas vantagens na realização de
grupos com os usuários.
Os grupos podem facilitar a comunicação dos profissionais com os usuários.
O espaço de grupo propicia que o saber esteja nas pessoas e não centrado
em um profissional de saúde (mas também nele).
Grupos podem trazer bons resultados para o manejo clínico da doença e
para atingir os objetivos do profissional e do paciente no seguimento do
tratamento. A possibilidade de os encontros serem continuados potencializa
o acompanhamento horizontal e o processo de aprendizado.
Os usuários podem sentir maior abertura num grupo para expor e dividir
com os demais a experiência que tem no manejo da doença, trazendo
dúvidas e curiosidades que somente o compartilhar (troca e participação)
pode propiciar.
47
O grupo pode ampliar o olhar dos profissionais e usuários sobre as relações
e os modos de viver. Olhar o indivíduo e o coletivo, como também o
indivíduo em coletivo, pode ajudar no processo de tratamento e o
acompanhamento do sujeito.
A prática em grupo possibilita que várias pessoas que são da mesma
comunidade, que têm pensamentos e hábitos semelhantes, histórias de vida
e valores parecidos se reúnam. A troca de experiências pode possibilitar que
se forme uma rede social e de suporte para além do grupo (FURLAN, 2010,
p. 107-109).
Tipos de grupos
Ao planejar a formação de um grupo é muito importante refletir sobre o
público-alvo e a finalidade da ação, de modo a selecionar o formato mais apropriado
para responder às necessidades do contexto ou problema para o qual planejamos
uma intervenção.
Os grupos podem ser classificados de muitas formas. Segundo Zimermann e
Osório (1997), a essência dos fenômenos grupais é a mesma em qualquer tipo de
grupo. O que determina diferenças entre os grupos é a finalidade para o qual eles
foram criados e compostos. Influenciam as vertentes teóricas utilizadas, o tipo de
setting que preside o grupo (constituição), a finalidade, as pessoas que compõem o
grupo, a área em que o grupo está sendo aplicado, o tipo de vínculo estabelecido
com o coordenador e o tipo de técnica aplicada.
Quanto à sua constituição, os grupos podem ser classificados de duas formas:
se são abertos ou fechados e se são homogêneos ou heterogêneos.
Fechados: é considerado fechado aquele grupo que, após sua formação,
não permite a entrada de novos integrantes. Estes grupos se iniciam com
pessoas definidas. Para inserção de pessoas novas há que se ter novo
contrato, e é preciso o seguimento para concluir o tratamento/orientação.
Os grupos fechados costumam ter duração prevista, por terem foco
delimitado.
Abertos: os grupos são considerados abertos quando aceitam a inserção de
novos participantes após seu início. Geralmente têm duração ilimitada. Nos
grupos abertos sempre que houver vaga, podem ser admitidos novos
membros, com temática aberta, divulgação geral na comunidade, sem
exigência de frequência de participação.
É possível trabalhar os mesmos temas, tanto em grupos abertos como em
grupos fechados, a depender dos objetivos no acompanhamento dos casos e de
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
48
acordo com o risco, com a importância da formação de vínculo entre as pessoas e
dos resultados almejados. Assim, é importante considerar as vantagens e
desvantagens de cada escolha.
Num grupo aberto, por exemplo, o número de participantes pode ser um pouco
maior que num grupo fechado, pois os critérios de seleção são menos exigentes. Já
o grupo fechado oportuniza maior possibilidade de vínculo e de construção de
confiança entre as pessoas, visto que os pacientes e o profissional que os
acompanham são sempre os mesmos. Os grupos abertos, por terem sempre entrada
de novas pessoas, costumam ser espaços mais voltados para convivência, educação
e informação.
Assim, se no grupo serão tratados temas para os quais são fundamentais o sigilo
e a confiança entre as pessoas, o ideal seria um grupo fechado. Conforme Furlan
(2010), “o espaço protegido é que vai garantir que apareçam elementos fundamentais
da história de vida e dos sentimentos daqueles que estão ali, se isso for pertinente
para o tratamento ou para a melhoria das condições de saúde e de vida”.
Um grupo de gestantes pode ser aberto, prevendo a entrada de usuários a
qualquer tempo de sua realização, ou fechado, definindo o público a partir da idade
gestacional por exemplo. Grupos voltados a Hipertensos e Diabéticos, que são
comumente grupos abertos na APS e sem limite de tempo de duração, podem ser
realizados de forma fechada, como no caso das consultas coletivas voltadas às
pessoas com condições crônicas. Neste formato, os participantes tem um perfil
definido e podem ser planejadas metas clínicas a serem alcançadas considerando as
possibilidades do quadro clínico de cada usuário (BRASIL, 2014).
Ainda em relação à constituição, os grupos podem ser classificados em
homogêneos ou heterogêneos.
Homogêneos: quando possuem características em comum como, por
exemplo, uma mesma categoria de patologia (diabéticos, asmáticos,
depressivos, psicóticos, usuários com transtornos psicossomáticos),
idade ou ciclo vital (crianças, adolescentes, idosos, gestantes), sexo
(grupo de mulheres), etc. Este tipo de grupo pode ser favorável ao
processo terapêutico por promover identificação entre as pessoas. Esse
mesmo aspecto pode ser apontado como uma desvantagem por não
favorecer tanto a convivência com as diferenças e no sentido de que, ao
longo do tempo, a homogeneidade pode ser fator de reforço de
discriminação entre aqueles que se sentem inferiorizados por sua
condição (CASANOVA; OSÓRIO; DIAS, 2012).
Heterogêneos: os grupos heterogêneos são aqueles em que as pessoas
têm características diferentes entre si, comportando, no caso de um
grupo terapêutico, por exemplo, variações no tipo e grau de doença. Os
participantes podem ter em comum alguns aspectos, como a faixa etária,
49
por exemplo, mas os motivos pelos quais foram indicados ao grupo são
distintos. Um exemplo são grupos terapêuticos com pessoas de
diferentes nosologias neuróticas (CASANOVA;, OSÓRIO; E DIAS, 2012).
Em relação à FINALIDADE, os grupos podem ser classificados em dois grandes
ramos: grupos operativos e grupos psicoterápicos.
Grupos psicoterápicos: são grupos que se destinam à psicoterapia.
Podem estar embasados em diversas teorias, como as psicodramáticas,
sistêmica, cognitiva-comportamental e psicanalítica. Embora todos os
grupos operativos tenham de uma indiscutível ação terapêutica, os
grupos psicoterápicos distinguem-se dos demais por terem foco na
aquisição de insight, seja de aspectos inconscientes dos indivíduos ou da
totalidade grupal (ZIMERMANN; OSÓRIO, 1997).
Grupos Operativos: é bastante ampla a conceituação e as aplicações
práticas da expressão “grupo operativo”. A criação do conceito, aplicação
e divulgação destes grupos deve-se muito a Enrique Pichón-Rivière,
psiquiatra e psicanalista suíço radicado na Argentina, estudioso dos
grupos, que construiu todo um conceitual referencial, considerando
tanto fatores conscientes quanto inconscientes, que regem a dinâmica
de qualquer campo grupal (ZIMERMANN, OSÓRIO, 1997). Os grupos
operativos podem ser de ensino-aprendizagem, institucionais,
comunitários e terapêuticos.
Consideram-se grupos institucionais aqueles realizados em instituições de forma
geral, como escolas, igrejas, exércitos, sindicatos e empresas. Um exemplo são
reuniões de pais, mestres e alunos para debater a formação. Já os grupos
comunitários são aqueles voltados à integração e incentivo às comunidades.
Os grupos operativos terapêuticos visam a uma melhoria de alguma patologia,
seja ela no plano orgânico ou psíquico, ou em ambos. A forma mais utilizada são os
grupos de autoajuda ou ajuda-mútua, reunindo pessoas que se identificam a partir
de características semelhantes, ajudando-se reciprocamente. Podem se formar
espontaneamente ou a partir do estimulo de algum profissional, que coordena o
grupo até que este se sinta pronto para caminhar sozinho ou com seu apoio.
Os grupos de ajuda-mútua são homogêneos, pois são compostos por pessoas
que compartilham necessidades e prejuízos similares. São exemplos os grupos de
adictos (fumantes, alcoólatras), cuidados primários em saúde (hipertensos, diabéticos),
reabilitação (que tiveram infarto, colostomizados), suporte (pacientes terminais,
pessoas com problemas crônicos, sejam eles físicos ou psíquicos), entre outros
(ZIMERMANN, OSÓRIO, 1997).
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
50
Nestes grupos tem papel fundamental o reforço às conquistas na luta diária para
superação dos problemas, com força na motivação grupal. Este tipo de grupo traz
como vantagem ao entendimento e aceitação por parte dos integrantes pela partilha
de vivências similares, aumentando a adesão ao tratamento, proporcionando
envolvimento comunitário e novos modelos de identificação. São uma ótima
indicação para pessoas que têm prejuízo social, por exercerem uma função continente
e por gerarem para os usuários uma sensação de que não estão sós, que não são os
únicos que enfrentam limitações (CASANOVA, OSÓRIO, DIAS, 2012).
Nos grupos de ensino-aprendizagem encontramos um tipo interessante de
grupo, cujo objetivo é refletir e indagar as tensões oriundas do processo de
aprendizagem: os grupos de reflexão. São úteis em situações em que surgem tensões
grupais decorrentes da realização de outras tarefas, sejam elas originadas no estudo
ou na formação, no trabalho ou na convivência institucional. Distinguem-se dos
grupos terapêuticos porque não visam ao tratamento e sim à remoção de dificuldades
que estejam impedindo que os grupos consigam realizar suas tarefas (ZIMERMANN,
OSÓRIO, 1997).
Pontos a considerar na formação de grupos
A realização de grupos não é uma atividade simples. Conforme Casanova,
Osório e Dias (2012), tal atividade envolve uma série de aspectos para que seja uma
oferta resolutiva e de qualidade. É necessário planejar e ter objetivos claros na
realização de um grupo, seja por meio do conhecimento da situação-problema, sobre
as patogenias em questão (como hipertensão, depressão), seja pela organização das
intervenções que serão realizadas na abordagem.
Em Atenção Primária à Saúde (APS), a realização de um grupo vai,
basicamente, responder às necessidades que têm origem nas
características da comunidade, nas demandas que essa exige e,
também, nas habilidades de um facilitador que consiga responder às
situações mais complexas que possam aparecer (CASANOVA,
OSÓRIO, DIAS, 2012, p. 267).
O grupo é um dos recursos que a equipe de APS pode lançar mão para intervir
sobre um problema. Assim, ao planejar uma intervenção, a equipe deve refletir sobre
as vantagens e desvantagens de realizar uma ação individualmente ou em grupo. A
“coletivização” de ações não necessariamente leva a melhores resultados.
Realizar essa escolha pode não ser tão simples, pela ausência de estudos
demonstrando a frequência e importância tanto dos problemas de saúde quanto da
efetividade das intervenções. Ponderar alguns aspectos como evidências científicas
sobre a efetividade da ação coletiva, a habilidade dos profissionais, a aceitabilidade
da população e a relação custo-efetividade entre o tempo a ser dispendido nas
51
práticas coletivas em detrimento das ações rotineiras de cunho individual é muito
importante. A revisão da literatura pode ajudar nesse sentido (TAKEDA, 2013).
O enfoque dos grupos pode ser variado, desde que propicie o aumento do grau
de autonomia e do autocuidado para melhora da qualidade de vida. Podem ter
variações dependendo de quem e como conduz o grupo, do tema, da patologia
abordada e do risco à saúde que apresentam os participantes (FURLAN, 2010).
Também precisamos considerar se é necessário formar um grupo ou se é
necessário um outro tipo de ação coletiva, aproveitando um agrupamento de
pessoas, já seria suficiente para atingir os objetivos da equipe. Um agrupamento é
uma forma de reunir as pessoas. Porém, diferencia-se do grupo por não se constituir
a partir da unidade em comum, de uma necessidade conjunta. Por exemplo, quando
uma unidade de saúde faz um chamamento para as mães para medir e pesar crianças
menores de dois anos, se constitui um agrupamento. Já um espaço de encontro que
proporcione atendimento clínico em grupo, conversar sobre dúvidas do crescimento
dos filhos, angústias, alimentação ou outras questões que poderiam construir um
comum entre elas pode ser considerado um grupo (FURLAN, CAMPOS, 2010).
Assim, antes de reunir as pessoas, é importante que os profissionais se
perguntem por que agrupá-las, o que pode ser interesse comum entre elas e o que
se pretende atingir. Para algumas finalidades, pode ser mais interessante realizar uma
atividade coletiva, aproveitando as pessoas aguardando na sala de espera, por
exemplo, do que propor um grupo. A equipe precisa sempre se perguntar sobre a
eficiência da proposta – ou seja, o quanto ela atinge os objetivos, considerando o
custo dos recursos utilizados (neste caso, em especial o tempo necessário a ser
destinado para realização da atividade pelos profissionais).
Muitos profissionais de saúde realizam grupos na expectativa de economia de
recursos e tempo da equipe, juntando pessoas para passar a mesma informação num
único momento. É importante considerar que o tempo dispendido por um profissional
para realização de um grupo não é apenas o período em que estará reunido com os
usuários.
Realizar um grupo com qualidade envolve investimento de tempo antes da
realização do grupo (para planejamento, chamamento e divulgação para os usuários),
durante (realização do grupo em si) e depois (avaliação de cada encontro,
planejamento dos próximos e alinhamento constante entre os membros da equipe
responsáveis pela condução do grupo). Considerando estes aspectos, um grupo
talvez possa consumir mais tempo da agenda de um profissional do que atividades
realizadas individualmente.
Condução dos grupos
Segundo Zimerman e Osório (1997) são necessários ao coordenador de grupos
alguns conhecimentos, habilidades e atitudes, como por exemplo: ser continente para
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
52
conter angústias e necessidades dos outros e suas próprias, ser capaz de colocar-se
no lugar do outro (ser empático), ter a capacidade de discriminar entre o que lhe
pertence e o que é do outro (devido às intensas identificações projetivas grupais),
saber comunicar-se adequadamente (verbal e não verbalmente), gostar e acreditar
nos grupos, entre outros.
Nas equipes de APS, é importante, se possível, realizar o trabalho em dupla.
Dessa forma facilita-se a continuidade do grupo (no caso de férias e faltas) e também
a riqueza a partir do olhar e da condução de mais de um profissional sobre os
integrantes do grupo e o processo grupal. É possível haver também um revezamento
entre os membros da equipe e convite a pessoas externas, sendo, neste caso, muito
importante eleger uma referência fixa para condução, organização e seguimento do
grupo.
Não existe uma categoria profissional mais adequada que outras para
coordenar grupos. Muitos profissionais de saúde podem auxiliar na condução. O
papel do agente comunitário de saúde nas equipes, por exemplo, pode facilitar seu
desempenho como coordenador de alguns grupos. O vínculo, o conhecimento da
realidade daquela comunidade, as histórias e o modo como eles lidam com as
relações na vida podem auxiliar na adesão e fortalecimento do grupo. Conforme
Ferreira Neto e Kind (2009), o planejamento dos grupos em reunião de equipe antes
dos encontros pode ser muito positivo.
Grupos realizados na APS: considerações
A seguir, são apresentados em destaque alguns temas ou ações referentes a grupos
tratados com frequência na APS.
Tabagismo
Em parceria com o Instituto Nacional de Câncer (INCA), o Ministério da Saúde
desenvolveu um Programa para Cessação de Tabagismo destinado a ajudar os
participantes a deixarem de fumar. O programa consiste de uma abordagem ativa e
pragmática, em que os participantes são incentivados a aplicar o que aprendem com
o Programa em vários aspectos de sua vida.
O programa consiste de quatro sessões de grupo (de 10 a 15 pessoas), de uma
hora e meia, uma vez por semana, por um período de quatro semanas. Num
programa com essa duração, obtém-se tanto êxito quanto num programa mais
longo. Ele aborda os comportamentos, pensamentos e sentimentos dos fumantes,
com elementos que são significativos para ajudar fumantes a pararem de fumar e a
permanecerem sem cigarros.
Utiliza-se também da interação de grupo para incentivar e apoiar as mudanças,
sem, no entanto, estimular a dependência dos participantes ao grupo. Embora tenha
sido elaborado para ser aplicado desta forma, pode haver flexibilidade, conforme a
53
necessidade do grupo. Existem opções como conduzir encontros mais demorados,
onde filmes sejam exibidos ou as discussões do grupo sejam mais profundas.
O Programa deve ser coordenado por dois profissionais de saúde de nível
universitário, previamente capacitados e que possuam as seguintes qualidades:
tenham compromisso com a prevenção da saúde, gostem de trabalhar com grupos,
tenham facilidade de relacionamento, flexibilidade e bom senso, sejam capazes de
falar simples e diretamente e não serem fumantes. No entanto, caso não haja
disponibilidade dos dois profissionais, os grupos poderão ser orientados somente por
um deles.
Cada sessão deverá ser dividida em quatro etapas, sendo elas: atenção
individual, estratégias e informações, revisão e discussão e tarefas. Cerca de 25
minutos deverão ser utilizados para a atenção individual, as estratégias e informações
e revisão e discussão. Para a determinação das tarefas deverão ser gastos no máximo
os 15 minutos finais. As quatro fases têm o objetivo de ajudá-lo a estruturar as sessões
de grupo e a determinar quanto tempo será dedicado às várias atividades. Não é
necessário nem desejável chamar a atenção para a separação e o início de cada fase.
O tratamento para cessação do fumo deve utilizar tanto a abordagem
cognitivo-comportamental quanto o tratamento farmacológico. Este tipo de
abordagem combina intervenções cognitivas com treinamento de habilidades
comportamentais, o que é bastante utilizado para o tratamento das dependências
químicas. Este tipo de tratamento geralmente é realizado por psicólogos ou médicos
treinados. Os componentes principais da abordagem cognitivo-comportamental
envolvem a detecção de situações de risco de recaída, o desenvolvimento de
estratégias de enfrentamento.
O tratamento medicamentoso pode ser utilizado como um apoio, em situações
bem definidas, para alguns pacientes que desejam parar de fumar. Esse tratamento
tem a função de facilitar a abordagem cognitivo-comportamental, que é a base para
parar de fumar.
Gestantes
O modelo de reuniões em grupos de gestantes com a participação dos casais
para esclarecer dúvidas, tranquilizar os temores e orientar sobre as modificações
fisiológicas da gravidez, sobre o processo da parturição e sobre os cuidados com o
recém-nascido tem sido uma forma adequada de auxiliar na promoção da
compreensão da gestante e de sua família. A dinâmica de grupo favorece a troca de
experiências e ajuda a desfazer o ciclo de ansiedades e temor. Na gestação, a mulher
está muito motivada e preocupada com o bebê, buscando os melhores cuidados para
assegurar o nascimento saudável (BRASIL, 2009; DUNCAN et al. 2013).
Orientações sobre amamentação, quando estimuladas e bem orientadas,
podem aumentar a incidência de amamentação e prolongar o período de aleitamento
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
54
natural. Não haverá limitação para os exercícios físicos, mas a paciente deverá ser
orientada a realizá-los com moderação e a evitar situações que coloquem em risco a
gestação. Quanto à nutrição, pode receber orientações de promoção da alimentação
saudável com foco, por exemplo, na prevenção dos distúrbios nutricionais e das
doenças associadas à alimentação e nutrição, ou em baixo peso, sobrepeso,
obesidade, hipertensão e diabetes, ou ainda em suplementação de ferro, ácido fólico
e vitamina A. Também são importantes as orientações sobre a atividade sexual,
incluindo prevenção da AIDS e de outras doenças sexualmente transmissíveis, e o
aconselhamento para o teste anti-HIV.
As pacientes devem, ainda, ser orientadas para os sinais de alerta e o que fazer
em tais situações. É o caso, por exemplo, de sangramento vaginal, dor de cabeça,
transtornos visuais, dor abdominal, febre, perdas vaginais, dificuldade respiratória e
cansaço. Finalmente, destacam-se as orientações relacionadas à saúde bucal e a do
bebê.
Grupos de cuidadores
Outra oferta de grupo que pode ser interessante na APS são os grupos voltados
a cuidadores de acamados ou idosos no território. Muitas vezes o responsável pelo
cuidado é um familiar. Geralmente, a função de cuidador é assumida por uma única
pessoa, que assume as tarefas de cuidado e responsabiliza-se por elas sem contar
com a ajuda de outros membros da família ou da equipe. O exercício desta função
pode trazer muitos ganhos, mas em boa parte das situações, prevalece a sobrecarga,
ou seja, o ônus de ser cuidador (LICHTENFELS; SANTOS; FERNANDES, 2013).
Um grupo de apoio e suporte para cuidadores tem como objetivo principal
proporcionar trocas entre cuidadores e equipe de saúde. Podem ser realizados na
casa de algum dos cuidadores, na unidade de saúde ou em outro espaço da
comunidade. Os encontros podem trazer bem-estar, alívio de sintomas depressivos e
melhoria da integração social.
Os grupos de cuidadores podem ser abertos ou fechados, a depender dos
objetivos da equipe. Uma opção interessante é estruturar uma espécie de curso, com
temáticas específicas para cada encontro, possibilitando instrumentalizar o cuidador
a respeito de questões importantes como prevenção de escaras, alimentação e
higienização adequadas e reflexão sobre temas difíceis como as perdas e a morte,
trazendo acolhimento do cuidador e melhora no cuidado aos acamados. A inserção
de outras categorias profissionais na condução dos grupos (como a psicologia, a
nutrição e a fisioterapia) pode contribuir para a qualificação da abordagem dos temas.
Grupos e saúde mental
Os profissionais da APS se deparam cotidianamente com pessoas com algum
grau de sofrimento emocional, que vão desde questões mais pontuais até transtornos
55
mentais graves e dependência química. Algumas necessitam de uma abordagem mais
estruturada e complexa, realizada por profissionais com treinamento específico em
psicoterapias; outras se sentem bem em falar de seus problemas com aqueles que
identificam como seus cuidadores, sejam eles médicos, enfermeiros ou outros
profissionais da APS (GONÇALVES et al.2013).
Muitos grupos realizados na APS não têm como objetivo original abordar
questões de saúde mental, mas geram promoção à saúde e prevenção nessa área. A
utilização de intervenções em grupo pode ser uma ótima estratégia terapêutica, na
medida em que gera socialização, aumento de autonomia e da rede de apoio. Alguns
exemplos destes grupos realizados na APS com frequência são grupos de mulheres
(em geral grupos abertos, que visam promover reforço da autoestima e reflexão sobre
os problemas da vida diária, muitas vezes com a utilização de trabalhos manuais como
parte do processo terapêutico), grupos de terceira idade (melhoram o estado
emocional, gerando socialização) e grupos de exercício (podem reduzir o estresse,
aumentando a sensação de bem-estar, além de ser um espaço de socialização)
(GONÇALVES et al., 2013).
A parceria com profissionais dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF)
e de equipes de matriciamento em saúde mental pode ser muito proveitosa, através
de discussões e intervenções conjuntas que ampliem a abordagem da APS no sentido
da integralidade do cuidado. Através dessa parceria podem ser estruturadas muitas
ações com foco na saúde mental, como psicoterapia de grupo por exemplo.
Uma das funções terapêuticas do grupo é a capacidade de metabolizar as
ansiedades e angústias que o indivíduo não consegue elaborar sozinho. Se o
ambiente é acolhedor e o grupo favorece a convivência, o grupo contribui para que
cada um se sinta melhor, mesmo quando a atividade do grupo é intensa e cansativa.
O grupo tem a capacidade de desintoxicar a mente, eliminando tensões excessivas
que se acumulam (NERI, 1999).
Participar de um processo terapêutico em grupo pode gerar inquietações e
desconfortos, mexendo com o imaginário das pessoas, ainda mais quando a clínica
grupal ocorre dentro da comunidade de origem dos usuários. O constrangimento
pode inibir as pessoas, que se encontram para falar sobre seus problemas em uma
situação diferente de uma amizade – embora esta se efetive para alguns.
A dinâmica e fluidez do grupo dependem muito de como ele é conduzido – é
necessário que o profissional saiba como contextualizar e problematizar fatos e
eventos, transvalorar aqueles valores moralizadores que engessam uma vivência mais
livre, colocar em questão outros modos de pensar e sentir e atiçar no grupo uma
crítica das circunstâncias que causam sofrimento sem generalizar, respeitando as
singularidades. A clínica grupal deve tencionar os rótulos em relação ao sofrimento
psíquico, pelo aprendizado da importância do respeito às diferenças e pelo
acolhimento (ZIEGELMANN, 2011).
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
56
Terapia comunitária
Trata-se de um tipo específico de grupo que visa construir redes sociais
solidárias, mobilizando recursos e competências dos indivíduos, famílias e
comunidades. Segundo BARRETO (2005, p. 44), “a função da terapia comunitária não
é resolver o problema das pessoas e, sim, suscitar uma dinâmica que possibilite a
partilha de experiências e criar uma rede de apoio aos que sofrem”.
Alguns dos objetivos da terapia comunitária são: a) reforçar a dinâmica interna
de cada indivíduo, para que se torne mais autônomo e menos dependente; b) reforçar
a autoestima individual e coletiva; c) valorizar o papel da família e da rede de relações
que ela estabelece; d) suscitar um sentimento de união e identificação com seus
valores culturais; e) favorecer o desenvolvimento comunitário através do
fortalecimento dos laços sociais; f) promover e valorizar práticas culturais tradicionais,
tornando possível a comunicação entre o “saber popular” e o “científico” (BARRETO,
2005).
A terapia comunitária foi proposta pelo professor Adalberto Barreto, em 1987.
Desde lá, vem sendo desenvolvida em muitas comunidades no Brasil e em outros
países (MENDONÇA, 2012). Geralmente é um grupo aberto, podendo receber novos
participantes nos encontros e tem uma proposta metodológica específica.
O grupo inicia em roda. As pessoas são acolhidas e convidadas a falar sobre
seus problemas. O grupo escolhe um deles a partir de votação - parte-se do princípio
de que o tema mais votado reflete as necessidades da maioria das pessoas, que
escolhem o tema por identificação. A pessoa escolhida é convidada a expor com mais
detalhes seu problema e então se inicia a problematização, em que todos são
convidados a partilhar suas experiências e aprendizados em situações similares.
Ao dividirem seus problemas, as semelhanças são percebidas e cada
um se torna um espelho para que o outro se reconheça na sua
própria caminhada. A dor e o sofrimento de um são a dor e o
sofrimento de muitos. [...]Neste momento que afloram semelhanças
também aparecem as diferenças na solução dos problemas. As
múltiplas estratégias de superação criativas, resilientes e inovadoras
ajudam a perceber a existência de inúmeros caminhos possíveis,
promovendo também o reconhecimento das qualidades e o respeito
às diferenças (MENDONÇA, 2012, p. 284).
Os temas que mais aparecem nas rodas de terapia comunitária são emocionais
e relacionais, ligados a estresse e emoções dolorosas (medo, raiva, tristeza),
ansiedade, conflitos familiares, uso de álcool e outras drogas, problemas no trabalho,
rupturas de vínculos sociais (abandono, rejeição, discriminação) e violência
(MENDONÇA, 2012). Apesar de ter uma metodologia específica, os recursos teórico-
metodológicos e o enfoque sistêmico da terapia comunitária podem ser aplicados em
outros grupos da APS, seja em sua totalidade ou parcialmente.
57
Consulta coletiva
A consulta coletiva é um tipo especial de grupo, voltado a pessoas com
condições a crônicas, na qual se realiza uma abordagem clínica. No caso da
abordagem de usuários com Hipertensão e Diabetes, por exemplo, pode incluir como
ações desde anamnese, medidas antropométricas, aferição de pressão arterial e de
glicemia capilar até avaliação de resultado de exames, entre outras atividades. Trata-
se de um grupo fechado, com público-alvo e número de encontros definidos antes
do início do trabalho.
A consulta em grupo se distingue dos grupos tradicionalmente feitos na APS
voltados a hipertensos, diabéticos e gestantes, entre outros, que utilizam palestras
expositivas e não estimulam a participação ativa dos usuários. As consultas em grupo
devem ser planejadas de modo a atingir a objetivos claros, definidos pela equipe e
adequando à realidade local, que podem ser ampliar acesso, fortalecer a adesão ao
tratamento, apoiar o autocuidado e a mudança de hábitos, aumentar a satisfação da
equipe e pacientes ou melhorar desfechos clínicos (DUNCAN; GOLDRAICH; CHUEIRI,
2013).
A consulta coletiva não substitui a consulta individual. A principal vantagem de
realizar o atendimento coletivamente é proporcionar o aprendizado por pares, pois
os usuários aprendem melhor com a experiência de alguém semelhante, em um
contexto orientado por um profissional, do que com a fala exclusiva de um profissional
em uma consulta. Frequentemente, os usuários apontam aspectos úteis uns aos
outros, a partir da própria experiência com a doença e pelas semelhantes experiências
de vida (BRASIL, 2014).
As pessoas que participam do atendimento coletivo relatam que se
conhecem melhor; ficam sabendo que não são as únicas a
apresentar determinada condição de saúde; relacionam-se com
pessoas como elas; adquirem novos conhecimentos; têm
oportunidade de levantar questões livremente; e que gostam da
companhia dos demais componentes do grupo. Há evidências de
que o atendimento em grupo tem impacto na qualidade da atenção
e nos resultados em saúde; na satisfação dos usuários; no melhor
uso dos recursos; e na melhoria da qualidade de vida (BRASIL, 2014,
p. 147).
Pesquisas demonstram que pacientes que participaram de consultas em grupo
tiveram menos consultas em emergências e encaminhamentos para especialistas,
menores taxas de internações hospitalares, menos contatos telefônicos com seus
médicos e maior satisfação com o tratamento, além de melhor controle em doenças
específicas como dislipidemias e diabetes em comparação com grupo-controle
(DUNCAN; GOLDRAICH; CHUEIR, 2013).
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
58
Grupos & Educação em Saúde
Alguns grupos na APS têm objetivo de estimular os usuários à adoção e
manutenção de padrões sadios, com empoderamento para tomada de decisões que
possam melhorar a condição de saúde dos usuários e do meio em que vivem. Há
muitas opções de metodologias, dependendo da criatividade do coordenador
(CASANOVA; OSÓRIO; DIAS, 2012).
A educação em saúde é um conceito amplo - pode ser definida como uma
combinação de estratégias de avaliação e intervenção que influenciam o
conhecimento, as atitudes ou os comportamentos dos usuários. É muito importante
para a APS e não se restringe à passagem de conhecimentos, já que somente o
conhecimento não é suficiente para mudanças em comportamentos e hábitos de vida.
Assim, é necessário considerar os objetivos e motivações do usuário e estabelecer
uma abordagem colaborativa de autocuidado apoiado pela equipe junto a ele
(DUNCAN; GOLDRAICH; CHUEIRI, 2013).
Muitas equipes de APS têm estruturado suas ações como se a educação em
saúde tivesse como único meio os grupos. É importante salientar que as estratégias
de educação em saúde podem ser implementadas de muitas formas (em consultas
individuais, visitas domiciliares, através da confecção e distribuição de materiais
educativos, etc.) sendo o grupo apenas uma delas.
Trabalhar na APS significa estar em contato com a comunidade e com as
relações que nela se estabelecem. Para o grupo não é diferente. O trabalho com
grupos pode ter efeitos significativos na população, propiciando um novo olhar sobre
as relações e o modo de viver, a depender de como é conduzido.
Se desejamos uma boa adesão nos grupos, é necessário ter claro o sentido para
as pessoas e para os profissionais de estarem num espaço grupal. O grupo só opera
com continuidade quando cada um se reconhece naquelas pessoas e sente que
pertence àquele espaço. A percepção como profissionais de saúde não deve
prevalecer sobre a dos outros, com questões centradas somente naquilo que
achamos que é bom ou necessário ser trabalhado. Coordenadores que revelam
posturas impositivas ou de cunho moral impedem a formação de “grupalidade” e
diminuem a adesão esperada, pois atropelam os desejos, as histórias, os sentidos de
vida das pessoas.
Por isso, é importante que o profissional de saúde reflita sobre o papel que
desempenha na condução do grupo. Deve-se ter cuidado com “os exemplos de
comportamentos desejáveis”, pois podem ser culpabilizantes. Os aspectos cognitivos
são indissociáveis dos afetivos. Assim, a palestra até pode ter alguma utilidade, mas
com certeza muito menor que ações realizadas a partir do referencial de que o
aprendizado é mútuo entre profissionais e usuários, e não de uma via única. É
aconselhável que sejam utilizadas técnicas que propiciem o diálogo e
59
problematização dos assuntos, evitando responder diretamente às perguntas
(CASANOVA; OSÓRIO; DIAS, 2012).
Mais que reproduzir o ato de receitar fórmulas sobre como viver, o que comer,
o que tomar, em cima de prerrogativas técnicas sobre o certo-errado, ou baseado
em sua própria história de vida, o profissional de saúde deve possibilitar, no espaço
grupal, que apareçam as diversas formas de viver, de lidar com o adoecimento, com
as dificuldades, com as dores, com os sentimentos e com as histórias. A partir dos
suas próprias concepções os usuários podem reconstruir maneiras possíveis de viver
de forma mais autônoma, em rede e melhor (FURLAN; CAMPOS, 2010).
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
60
CAPÍTULO 7
GESTÃO MUNICIPAL: AÇÕES PARA QUALIFICAR OS SERVIÇOS
A partir da década de 90, com o processo de implementação do SUS,
fortaleceu-se o movimento de ampla municipalização da Saúde (HARZHEIM, 2011).
No entanto, diversos serviços e responsabilidades passaram para o âmbito da gestão
municipal, sem necessariamente a devida contrapartida relacionada ao financiamento
e suporte técnico para as gestões municipais (SOLLA, 2006). Depois de cerca de três
décadas, ainda é incipiente a organização das Secretarias Estaduais de Saúde e do
próprio Ministério da Saúde para prestação deste apoio aos municípios. Aqui, cabe
destacar algumas experiências de gestões estaduais, na Bahia e no Rio Grande do Sul,
que buscaram desenvolver a lógica do apoio institucional para fortalecer e ampliar a
capacidade gestora dos municípios para qualificação da APS (FAGUNDES, 2014;
FALLEIRO, 2014).
Sobre o financiamento, dados do Sistema de Informações sobre Orçamentos
Públicos em Saúde mostram que a maioria dos estados aplica menos de 5% do
orçamento da Saúde para apoiar os municípios no custeio da APS (BRASIL, 2016). No
caso do Rio Grande do Sul, nos últimos anos, juntamente com a organização da lógica
do apoio institucional, foi delineada uma política de incentivos financeiros voltada
para estímulo à ampliação de cobertura e qualificação do trabalho das equipes de
Saúde da Família que naquele período ampliou em muito os repasses destinados à
APS.
Ambos os estados também desenvolveram Políticas Estaduais para Atenção
Básica com a definição clara de atribuições da coordenação municipal da APS (BAHIA,
2013; RIO GRANDE DO SUL, 2014), algo até então pouco aprofundado no âmbito das
legislações do SUS.
No entanto, são experiências pontuais, quase contra hegemônicas, em meio a
um cenário de crescente priorização de recursos para serviços de atenção
especializada e principalmente atenção hospitalar, apesar da intenção e forte discurso
de diversas gestões do SUS voltado para valorização social e política da APS.
Mesmo no âmbito federal, apesar do aumento do repasse de recursos aos
municípios em números absolutos, o percentual do orçamento total da saúde
destinado à APS vem diminuindo nos últimos anos (MENDES; MARQUES, 2014).
Apesar do cenário adverso, ao longo dos anos, os municípios vêm expandindo
a ESF, aumentando oferta de serviços da APS, mas sempre permanecendo o desafio
da qualificação destes serviços. Boa parte dos municípios que sofre com a falta crônica
de recursos opta por aplicar a totalidade do seu orçamento da APS em custeio para
manutenção das equipes, não sendo priorizado o desenvolvimento de ações para
qualificação dos serviços. Muitas vezes, não se dimensiona com precisão e nem se
qualifica a organização da equipe vinculada à gestão municipal para desenvolvimento
61
de todas as atribuições previstas para as secretarias municipais de saúde no que se
refere à gestão da atenção primária.
Considerando a escassa produção acadêmica e institucional sobre a gestão
municipal da APS e as responsabilidades dos municípios previstas na PNAB, neste
capítulo são listados alguns eixos estratégicos que servem de sugestões para
organizar a ação da gestão municipal de saúde no sentido de qualificar os serviços
de APS.
Estrutura organizacional da APS nas Secretarias Municipais de Saúde
Ainda existem no país prefeituras que, na estrutura das suas secretarias
municipais de saúde, não contam, especificamente, com setor ou coordenação para
Atenção Primária. Para muitos municípios de pequeno porte ainda prevalece a
concepção de que o profissional de enfermagem que trabalha na unidade básica de
saúde pode desempenhar em paralelo ações relativas à gestão da APS. Mesmo
municípios de maior porte contam muitas vezes com apenas um profissional de
referência que, sozinho, acaba por assumir as funções emergenciais, burocráticas e
administrativas.
Em meio às diversas responsabilidades de uma secretaria de saúde, é
fundamental que seja definida uma coordenação municipal da APS, composta por
profissionais com perfil e formação para desenvolvimento das atribuições previstas.
Idealmente, a coordenação municipal de APS deve ser composta por profissionais
com graduação ou pós-graduação na área da saúde e experiência prévia no âmbito
dos serviços de APS. O quantitativo de profissionais deve variar em função do porte
populacional do município e do número de equipes atuantes em UBS.
A coordenação municipal deve buscar atuar de forma colegiada com espaços
de reunião periódicos para planejamento e definição de suas ações envolvendo todos
seus membros. É importante também a realização de momentos ampliados de
discussão sobre a gestão da APS no município com a participação de representantes
dos trabalhadores que atuam nas UBS. Sem dúvida esta estratégia tem o potencial de
diminuir a lacuna existente entre os serviços e a gestão municipal. Para municípios de
médio e maior porte, em especial, pode contribuir para valorização dos trabalhadores
e democratização das decisões, substituindo muitas vezes fluxos burocratizados de
comunicação.
Apoio institucional das equipes
As gestões municipais precisam estar presentes no cotidiano das equipes.
Devem fazer visitas periódicas às UBS, levantar junto aos profissionais dificuldades e
problemas, buscar soluções, apoiar movimentos de reflexão e mudança nos processos
de trabalho e melhor organização dos fluxos dentro das UBS.
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
62
Para tanto, sugere-se a adoção da lógica do apoio institucional na organização
das coordenações municipais de APS. Aqui, cabe um paralelo com alguns atributos
da própria APS e com diretrizes da Saúde da Família. Da mesma forma que uma
equipe em relação aos usuários, o apoio institucional também precisa criar vínculos
com as equipes, ser corresponsável por algumas UBS, ter acompanhamento
longitudinal, ser resolutivo e atuar como ponto coordenador das ações de suporte
para a equipe (HEINZELMANN et al., 2012)
Os apoiadores devem, preferencialmente, ser profissionais que já tiveram
experiência prévia no âmbito do cuidado na APS. Devem ser em quantitativo que
permita visitas semanais a cada UBS, ao mesmo tempo em que possibilite em sua
agenda a participação em reuniões de articulação e alinhamento com diversas áreas
da secretaria de saúde, outros setores governamentais e com entidades/instituições
com interface com a saúde. A finalidade disso é ter tempo para dar seguimento e
resolução às demandas que aparecem a partir das visitas nas UBS. Também deve ser
previsto tempo na agenda do apoiador para educação permanente, análise dos
dados das equipes e da situação de saúde dos territórios de atuação das UBS
apoiadas.
Para atuação intersetorial, a coordenação municipal de APS e os apoiadores
devem buscar construir agendas conjuntas com as instituições e entidades diversas
visando atender as demandas da APS que extrapolam o âmbito da assistência em
saúde, a exemplo dos conselhos tutelares, delegacias especializadas de proteção da
mulher e ao idoso, escolas, entidades culturais, centros de referência em assistência
social, entre outros. O apoio institucional deve atuar priorizando o suporte para
mudança do processo de trabalho das equipes e a melhor organização da UBS,
visando a adoção de tecnologias de cuidado e ferramentas de gestão da clínica.
Gestão do trabalho
O provimento e fixação de profissionais para atuar na APS em áreas rurais ou
municípios de menor porte é um problema que atinge a quase todos os países, sendo
seu impacto sentido principalmente nas comunidades mais pobres de regiões menos
desenvolvidas (ROURKE, 2010).
A Organização Mundial de Saúde publicou, em 2010, um relatório com
recomendações para atenuar este problema que passa por ações multifatoriais, a
exemplo da oferta de incentivos financeiros e educacionais, regulação do mercado
de trabalho, desenvolvimento de carreiras que estimulem o trabalho em áreas rurais.
Envolve também suporte educacional e pedagógico, regulação da localização da
oferta de escolas médicas e de vagas de residência em áreas rurais, bolsas de estudo
condicionadas ao trabalho em áreas rurais, mudança nos currículos das graduações
e pós-graduações na área da saúde, melhoria das condições de trabalho, entre outros
(WHO, 2010).
63
No Brasil, alguns estudos já apontam resultados alcançados pelo Programa Mais
Médicos no país, considerando a redução de iniquidades, o provimento emergencial
de mais de 18 mil médicos na APS e o aumento substancial de vagas de graduação
em medicina fora das capitais (SANTOS; COSTA; GIRARDI, 2015; BRASIL, 2015). No
entanto, ainda persiste o grande desafio em relação à fixação, especialmente de
médicos, em municípios de menor porte, considerando serem ainda incipientes
políticas consistentes voltadas para implantação de carreiras regionais, estaduais ou
nacional no âmbito da APS no país.
Conforme previsto na PNAB, os municípios têm a responsabilidade direta de
execução dos serviços de APS e um dos aspectos mais críticos para tanto é justamente
a gestão do trabalho. Deve-se ter nas prefeituras estruturas ágeis de organização de
processos seletivos, contratação e remuneração com avaliação de desempenho.
Mesmo considerando as diversas limitações da estratégia nos municípios de menor
porte, as gestões municipais devem ofertar carreiras que permitam progressão ao
trabalhador da APS por desempenho, por tempo de serviço e por qualificação
profissional.
A carreira acaba sendo mais relevante como importante fator de provimento e
fixação de profissionais de saúde nos municípios de maior porte. Reconhecer o
esforço do profissional é fundamental para melhorar práticas de cuidado e trabalho
em equipe. A valorização por incentivos financeiros diferenciados para profissionais
com formação na área da APS é uma estratégia importante, além do reconhecimento
daqueles que se dedicam ao trabalho em áreas de maior vulnerabilidade ou com
algumas especificidades, a exemplo de áreas rurais.
O próprio processo de seleção de profissionais deve ser revisto em muitos
municípios. Muitas vezes, ocorrem seleções ou concursos com a única etapa de
aplicação de prova, não sendo consideradas as formações e as experiências
profissionais prévias dos candidatos. São vários os exemplos de municípios que com
isso acabam alocando nos serviços profissionais sem qualificação e perfil para função
que seria desempenhada. Para o trabalho na APS devem ser buscados profissionais
com formação na área, a exemplo das formações em medicina de família e
comunidade e em saúde da família. Os profissionais com residência na área devem
ser reconhecidos e ter pontuações diferenciais nos processos seletivos.
No que se refere ao uso da avaliação de desempenho e remuneração variável,
ainda há poucos relatos no país. Desde 2012, o Programa de Melhoria do Acesso e
da Qualidade (PMAQ) é um estimulo ao pontuar positivamente na avaliação externa
as gestões que adotam estas práticas. A utilização da remuneração variável com
avaliação de desempenho a partir de indicadores pactuados na APS, precisa ser
melhor estudada, mas as experiências nacionais e internacionais em curso tendem a
apontar avanços no que se refere à qualidade do cuidado prestado (GIRARDI, 2007;
NEY; PIERANTONI; LAPAO, 2015; NETO, 2016).
Por sua vez, Pisco e Soranz, destacam (2012, p. 335):
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
64
Indicadores de desempenho e incentivos relacionados não são os
únicos instrumentos de melhoria da qualidade disponíveis no
sistema de saúde. Na verdade, são uma ferramenta que só funciona
adequadamente como parte de um conjunto de estratégias
organizacionais.
A valorização dos profissionais e aumento do seu grau de satisfação no trabalho,
conforme os autores, depende “crucialmente da qualidade do ambiente
organizacional de trabalho e do envolvimento dos trabalhadores nas decisões, boas
condições de trabalho”. Além disto, é necessário investimento em educação
permanente, qualidade dos sistemas e registros de informação, articulação e
integração dos pontos da rede de atenção à saúde, entre outros, para além dos
salários (PISCO; SORANZ, 2012, p. 335).
Financiamento da APS
Acompanhar o financiamento federal e estadual da APS não é tarefa simples.
São muitas as legislações vigentes e, constantemente, há mudanças de parâmetros e
de regras de financiamento. Por isso, os gestores dos municípios devem fazer um
esforço para se manter atualizados sobre as normativas do SUS referentes à APS,
acompanhando periodicamente as páginas virtuais governamentais do Ministério da
Saúdes, das Secretarias Estaduais de Saúde e de entidades como, por exemplo, o
Conselho Nacional de Secretarias Estaduais de Saúde (CONASS), o Conselho Nacional
de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS), a Associação Brasileira de Pós-
graduação em Saúde Coletiva (ABRASCO) e a Sociedade Brasileira de Medicina de
Família e Comunidade (SBMFC).
Outro aspecto fundamental para gestão municipal é acompanhar o site do
Fundo Nacional de Saúde1 e verificar os repasses financeiros. Muitas vezes o Ministério
da Saúde suspende recursos financeiros da APS e o gestor não é notificado. Neste
sentido o gestor do município precisa fazer a análise de sua série histórica de
financiamento e o cálculo de estimativa de repasses a receber. Assim, poderá
identificar suspensão de financiamento e buscar a correção ou entrar com recurso
junto ao ministério solicitando pagamentos retroativos.
Também deve-se atentar para as possibilidades de recursos diferenciados a
depender da modalidade da equipe de Saúde da Família e Saúde Bucal. A realização
de simulações e análises de possíveis melhorias no âmbito do cuidado a partir do
incremento de um profissional na equipe é uma das ações que deve compor o
trabalho da gestão municipal. Um exemplo disso é a análise sobre a incorporação de
um técnico de saúde bucal na equipe. O município precisa verificar o custo que isso
1 Disponível em: <http://portalfns.saude.gov.br/>.
65
representa, os possíveis acréscimos de valores repassados por parte do Ministério da
Saúde e do Governo de Estado e a real viabilidade de contratar este profissional.
Outro aspecto importante é acompanhar o financiamento com recursos
próprios municipais. A quase totalidade dos municípios que possuem hospitais vive
uma constante quebra de braço entre financiamento do hospital versus financiamento
da APS. A lógica predominante é do “enxugar gelo”, onde recursos que deveriam ser
priorizados para APS vão para custeio de hospitais com pouquíssima resolutividade.
Com isso, o sistema deixa de ser eficiente, pois a APS não fortalecida também não
consegue dar conta dos cuidados necessários para as condições crônicas e agudas.
A coordenação municipal da APS, nestes casos, deve buscar sempre articular a
garantia do financiamento para manutenção e qualificação dos serviços, agindo junto
aos principais tomadores de decisão na gestão municipal no sentido do “lobby” e
defesa da APS.
Planejamento, monitoramento e avaliação
A gestão municipal deve fazer o planejamento das suas atividades em relação
à APS, de forma amplamente discutida com os profissionais das UBS. Para tanto é
necessária a análise da situação de saúde do município, identificando diferenças entre
as diversas áreas cobertas pelas UBS. No planejamento, deve constar a análise de
indicadores estratégicos que reflitam a produção e impacto do trabalho das equipes
junto à saúde da população, definindo-se metas e ações necessárias para alcance
destas.
O planejamento não pode ser visto como um momento pontual, mas sim como
processo dinâmico e flexível que se soma aos processos de monitoramento e
avaliação da APS. Neste sentido o uso de instrumentos de avaliação é importante, a
exemplo do Primary Care Assesment Tools (PCATool), da Autoavaliação para Melhoria
do Acesso e da Qualidade da Atenção e do instrumento de avaliação externa do
PMAQ. A gestão municipal pode organizar momentos específicos do ano para
aplicação destes instrumentos que servem para apontar aspectos que precisam ser
aprimorados no processo de trabalho, funcionamento e estrutura das UBS.
As gestões municipais precisam se fazer presentes no cotidiano das equipes,
fazendo visitas periódicas às UBS, levantando junto às profissionais dificuldades,
problemas, apoiando movimentos de reflexão e mudança nos processos de trabalho
e melhor organização dos fluxos dentro das Unidades.
Outra atribuição essencial da gestão municipal é garantir a atualização correta
dos sistemas de informação relacionados à APS. Da mesma forma, a atualização
constante e correta do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES) exige
uma atenção especial. Muitas vezes ocorre suspensão ou perda de recursos
financeiros em função da não atualização do CNES ou então do preenchimento de
forma incorreta. Para evitar problemas como estes, a gestão deve fazer uma análise
aprofundada dos fluxos internos de alimentação dos sistemas de informação.
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
66
Infelizmente, não é rara a situação de municípios em que um profissional digitador,
sem formação na área da saúde, é o único que domina a utilização dos diversos
sistemas de informação. Muitas vezes, por não haver implicação no trabalho,
cometem-se erros no preenchimento ou na digitação por falta de entendimento da
APS ou mesmo por se busca simplificar e agilizar o trabalho.
Além de zelar para que sejam enviados dados corretamente, é importante que
se trabalhe com relatórios mensais extraídos dos sistemas de informação, mesmo
considerando as suas limitações e dificuldades operacionais, a exemplo do SISAB, do
e-SUS Atenção Básica, que visa reestruturar e integrar as informações da Atenção
Básica em nível nacional, e do SisPreNatal, software desenvolvido pelo Datasus, com
a finalidade de permitir o acompanhamento adequado das gestantes inseridas no
Programa de Humanização no Pré-Natal e Nascimento, do Sistema Único de Saúde.
As equipes se ressentem de que não há retorno para elas com análise crítica daquilo
que é preenchido em diversas fichas, planilhas e sistemas.
A utilização do “Placar de cada UBS” ajuda bastante neste sentido. É possível de
forma simples montar no mural das UBS, um quadro com alguns indicadores de
produção da equipe e do perfil epidemiológico e demográfico da comunidade
atendida. Este é um mecanismo que permite de forma ágil e fácil a análise dos
indicadores da equipe, dando devolutivas aos profissionais. Este Placar deve ser
atualizado mensalmente, o que pode servir como base do processo de
monitoramento realizado pela gestão municipal, ao se fazer agregações dos
indicadores no âmbito municipal.
A construção do Plano Municipal de Saúde merece um importante destaque,
considerando que ele é o documento oficial norteador das ações da secretaria por
quatro anos. O Plano e os Relatórios Anuais de Gestão são instrumentos da gestão
do SUS que não podem ser vistos como obrigação “cartorial”. São ferramentas que
sendo utilizadas no cotidiano da gestão permitem o planejamento das ações e
correção de percursos conforme mudança de contexto ou releituras de cenários. A
APS sempre se coloca como um dos principais eixos destes instrumentos, sendo que
sua a construção deve se dar de forma participativa, com envolvimento dos
profissionais das equipes e do controle social. Apenas desta forma, se dá efetivamente
o seu valor de uso, promovendo intervenções no funcionamento dos serviços,
buscando a sua qualificação a partir na análise do planejamento municipal.
O estabelecimento da Carteira de Serviços da APS se coloca como algo
estratégico para definição clara do elenco de ações e serviços prestados pelas
Unidades Básicas de Saúde de cada município. Mesmo considerando as
especificidades de cada equipe e território, existem ações e atividades mínimas que
todas as UBS devem ofertar. A definição da Carteira de Serviços da APS não é um
processo simples e exige o alinhamento interno na gestão e um movimento crescente
de pactuação com o conjunto de profissionais e equipes. Para tanto é necessário que
a sua construção seja parte do planejamento da coordenação de APS.
67
Educação permanente
A atualização técnico-científica é um dos aspectos da qualificação das práticas
na APS, sendo que estes devem também englobar aspectos de produção de
subjetividade, produção de habilidades técnicas, atitudes e o adequado
conhecimento do SUS. Os processos formativos na área da saúde devem ter como
objetivos a transformação das práticas profissionais e da própria organização do
trabalho, e estruturar-se a partir da problematização do processo de trabalho e sua
capacidade de dar acolhimento e cuidado às várias dimensões e necessidades de
saúde das pessoas, dos coletivos e das populações
O acompanhamento contínuo das demandas de educação permanente dos
profissionais da APS deve ser motivo de dedicação de uma parte considerável do
trabalho das gestões municipais.
As demandas para educação em serviço não se definem somente a partir de
uma lista de necessidades individuais de atualização, nem das orientações dos níveis
centrais, mas prioritariamente a partir dos problemas da organização do trabalho,
considerando a necessidade de prestar atenção relevante e de qualidade, com
integralidade e humanização, e considerando ainda a necessidade de conduzir ações,
serviços e sistemas com produção em rede e solidariedade intersetorial.
Muito além da oferta de cursos de atualização clínica em temas previamente
definidos, o processo de qualificação da APS demanda a identificação das fragilidades
de atuação ou desafios que persistem no cotidiano das práticas dos profissionais e
das equipes. Para tanto o trabalho com monitoramento e avaliação de indicadores e
a ação do apoio institucional podem identificar temáticas do cotidiano buscando uma
abordagem pedagógica.
A Educação Permanente estrutura-se com base nas propostas de pedagogias
ativas, onde o trabalhador é sujeito do seu próprio aprendizado. É uma educação no
e para o trabalho, pois se entende que as vivências do cotidiano nos cenários de
trabalho de cada um representam uma grande possibilidade de aprendizagem, na
qual o trabalhador-educando retorna modificando seu próprio trabalho e a realidade
em que está inserido (FRANCO; CHAGAS; FRANCO, 2012, p. 03)
As gestões municipais devem buscar a construção de uma grande diversidade
de ofertas pedagógicas de acordo com as demandas do cotidiano. Estas ações variam
desde cursos de curta duração, oficina, seminários, cursos técnicos ou de pós-
graduação até a troca de experiências entre serviços. Boa parte dos municípios
demandam parcerias com universidades e centros formadores para garantir muitas
destas ofertas. Neste sentido, o dialogo em instâncias de pactuação regional do SUS
pode ajudar na construção de projetos de parcerias institucionais mais duradouras, a
exemplo da Comissão de Integração Ensino-Serviço (CIES).
Também deve ser considerada com importante estratégia pedagógica a ação
de matriciamento de serviços de atenção especializada em relação à APS, a exemplo
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
68
dos Centros de Atenção Psico-Social (CAPS), Maternidades, Serviços de Atenção
Especializada em HIV/AIDS e Hepatites.
Importante destacar que a adoção de protocolos clínicos e de encaminhamento
demandam processos pedagógicos com o devido acompanhamento e reflexão sobre
as suas possíveis dificuldades de utilização nos serviços. Não se pode entender a
implantação do protocolo como algo burocrático e definido por simples ato
normativo da gestão, mas sim como parte do processo de revisão de práticas clínicas
que demanda a reflexão sobre a atuação profissional, o processo de trabalho das
equipes, a organização dos serviços e os fluxos assistenciais no âmbito da Rede de
Saúde.
A garantia de Unidades de Saúde com infraestrutura adequada é parte
importante do trabalho das coordenações municipais de APS. Para tanto é necessário
a presença periódica de representantes da gestão/apoiadores institucionais nas
Unidades com o levantamento estruturado de possíveis deficiências estruturais,
necessidades de reformas/manutenções e a identificação da necessidade de
suprimento e reposição de insumos, equipamentos e consertos/trocas de mobiliário.
Muitos municípios têm investido em sistemas informatizados de planejamento
e acompanhamento de estoques de insumos, medicamentos e equipamentos. A
coordenação municipal da APS precisa ter clareza dos fluxos na secretaria/prefeitura,
com planejamento e previsão de utilização de materiais e insumos. Desta forma, se
antecipa a falta e se mantêm as UBS em funcionamento pleno. Da mesma forma, é
fundamental a existência de contratos ativos de manutenção preventiva e corretiva
dos equipamentos e estrutura física das Unidades.
A gestão municipal deve considerar a necessidade de veículo de suporte para
UBS, no caso de unidades responsáveis por usuários em uma grande extensão
territorial, UBS em área rural, por exemplo, para a realização das atividades externas
da equipe, a exemplo de atendimentos domiciliares e realização de atividades
coletivas ou grupos em equipamentos comunitários.
As UBS devem estar de acordo com as Normas Sanitárias (Lei Complementar
239/2006 – Código de Vigilância em Saúde) e adotar como referência o Manual de
Infraestrutura do Departamento de Atenção Básica do Ministério da Saúde (BRASIL,
2008), tendo o número de ambientes em função do número de equipes que atendem
na UBS.
A gestão municipal precisa observar que a unidade básica de saúde deve
considerar em sua estrutura e ambiência a acessibilidade aos usuários com deficiência
e limitações funcionais (visual, auditiva, de locomoção, entre outros), prevendo assim
todas as entradas externas e portas internas adaptadas para cadeira de rodas, bem
como corredores adaptados para a passagem e acesso de cadeira de rodas.
Todos os ambientes devem possuir sinalização com placas identificando cada
ambiente facilitando o acesso e visualização dos usuários (por exemplo: recepção,
consultório médico, sala de vacina). As UBS também devem disponibilizar em mural
69
fixado na sala de espera/recepção os seguintes itens: horário de atendimento da UBS;
mapa da área de abrangência com lista de ruas; população geral por equipe ou área;
identificação dos componentes das equipes de cada área, carga horária semanal e
respectivas escalas; nome, atividade profissional, carga horária mensal da equipe de
apoio (NASF) na UBS; formas de agendamento/acesso do cidadão/usuário à
UBS/Equipe; indicadores acompanhados (placar da saúde); contato da ouvidoria
(municipal, estadual ou federal); lista de ações/serviços disponíveis e formas de acesso;
a informação de que participa do Programa “Saúde Mais Perto de Você – Acesso e
Qualidade (PMAQ)” do Ministério da Saúde, quando for o caso. Todos os profissionais
devem usar crachás ou jalecos com identificação.
A gestão municipal também deve buscar a adequada ambiência das UBS,
considerando: luminosidade; ventilação; acústica; conservação dos pisos e paredes;
conservação dos móveis; sonoridade (som ambiente, som equipamentos, volume TV,
entre outros); poluição visual (excesso de murais, cartazes, avisos, entre outros);
organização e limpeza interna; sinalização interna; cuidado com área externa.
Visando um melhor padrão de ambiência, sugere-se que as UBS também
possuam: sala de seguimento farmacoterapêutico (quando houver dispensação de
medicamentos na UBS); espaço Infantil com brinquedoteca; vestiário para
funcionários; sala de apoio à amamentação; sala de conforto para o trabalhador
(poderá conter: sofá, televisor, mesa com cadeiras, ar condicionado, computador com
acesso à internet e uma copa que auxiliará o profissional em seu momento de
descanso); ar condicionado (quente/frio) em todos os consultórios e recepção;
entrada externa adaptada para cadeira de rodas; corrimão na entrada externa da
unidade; todas as portas internas adaptadas para cadeira de rodas; piso tátil para
acesso as dependências da unidade; todos os corredores adaptados para cadeira de
rodas; cadeira de rodas disponível e em condição de uso para deslocamento do
usuário; sala de tutoria/preceptoria para discussão de casos e reflexão prático-teórica,
quando a UBS for campo de estágio de graduação e/ou residência na área da saúde.
Assistência farmacêutica
Embora tenha ocorrido nos últimos anos uma forte descentralização da
assistência farmacêutica na APS, com mais de 75% das UBS dispensando fármacos,
apenas metade da lista de medicações está disponível das UBS, conforme estudos
realizados tendo por base o PMAQ (MENDES, 2014).
A partir da descentralização da assistência farmacêutica na Atenção Básica, os
municípios passaram a arcar, em sua grande maioria, com as etapas de seleção,
programação, aquisição, distribuição e dispensação de medicamentos para esse nível
de atenção à saúde. Essas são atividades para as quais se faz fundamental o apoio
técnico e financeiro das Secretarias de Estado da Saúde e do Ministério da Saúde, em
especial a regularidade dos repasses financeiros. Os municípios enfrentam distintos
problemas, vários deles vinculados ao porte populacional, a despeito do crescente
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
70
aumento do financiamento público para os medicamentos. Os menores têm pequena
escala de compra, dificultando a negociação dos melhores preços, baixa
disponibilidade de recursos humanos capacitados e maiores dificuldades de
infraestrutura. Os maiores lidam com maior pressão da demanda e maior
complexidade da rede de saúde (MENDES, 2014, p. 19)
Para organizar a assistência farmacêutica as gestões municipais devem realizar
o seu correto planejamento, trabalhando na organização dos fluxos e etapas do Ciclo
da Assistência Farmacêutica (seleção, programação, aquisição, armazenamento,
distribuição, prescrição e dispensação) para melhorar o atendimento aos usuários do
SUS e ampliar a resolutividade das ações, tratando o medicamento e os serviços
farmacêuticos como ferramentas do cuidado (BRASIL, 2007).
A construção da Relação Municipal de Medicamentos Essenciais deve ser feita
a partir de critérios técnicos, estudos de avaliação de incorporação de tecnologia e
discussão com os profissionais que fazem parte das equipes de APS. Deve-se estar
atento aos protocolos clínicos utilizados no município evitando possíveis incoerências
entre o previsto para prescrição com base em protocolo e o que é ofertado de
medicações pelo município em sua rede de APS.
Todas as UBS devem apresentar um plano de uso racional de medicamentos e
deve estar em conformidade com as diretrizes municipal e nacional de uso racional e
previsão de consumo. Todas as unidades de saúde devem dispensar os
medicamentos em local próprio que possibilite a dispensação e o depósito exclusivo
da farmácia.
A dispensação de medicamentos deve ser realizada mediante apresentação de
receita, sendo realizada preferencialmente por profissional com treinamento para tal,
a exemplo do técnico de farmácia ou farmacêutico. Na sua ausência, deve-se realizar
a entrega de medicamentos pelos demais profissionais da APS a partir de treinamento
especifico, sendo que a dispensação/entrega de medicamentos deve ser mantida
durante todo o horário de funcionamento da unidade, facilitando o acesso do usuário.
Informatização das redes de APS
A informatização das UBS deve ser viabilizada através da estruturação e
adequação de rede lógica e elétrica, equipamentos e conectividade, com o objetivo
de possibilitar o uso de prontuários eletrônicos, a exemplo do e-SUS-AB/PEC, a
alimentação dos sistemas de informação, confecção e atualização de mapas dos
territórios de atuação das UBS, utilizando recursos de georreferenciamento online, a
exemplo do GoogleMaps® e o uso das tecnologias de informação em Saúde para a
qualificação da APS, como o TelessaúdeRS-UFRGS.
No entanto, as últimas pesquisas sobre estrutura das UBS apontam que uma
minoria das UBS possuem computadores conectados à internet nos consultórios. Para
71
reverter isso, os municípios precisam investir na informatização da rede de APS. Para
além dos equipamentos de informática, contrato de manutenção e garantia de
conexão com a internet, a gestão municipal deve buscar a aquisição de Prontuários
Eletrônicos.
Inúmeras experiências nacionais e internacionais têm demonstrado resultados
importantes quanto ao uso de ferramentas de Tecnologia de Informação e
Comunicação na assistência clínica da APS. O uso de bons prontuários eletrônicos
orientados para APS tendem a apresentar melhores resultados da prática clínica,
quando associados a ferramentas de alertas de diretrizes clínicas (FONTANIVE;
SCHMITZ; HARZHEIM, 2014).
Neste sentido, é fundamental a escolha correta do Prontuário. Existem diversas
opções no setor privado, para além do Prontuário Eletrônico do Cidadão (PEC) do
eSUS-AB. No entanto, muitas destas opções não são voltadas para o cuidado na APS.
Caso a opção não seja utilizar o PEC eSUS-AB, é necessário ter cuidado na aquisição
de prontuários privados, pois caso, por exemplo, tenham apenas orientação hospitalar
eles podem dificultar o processo de trabalho das equipes e a atuação clínica dos
profissionais, sendo inadequado para APS (GUSSO; LANDSBERG; PINTO, 2012).
O Prontuário Eletrônico deve ser orientado por problemas e não por programas,
sendo que o registro clínico deve seguir a sistematização SOAP (Subjetivo, Objetivo,
Avaliação e Plano). Da mesma forma, bons prontuários eletrônicos, mesmo com o
importante uso de indicadores de desempenho, relatórios e alertas baseados em
diretrizes de diagnóstico e tratamento, não devem engessar a ação dos profissionais
da APS (GUSSO; LANDSBERG; PINTO, 2012).
O estímulo e acompanhamento do uso dos serviços de telessaúde pelas equipes
deve ser parte da rotina da coordenação municipal. No município, é preciso o
envolvimento do gestor para planejar e reestruturar o atendimento clínico para que
a telessaúde seja incorporada na prática diária (ALKIMIM, 2010). É importante aqui
frisar que a observação aponta que os profissionais que tendem a ter um melhor
desempenho clínico são os que mais utilizam o serviço de Teleconsultoria. Os
profissionais que percebem a utilidade do serviço, obtendo respostas que de fato
auxiliem na resolução de casos clínicos, conforme suas expectativas, tendem a utilizar
cada vem mais a telessaúde.
Alguns estudos indicam que os profissionais que mais utilizam os serviços de
teleconsultoria são justamente aqueles que não têm a oferta de outro espaço para
discutir casos clínicos, para além da telessaúde (ALKIMIM, 2010). Desta forma, temos
a situação de criação do hábito na utilização dos serviços, principalmente nos
municípios de menor porte populacional. Os Núcleos de Telessaúde também ofertam
ações de Teleducação, com cursos de educação a distância, webpalestras e
webconferências. Para qualificar os serviços de APS, é importante o estímulo para
participação dos profissionais por parte das gestões municipais.
DESAFIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
72
Controle social e participação popular
O incentivo constante à participação popular e a busca pela ampliação dos
canais de controle social também devem fazer parte da agenda das coordenações
municipais de atenção básica. Justamente por atuar no território, trabalhando em
contato direto com lideranças comunitárias, religiosas, culturais, as equipes de APS
tem um papel central no processo de mobilização da população. As gestões
municipais da saúde precisam se atentar para a importância de ter a comunidade
empoderada, com pleno conhecimento dos seus direitos, no sentido de fortalecer os
serviços de APS.
A constituição dos Conselhos Locais de Saúde auxilia em muito as pactuações
com as comunidades no sentido da mudança do processo de trabalho das equipes e
da melhor organização do funcionamento das UBS. As experiências mostram como
se torna muito menos difícil a implantação do acolhimento com classificação de risco
quando se tem espaços legítimos e formais de pactuação com a comunidade
(FRANCO et al., 2004). A coordenação municipal deve buscar fomentar o debate
sobre APS no Conselho Municipal e outras instâncias de participação popular e
controle social.
Deve-se investir também em diversos outros mecanismos de participação e
interação com a população, a exemplo da ouvidoria, da pesquisa de satisfação do
usuário, da “caixinha de sugestões” entre outros.
Em diversas cidades do país, com apoio das gestões municipais, as equipes de
APS estão construindo blogs da UBS na internet e canais de vídeos no Youtube, com
apoio das gestões municipais. O município do Rio de Janeiro, por exemplo, vem nos
últimos anos investindo bastante na utilização pelas equipes de tecnologias de
informação e comunicação em saúde junto à população (RIO DE JANEIRO, 2012).
O uso de Tecnologias da Informação e Comunicação em saúde é um importante
recurso a ser desenvolvido pela gestão municipal para incentivar as ações de
Educação Popular na APS, fortalecendo a gestão compartilhada entre trabalhadores
e comunidades, tendo os territórios de saúde como espaços de formulação de
políticas públicas, promoção ao diálogo e a troca entre práticas e saberes populares
e técnico-científicos, de modo a fortalecer a dimensão dialógica como estratégia
fundamental de gestão coletiva dos processos de trabalho e organização de serviços
de saúde (RIO GRANDE DO SUL, 2014; PINTO, ROCHA, 2016).
Cabe salientar que existe uma ampla variedade de tipos, formas e métodos de
divulgação de informações em saúde que facilitam o contato com a população. As
mídias sociais e audiovisuais mais utilizadas (blogs, Twitter, Facebook, fotos e vídeos)
aproximam os usuários do SUS das equipes de Atenção Primária à Saúde e passam a
conhecer a sua unidade de referência além de contribuir para a comunicação em
saúde.
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