CAO Crim - mpsp.mp.br · Boletim Criminal Comentado - 04/2020 (semana nº 01) ... constante do...

16
CAO – Crim Boletim Criminal Comentado - 04/2020 (semana nº 01) Subprocuradoria-Geral de Justiça de Políticas Criminais e Institucionais Mário Tebet Coordenador do CAO Criminal Arthur Pinto Lemos Junior Assessores Fernanda Narezi Pimentel Rosa Marcelo Sorrentino Neira Paulo José de Palma Ricardo José Gasques de Almeida Silvares Rogério Sanches Cunha Analista Jurídica Ana Karenina Saura Rodrigues

Transcript of CAO Crim - mpsp.mp.br · Boletim Criminal Comentado - 04/2020 (semana nº 01) ... constante do...

Page 1: CAO Crim - mpsp.mp.br · Boletim Criminal Comentado - 04/2020 (semana nº 01) ... constante do Parecer 451/2017-J e revogou os Comunicados CG 573/2016 e 2077/2017, reconhecendo a

CAO – Crim

Boletim Criminal Comentado - 04/2020

(semana nº 01)

Subprocuradoria-Geral de Justiça de Políticas Criminais e Institucionais

Mário Tebet

Coordenador do CAO Criminal

Arthur Pinto Lemos Junior

Assessores

Fernanda Narezi Pimentel Rosa

Marcelo Sorrentino Neira

Paulo José de Palma

Ricardo José Gasques de Almeida Silvares

Rogério Sanches Cunha

Analista Jurídica

Ana Karenina Saura Rodrigues

Page 2: CAO Crim - mpsp.mp.br · Boletim Criminal Comentado - 04/2020 (semana nº 01) ... constante do Parecer 451/2017-J e revogou os Comunicados CG 573/2016 e 2077/2017, reconhecendo a

Boletim Criminal Comentado Abril-2020-

(semana nº 01)

2

SUMÁRIO

SUMÁRIO......................................................................................................................................2

MENSAGEM DA EQUIPE DO CAO-CRIM................................................................................................3

ESTUDOS DO CAOCRIM.................................................................................................................7

1-Modelo de inicial da pena de multa..................................................................................................7

2- Passo a passo – Peticionamento eletrônico da Execução da multa e do ANPP................................7

3- Modelo de manifestação sobre o pedido de revogação da prisão preventiva em razão da

pandemia..............................................................................................................................................7

4- Modelo de Portaria - PAA Coronavirus - unidades prisionais...........................................................7

5- Recomendação ao Governo do Estado de São Paulo elaborada pela Promotoria de Justiça de

Direitos Humanos – Saúde Pública.......................................................................................................7

STF/STJ: decisões de interesse institucional COMENTADAS PELO CAOCRIM................................. 8

DIREITO PROCESSUAL PENAL:...................................................................................................... 8

1-Tema: Tráfico de drogas. Flagrante. Violação de domicílio. Tema 280/STF. Denúncia anônima.

Fuga isolada do suspeito. Ausência de justa causa. Nulidade de

provas...................................................................................................................................................8

2- Tema: Atraso na instrução em razão de férias da testemunha pode caracterizar excesso de prazo

na prisão preventiva...........................................................................................................................11

3- Tema: Possibilidade de o juízo da execução proclamar a reincidência..........................................13

DIREITO PENAL:...........................................................................................................................14

1-Tema: Art. 241-A da Lei n. 8.069/1990. Grande interesse por material pornográfico. Exasperação

da pena-base. Conduta social ou personalidade. Inviabilidade..........................................................14

Page 3: CAO Crim - mpsp.mp.br · Boletim Criminal Comentado - 04/2020 (semana nº 01) ... constante do Parecer 451/2017-J e revogou os Comunicados CG 573/2016 e 2077/2017, reconhecendo a

Boletim Criminal Comentado Abril-2020-

(semana nº 01)

3

MENSAGEM DA EQUIPE DO CAO-CRIM

Caros colegas, promotores e procuradores de Justiça.

Inauguramos o BOLETIM SEMANAL para divulgar o relatório da nossa gestão no Centro de

Apoio Operacional Criminal – CAOCRIM e destacar as nossas principais atividades:

a) Publicamos 85 Boletins Informativos Comentados, elaborados sempre com o seguinte critério: i) julgados relevantes e mais recentes; ii) leis penais e processuais penais novas; iii) consultas feitas por colegas ao CAOCrim;

b) Os boletins totalizaram 1.397 páginas, com 168 estudos de casos diferentes e mais de 300 jurisprudências do STF e STJ comentadas;

c) Elaboramos 73 Enunciados, disponibilizados na página eletrônica do CAOCRIM;

d) Emitimos 8 notas técnicas sobre Projetos de Leis em trâmite no Congresso Nacional; inclusive sobre a Lei de Abuso de Autoridade;

e) A equipe do CAOCRIM atendeu vários membros do MPSP:

em 2018, 4 mil atendimentos;

em 2019, foi implementado, de forma pioneira, o atendimento por whatsapp. Ao lado de centenas de consultas por este novo meio, atendemos, ainda, 2.296 colegas pelo telefone fixo;

e em 2020, até dia 13 de Março, 560 membros;

f) Representamos os colegas da Barra Funda, peticionando à Diretoria do DIPO para que juntasse as mídias gravadas nas audiências de custódia, providência até então negada pela Magistrada responsável, mas revertida com a ação do CAOCrim; o objetivo foi viabilizar o reconhecimento fotográfico com a imagem preservada e correspondente com o momento da prisão em flagrante;

g) Depois de realizadas diversas Reuniões de Trabalho com as Promotorias de Justiça Criminais da Capital - Barra Funda; bem como Reuniões de Trabalho no interior: Araçatuba, Araraquara, Bauru, Campinas, Marília, Mococa, Mogi das Cruzes, Mogi Mirim, Jundiai, Piracicaba, Presidente Prudente, Ribeirão Preto, São José dos Campos, São Bernardo do Campo, Ourinhos e Taubaté, fizemos a difusão sobre a Política Criminal idealizada pelo CAOCrim, notadamente no que se refere ao “Acordo de Não

Page 4: CAO Crim - mpsp.mp.br · Boletim Criminal Comentado - 04/2020 (semana nº 01) ... constante do Parecer 451/2017-J e revogou os Comunicados CG 573/2016 e 2077/2017, reconhecendo a

Boletim Criminal Comentado Abril-2020-

(semana nº 01)

4

Persecução Penal”. Foram realizados até o final de Março de 2020 cerca de 1.325 Termos de Acordo de Não Persecução Penal;

h) Foram monitorados, até o presente momento, 233 Recursos em Segunda Instância, a pedido dos Promotores de Justiça, o que antes não ocorria, pois não havia intermediação entre a primeira e segunda instância;

i) Foram monitorados 23 Mandados de Prisões pendentes de cumprimentos, a pedido dos Promotores de Justiça de primeira instância. O objetivo foi dar efetividade ao trabalho das promotorias criminais;

j) Realizamos Workshops, via Skype, sobre os seguintes temas: i) “Acordo de Não Persecução Penal”; ii) “Escuta protegida e depoimento especial” (em parceria com o CAOCÍVEL); iii) “Execução da Pena de Multa”; e iv) “Atualização Legislativa”; v) Investigação Digital; vi) Enunciados sobre Execução Penal; vii) Alterações legislativas do Estatuto de Desarmamento. Atingimos com tais eventos pela internet mais de mil colegas;

k) Promovemos a capacitação de Promotores de Justiça Criminais e seus Oficiais de Promotorias e Analistas Jurídicos sobre “Técnicas Avanças em Investigação de Crimes de Formação de Cartel e Fraude à Licitação Pública”, no dia 27 de setembro de 2019;

l) O conteúdo da capacitação foi disponibilizado como Cartilha na página eletrônica do CAOCRIM;

m) Elaboramos o fluxograma com procedimentos a serem observados na Escuta especial e depoimento protegido; na Execução da Pena de Multa; e na Proteção do Estatuto do Torcedor – ambos disponíveis na página do CAOCRIM;

n) Por meio de Convênio firmado com a Secretaria da Administração Penitenciária (SAP), Secretaria do Estado de Segurança Pública e ENASP, participamos da coleta de mais de 7000 amostras biológicas de DNA de presos condenados por crimes sexuais; sendo que 6000 foram incluídas no banco de DNA do Estado de São Paulo;

o) Após as coletas das amostras de DNA houve confronto com as amostras de vítimas. O resultado foi muito bom: houve 7 coincidências, que possibilitaram o prosseguimento de investigações policiais que estavam sem autoria. O CAOCRIM enviou, no início do mês de setembro/2019, os Relatórios produzidos pelo Núcleo de Biologia e Bioquímica aos sete promotores de justiça responsáveis pelos casos ainda pendentes de conclusão;

Page 5: CAO Crim - mpsp.mp.br · Boletim Criminal Comentado - 04/2020 (semana nº 01) ... constante do Parecer 451/2017-J e revogou os Comunicados CG 573/2016 e 2077/2017, reconhecendo a

Boletim Criminal Comentado Abril-2020-

(semana nº 01)

5

p) Após Reunião conjunta com o Núcleo de Biologia e Bioquímica do Instituto de Criminalística, os Juízes do DIPO e os Promotores de Justiça que atuam nas audiências de custódia da Capital, passamos a realizar a perícia de DNA de presos em flagrante, pela prática de crimes sexuais, nas audiências de custódia. Após gestões deste Centro de Apoio junto a Polícia Científica, o IML da Capital está capacitado para fazer as perícias e as coletas de DNA. Esse Projeto será expandido para outras cidades;

q) Firmamos convênio om a Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) e celebramos de Termo de Cooperação Técnica, com vistas à implementação, acompanhamento e avaliação da política de alternativas Penais no Estado de São Paulo, para cumprimento das condições impostas nos Acordos de Não Persecução Penal, nos termos propostos na Resolução 181/2017 do CNMP, alterada pela Resolução 183/2018 (aguarda-se apenas o agendamento da solenidade para assinatura);

r) Obtivemos êxito em representação formulada à CGJ, que modificou seu entendimento constante do Parecer 451/2017-J e revogou os Comunicados CG 573/2016 e 2077/2017, reconhecendo a essencialidade do boletim informativo e/ou atestado de conduta carcerária para análise de benefícios prisionais;

s) Obtivemos o acesso direto, com 30 senhas aos promotores de justiça dos DECRIMs, ao Sistema de Gestão Penitenciária, para obtenção do atestado de conduta Carcerária e Boletim Informativo;

t) Integramos o PROVITA e participamos de suas reuniões, que possibilitaram a proteção de cerca de 90 pessoas – vítimas, testemunhas e/ou réus colaboradores;

u) Desde 2018 estamos em constante tratativa com a Secretaria de Estado da Justiça e Defesa da Cidadania de São Paulo visando a ampliação para outras regiões do Estado e o fortalecimento do CRAVI – Centro de Referência e Apoio às Vítimas. Houve já implementação em Barueri e Suzano. Em breve, será implantada uma unidade em Pindamonhangaba, com o apoio do GAECO do Vale do Paraíba;

v) Obtivemos com o IMESC a possibilidade de serem realizados Relatórios de Avaliação de Danos Psicológicos em vítimas de crimes de violência doméstica e delitos sexuais;

w) Realizamos, no dia 6 de Dezembro de 2019, no Auditório das Promotorias de Justiça Criminais do Fórum da Barra Funda, Reunião de Trabalho com os Promotores de Justiça dos Tribunais do Júri da Capital e os Delegados de Polícia do DHPP. O resultado do encontro foi a elaboração de uma “Carta de Intenções” a ser cumprida pelas partes envolvidas;

Page 6: CAO Crim - mpsp.mp.br · Boletim Criminal Comentado - 04/2020 (semana nº 01) ... constante do Parecer 451/2017-J e revogou os Comunicados CG 573/2016 e 2077/2017, reconhecendo a

Boletim Criminal Comentado Abril-2020-

(semana nº 01)

6

x) Durante o período de vigência da pandemia e teletrabalho, derivado do estado de calamidade pública provocada pelo novo Coronavírus – COVID 19, o CAOCRIM elaborou:

a. Duas Notas Técnicas sobre o impacto da COVID no Sistema Prisional;

b. Orientação Técnica em Conjunto com o CAO do Consumidor sobre o Aumento Abusivo de Preços;

c. Orientações aos Órgãos de Segurança Pública;

d. Vários modelos de peças jurídicas: i) manifestação contrária ao pedido de revogação preventiva pelo excesso de prazo; ii) manifestação contrário a revogação preventiva por receio de contaminação da COVID 19; iii) Recurso em Sentido; iv) Medida Cautelar Inominada; v) Modelo de manifestação para requerer ao Juiz destinação de Valores ao Fundo Municipal de Saúde; vi) Modelo de Ofício à Prefeitura Municipal para requerer dados e número de conta bancária para envio de recursos obtidos em procedimentos criminais;

e. Apresentamos a Representação da Promotoria de Justiça de Execuções Criminais de Presidente Prudente à Promotoria de Justiça de Direitos Humanos, com a finalidade de ser vedada a transferência de presos, que acolheu integralmente a solicitação e tomou as providências cabíveis junto a SAP – Secretaria da Administração Penitenciária;

f. Elaboramos anteprojeto de lei para alterar o Código Penal e propor nova causa suspensiva da prescrição da pretensão punitiva do Estado

EQUIPE DO CAO-CRIM (gestão 2018-2020).

Page 7: CAO Crim - mpsp.mp.br · Boletim Criminal Comentado - 04/2020 (semana nº 01) ... constante do Parecer 451/2017-J e revogou os Comunicados CG 573/2016 e 2077/2017, reconhecendo a

Boletim Criminal Comentado Abril-2020-

(semana nº 01)

7

ESTUDOS DO CAOCRIM

1-Modelo de Inicial da pena de multa elaborada pelo Dr Felipe Bertolli

Clique aqui

2- Passo a passo – Peticionamento eletrônico da Execução da multa e do ANPP – Elaborado

pelo Promotor de Justiça, Daniel Tadeu dos Santos Mano, 2.º Promotor de Justiça de

Martinópolis, e sua equipe

Clique aqui

3- Modelo de manifestação sobre o pedido de revogação da prisão preventiva em razão da

pandemia

Clique aqui

4- Modelo de Portaria - PAA Coronavirus - unidades prisionais

Clique aqui

5- Recomendação ao Governo do Estado de São Paulo elaborada pela Promotoria de Justiça

de Direitos Humanos – Saúde Pública

Clique aqui

Page 8: CAO Crim - mpsp.mp.br · Boletim Criminal Comentado - 04/2020 (semana nº 01) ... constante do Parecer 451/2017-J e revogou os Comunicados CG 573/2016 e 2077/2017, reconhecendo a

Boletim Criminal Comentado Abril-2020-

(semana nº 01)

8

STF/STJ: decisões de interesse institucional COMENTADAS PELO CAOCRIM

DIREITO PROCESSUAL PENAL:

1-Tema: Tráfico de drogas. Flagrante. Violação de domicílio. Tema 280/STF. Denúncia

anônima. Fuga isolada do suspeito. Ausência de justa causa. Nulidade de provas.

INFORMATIVO 666 STJ- QUINTA TURMA

A existência de denúncia anônima da prática de tráfico de drogas somada à fuga do acusado ao

avistar a polícia, por si sós, não configuram fundadas razões a autorizar o ingresso policial no

domicílio do acusado sem o seu consentimento ou sem determinação judicial.

No caso, as razões para o ingresso no imóvel teriam sido a natureza permanente do tráfico, a

denúncia anônima e a fuga do investigado ao avistar a polícia. Em relação à tentativa de fuga

do agente ao avistar policiais, deve-se salientar que, nos termos do entendimento da Sexta

Turma deste Superior Tribunal de Justiça, tal circunstância, por si só, não configura justa causa

exigida para autorizar a mitigação do direito à inviolabilidade de domicílio.

Deve-se frisar, ainda, que "a mera denúncia anônima, desacompanhada de outros elementos

preliminares indicativos de crime, não legitima o ingresso de policiais no domicílio indicado,

estando, ausente, assim, nessas situações, justa causa para a medida." (HC 512.418/RJ, Rel.

Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 26/11/2019, DJe 03/12/2019).

Neste ensejo, vale destacar que, em situação semelhante, a Sexta Turma desta Corte entendeu

que, mesmo diante da conjugação desses dois fatores, não se estaria diante de justa causa e

ressaltou a imprescindibilidade de prévia investigação policial para verificar a veracidade das

informações recebidas (RHC 83.501/SP, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em

06/03/2018, DJe 05/04/2018).

Desta feita, entende-se que, a partir da leitura do Tema 280/STF, resta mais adequado a este

Colegiado seguir esse entendimento, no sentido da exigência de prévia investigação policial da

veracidade das informações recebidas. Destaque-se que não se está a exigir diligências

profundas, mas breve averiguação, como "campana" próxima à residência para verificar a

movimentação na casa e outros elementos de informação que possam ratificar a notícia

anônima.

PROCESSO: RHC 89.853-SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, por unanimidade, julgado

em 18/2/2020, DJe 2/3/2020.

Page 9: CAO Crim - mpsp.mp.br · Boletim Criminal Comentado - 04/2020 (semana nº 01) ... constante do Parecer 451/2017-J e revogou os Comunicados CG 573/2016 e 2077/2017, reconhecendo a

Boletim Criminal Comentado Abril-2020-

(semana nº 01)

9

COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM

O julgado ora comentado está pacificado na Corte. Sabemos que no tipo penal de tráfico de

drogas (art. 33 da Lei nº 11.343/06) há figuras típicas classificadas como permanentes, ou seja,

nas quais a consumação se prolonga no tempo, admitindo o flagrante a qualquer momento. O

indivíduo que, por exemplo, guarda ou tem em depósito determinada quantidade de droga em

sua residência está continuamente em flagrante delito. Considerando a exceção trazida pelo

art. 5º, inc. XI, da Constituição Federal a respeito da inviolabilidade do domicílio (flagrante

delito ou desastre, prestação de socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial), conclui-

se que o armazenamento de drogas em determinada residência permite a entrada de agentes

policiais independentemente de autorização judicial.

Mas há um problema: nem sempre é possível ter certeza sobre o armazenamento de drogas

em uma residência. Há situações em que os órgãos de polícia judiciária são capazes de

investigar amplamente a movimentação de membros de organizações criminosas e, com isso,

conseguem estabelecer um grau razoável de certeza a respeito da conduta criminosa

permanente. É comum, por exemplo, que policiais em campana observem por dias a

movimentação em imóveis utilizados por traficantes, o que lhes dá segurança para uma

abordagem certeira.

Mas há casos em que a investigação prévia é simplesmente impossível. São rotineiras as

ocasiões em que policiais militares ou mesmo guardas municipais se defrontam com indivíduos

em atitudes suspeitas – normalmente próximos a pontos de venda de drogas – e iniciam uma

abordagem que culmina na vistoria de imóveis residenciais baseada apenas na suspeita de que

nesses locais algo ilícito pode estar sendo armazenado. Isto faz surgir a dúvida: a entrada no

imóvel é legal?

Não há uma resposta a priori, sem que se considerem as inúmeras circunstâncias que

caracterizam um determinado fato. O STJ tem diversos julgados no sentido de que o mandado

de busca e apreensão é prescindível, justamente porque se trata de crime permanente, que

atrai a situação de flagrância:

“1. É dispensável o mandado de busca e apreensão quando se trata de flagrante de crime

permanente, podendo-se realizar a prisão sem que se fale em ilicitude das provas

obtidas. Doutrina. Precedentes do STJ e do STF. 2. No caso, o paciente foi acusado de praticar o

crime de tráfico na modalidade guardar e manter em depósito substâncias entorpecentes,

estando-se diante de ilícito de natureza permanente, o que legitima a medida adotada” (HC

373.388/RS, DJe 1/2/2017).

Page 10: CAO Crim - mpsp.mp.br · Boletim Criminal Comentado - 04/2020 (semana nº 01) ... constante do Parecer 451/2017-J e revogou os Comunicados CG 573/2016 e 2077/2017, reconhecendo a

Boletim Criminal Comentado Abril-2020-

(semana nº 01)

10

“A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que tratando-se de crimes de

natureza permanente, como é o caso do tráfico ilícito de entorpecentes, prescindível o

mandado de busca e apreensão, bem como a autorização do respectivo morador, para que

policiais adentrem a residência do acusado, não havendo falar em eventuais ilegalidades

relativas ao cumprimento da medida (HC 345.424⁄SC, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA

TURMA, j. 18⁄8⁄2016, DJe 16⁄9⁄2016)” (HC 326.503/RS, DJe 15/3/2017).

Mas essa dispensa deve ser fundamentada em evidências de que o crime de fato está

ocorrendo, como, por exemplo, na situação em que a polícia presencia o comércio de drogas

em frente a uma residência e constata que usuários e traficantes a estão frequentando. Se, no

entanto, tratar-se apenas de uma presunção, sem elementos concretos, o próprio STJ vem

copiosamente julgando inválidas as violações de domicílios. Recentemente, o tribunal

considerou ilegal a busca e apreensão em situação na qual, em razão de uma “denúncia”

anônima, uma equipe se deslocou ao local apontado e, ao avistá-la, o indivíduo apontado como

traficante fugiu:

“No caso, as razões para o ingresso no imóvel teriam sido a natureza permanente do tráfico, a

denúncia anônima e a fuga do investigado ao avistar a polícia. Em relação à tentativa de fuga

do agente ao avistar policiais, deve-se salientar que, nos termos do entendimento da Sexta

Turma deste Superior Tribunal de Justiça, tal circunstância, por si só, não configura justa causa

exigida para autorizar a mitigação do direito à inviolabilidade de domicílio.

Deve-se frisar, ainda, que “a mera denúncia anônima, desacompanhada de outros elementos

preliminares indicativos de crime, não legitima o ingresso de policiais no domicílio indicado,

estando, ausente, assim, nessas situações, justa causa para a medida.” (HC 512.418/RJ, Rel.

Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 26/11/2019, DJe 3/12/2019).

Neste ensejo, vale destacar que, em situação semelhante, a Sexta Turma desta Corte entendeu

que, mesmo diante da conjugação desses dois fatores, não se estaria diante de justa causa e

ressaltou a imprescindibilidade de prévia investigação policial para verificar a veracidade das

informações recebidas (RHC 83.501/SP, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em

6/3/2018, DJe 5/4/2018).

Desta feita, entende-se que, a partir da leitura do Tema 280/STF, resta mais adequado a este

Colegiado seguir esse entendimento, no sentido da exigência de prévia investigação policial da

veracidade das informações recebidas. Destaque-se que não se está a exigir diligências

profundas, mas breve averiguação, como “campana” próxima à residência para verificar a

Page 11: CAO Crim - mpsp.mp.br · Boletim Criminal Comentado - 04/2020 (semana nº 01) ... constante do Parecer 451/2017-J e revogou os Comunicados CG 573/2016 e 2077/2017, reconhecendo a

Boletim Criminal Comentado Abril-2020-

(semana nº 01)

11

movimentação na casa e outros elementos de informação que possam ratificar a notícia

anônima” (RHC 89.853/SP, j. 18/2/2020).

2- Tema: Atraso na instrução em razão de férias da testemunha pode caracterizar excesso de

prazo na prisão preventiva

INFORMATIVO 666 STJ- QUINTA TURMA

Com o fim de assegurar que a prisão não se estenda por período superior ao necessário,

configurando verdadeiro cumprimento antecipado da pena, a alteração promovida pela Lei n.

13.964/2019 ao art. 316 do Código Penal estabeleceu que o magistrado revisará a cada 90 dias

a necessidade da manutenção da prisão, mediante decisão fundamentada, sob pena de tornar

a prisão ilegal.

COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM

A prisão preventiva pode ser decretada na fase de investigação policial ou quando já

deflagrado o processo penal. Em sentido amplo, pode ser definida como a prisão decretada

antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, e tem significado idêntico a

“prisão processual”, “cautelar”, “provisória” ou “prisão sem pena”. Em um sentido mais estrito,

é disciplinada a partir do art. 311 do CPP.

Há países que limitam expressamente a extensão da prisão preventiva. O Código de Processo

Penal português, por exemplo, em seu art. 215 estabelece que será extinta a prisão preventiva

quando decorridos “quatro meses sem que tenha sido deduzida acusação; oito meses sem que,

havendo lugar a instrução, tenha sido proferida decisão instrutória; um ano e dois meses sem

que tenha havido condenação em 1ª instância; um ano e seis meses sem que tenha havido

condenação com trânsito em julgado”. A nossa lei processual, por outro lado, não estipula um

prazo máximo, considerando que as peculiaridades do caso concreto podem justificar

tratamentos e prazos diversos.

Afastada a indicação de um lapso temporal estrito para a duração da prisão cautelar, é

necessário adotar um critério de razoabilidade, pois, por sua natureza precária, a prisão

decretada sem a formação da culpa não pode se estender indefinidamente. Esse critério nos é

proporcionado pelo art. 5º, inc. LXXVIII, da Constituição Federal, segundo o qual “a todos, no

âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios

que garantam a celeridade de sua tramitação” (grifamos).

Page 12: CAO Crim - mpsp.mp.br · Boletim Criminal Comentado - 04/2020 (semana nº 01) ... constante do Parecer 451/2017-J e revogou os Comunicados CG 573/2016 e 2077/2017, reconhecendo a

Boletim Criminal Comentado Abril-2020-

(semana nº 01)

12

A preocupação com a duração razoável do processo a que o acusado responde preso levou o

Conselho Nacional da Justiça a editar a Resolução 66/2009, na qual se impõe que, estando o

réu preso provisoriamente há mais de três meses, com o processo ou inquéritos parados,

cumpre ao juiz (ou ao relator, tratando-se de recurso), investigar as razões da demora,

indicando, ainda, as providências adotadas, a serem, posteriormente, comunicadas à

Corregedoria Geral de Justiça ou à Presidência do Tribunal (no caso do relator). A Lei

13.964/19, alterando o art. 316 do CPP, seguiu o espírito da referida resolução para impor ao

órgão emissor da decisão o dever de revisar a cada noventa dias, mediante nova decisão

fundamentada, a necessidade da manutenção da prisão.

Se, como vimos, não há um prazo específico para a duração da prisão cautelar, a análise do

excesso é feita com base nas características de cada processo. Se a prova se resume à oitiva da

vítima e de uma testemunha, ambas residentes na mesma cidade em que tramita a ação penal,

é razoável exigir que se proceda de forma mais célere do que em uma ação penal em que

devem ser ouvidas dez testemunhas em locais diversos.

Mas, ainda que se justifique a extensão do prazo em razão da complexidade que o processo

revela, é preciso cuidado para evitar excessos. A complexidade não é um fator capaz de

absolver falhas que acarretam a prorrogação do processo para além do razoável dentro

daquele contexto. Recentemente, o STJ concedeu habeas corpus para determinar a soltura de

uma ré presa que aguardava apenas a oitiva de uma testemunha que não pôde ser intimada

porque estava de férias. A ação penal, relativa a um furto de equipamentos médicos avaliados

em oitocentos mil reais, tramitava com a prisão decretada havia oito meses, e, dadas as

circunstâncias, o tribunal considerou presente o constrangimento ilegal:

“[…] Mencione-se, por outro lado, que, com o fim de assegurar que a prisão não se estenda por

período superior ao necessário, configurando verdadeiro cumprimento antecipado da pena, a

alteração promovida pela Lei n. 13.964/2019 ao art. 316 do Código Penal estabeleceu que o

magistrado revisará a cada 90 dias a necessidade da manutenção da prisão, mediante decisão

fundamentada, sob pena de tornar a prisão ilegal.

Necessário, porém, considerar que, cumprido tal requisito, eventual constrangimento ilegal por

excesso de prazo não resulta de um critério aritmético, mas de uma aferição realizada pelo

julgador, à luz dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, levando em conta as

peculiaridades do caso concreto, de modo a evitar retardo abusivo e injustificado na prestação

jurisdicional.

Page 13: CAO Crim - mpsp.mp.br · Boletim Criminal Comentado - 04/2020 (semana nº 01) ... constante do Parecer 451/2017-J e revogou os Comunicados CG 573/2016 e 2077/2017, reconhecendo a

Boletim Criminal Comentado Abril-2020-

(semana nº 01)

13

Como visto, a paciente responde, com mais três pessoas, pelo crime de associação criminosa e

furto qualificado, por terem furtado 5 equipamentos endoscópio, 2 equipamentos de

colonoscopia, 1 equipamento de duodenoscopia e acessórios, com válvulas e tampas de

válvulas, material avaliado em cerca de R$ 800.000 (e-STJ fls. 32 e 45).

Ainda, segundo consta dos autos, encontra-se presa desde o dia 23/7/2019, há mais de 8

meses, sem que tenha sido proferida sentença, por crime praticado sem violência ou grave

ameaça. Importa destacar que uma das testemunhas não foi ouvida, um policial, porque estava

de férias, razão pela qual a paciente teve que aguardar presa a nova audiência, contexto que

agravo mais o constrangimento sofrido em razão da excessiva demora na prisão cautelar.

Assim, forçoso reconhecer o excesso de prazo para a formação da culpa”.

3- Tema: Possibilidade de o juízo da execução proclamar a reincidência

STJ- PESQUISA PRONTA

No EREsp 1.738.968, a relatora, ministra Laurita Vaz, consignou: "O STJ firmou entendimento

pela possibilidade de o juízo da execução, ante a ausência de reconhecimento pelo juízo

sentenciante, proclamar a reincidência sem que tal providência acarrete reformatio in pejus".

COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM

A reincidência é circunstância pessoal que interfere na execução como um todo.

Sendo assim, a condição de reincidente, uma vez adquirida pelo sentenciado, estende-se sobre

a totalidade das penas somadas, não se justificando a consideração isolada de cada

condenação e tampouco a aplicação de percentuais diferentes para cada uma das

reprimendas.

O entendimento – que já havia sido aplicado no julgamento do HC 307.180, de relatoria do

ministro Felix Fischer – foi reafirmado no HC 506.275, sob a relatoria do ministro Sebastião Reis

Júnior.

Page 14: CAO Crim - mpsp.mp.br · Boletim Criminal Comentado - 04/2020 (semana nº 01) ... constante do Parecer 451/2017-J e revogou os Comunicados CG 573/2016 e 2077/2017, reconhecendo a

Boletim Criminal Comentado Abril-2020-

(semana nº 01)

14

DIREITO PENAL:

1-Tema: Art. 241-A da Lei n. 8.069/1990. Grande interesse por material pornográfico.

Exasperação da pena-base. Conduta social ou personalidade. Inviabilidade

INFORMATIVO 666 STJ- SEXTA TURMA

O grande interesse por material que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica

envolvendo criança ou adolescente é ínsito ao crime descrito no art. 241-A da Lei n.

8.069/1990, não sendo justificável a exasperação da pena-base a título de conduta social ou

personalidade.

Cinge-se a controvérsia a decidir se o grande interesse em pornografia infantil é motivo idôneo

para valorar negativamente a pena-base do réu, a título de conduta social ou personalidade do

agente que cometeu o crime do art. 241-A da Lei n. 8.069/1990.

Caracteriza o crime do art. 241-A do ECA oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir,

publicar ou divulgar por qualquer meio, inclusive por meio de sistema de informática ou

telemático, fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou

pornográfica envolvendo criança ou adolescente (pena de 3 a 6 de reclusão e multa).

Nesse contexto, o dado inerente ao tipo penal não justifica a exasperação da pena-base, a

título de conduta social ou personalidade. O grande interesse por material que contenha cena

de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente é ínsito ao crime descrito

no art. 241-A da Lei n. 8.069/1999. O referido dado já foi sopesado pelo legislador para

criminalizar a conduta e estabelecer severa sanção penal, com o objetivo, justamente, de

proteger a dignidade das crianças e dos adolescentes, pondo-os a salvo de formas desviadas de

satisfação sexual.

PROCESSO: REsp 1.579.578-PR, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, por maioria,

julgado em 4/2/2020, DJe 17/2/2020.

COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM

A primeira etapa de aplicação da pena privativa de liberdade tem por finalidade fixar a pena-

base, partindo do preceito secundário simples ou qualificado cominado no tipo penal, sobre o

qual incidirão as circunstâncias judiciais previstas no artigo 59 do Código Penal: culpabilidade,

Page 15: CAO Crim - mpsp.mp.br · Boletim Criminal Comentado - 04/2020 (semana nº 01) ... constante do Parecer 451/2017-J e revogou os Comunicados CG 573/2016 e 2077/2017, reconhecendo a

Boletim Criminal Comentado Abril-2020-

(semana nº 01)

15

antecedentes, conduta social, personalidade do agente, motivos, circunstâncias e

consequências do crime, bem como o comportamento da vítima.

Cada uma destas circunstâncias é baseada em aspectos distintos que envolvem o crime e seu

autor. O aumento da pena nessa primeira fase é justificável apenas nas situações em que as

circunstâncias revelam uma gravidade maior do que o normal. Por alguma das razões

elencadas no art. 59, o fato é mais grave do que o legislador anteviu ao cominar os limites da

pena. Por exemplo, já se decidiu que o policial que comete crime de concussão tem maior

culpabilidade (leia-se: sua conduta é mais reprovável) do que um funcionário público comum

que comete o mesmo crime, tendo em vista que, pela função desempenhada, espera-se que a

população possa confiar mais em policiais do que em outros agentes públicos (STJ, AgRg no

REsp 1.366.683/PR, j. 14/11/2017). Há também decisão que, devido aos severos danos

psicológicos suportados pela vítima de estupros em continuidade, considerou legítimo o

aumento da pena em razão das consequências do crime (STJ, HC 454.044/RJ, j. 04/09/2018).

Ambos os exemplos revelam circunstâncias que exorbitam as elementares dos crimes. A

condição de funcionário público na concussão e o abalo psicológico no estupro já são

considerados na própria composição do tipo, mas há situações excepcionais que tornam mais

graves essas circunstâncias.

No julgamento do REsp 1.579.578/PR (j. 04/02/2020), relativo a crimes de armazenar e

compartilhar material com pornografia infantil, o STJ descartou o aumento da pena-base em

razão da personalidade ou da conduta social de um condenado que, segundo o apurado,

demonstrava “grande interesse” pelo material apreendido em seu poder. Para o tribunal, ainda

que exacerbado, o interesse do agente por imagens ou vídeos de crianças e adolescentes em

cenas pornográficas é inerente às figuras criminosas do ECA, razão pela qual já é considerado

na cominação da pena-base:

“Cinge-se a controvérsia a decidir se o grande interesse em pornografia infantil é motivo

idôneo para valorar negativamente a pena-base do réu, a título de conduta social ou

personalidade do agente que cometeu o crime do art. 241-A da Lei n. 8.069/1990.

Caracteriza o crime do art. 241-A do ECA oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir,

publicar ou divulgar por qualquer meio, inclusive por meio de sistema de informática ou

telemático, fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou

pornográfica envolvendo criança ou adolescente (pena de 3 a 6 de reclusão e multa).

Nesse contexto, o dado inerente ao tipo penal não justifica a exasperação da pena-base, a

título de conduta social ou personalidade. O grande interesse por material que contenha cena

Page 16: CAO Crim - mpsp.mp.br · Boletim Criminal Comentado - 04/2020 (semana nº 01) ... constante do Parecer 451/2017-J e revogou os Comunicados CG 573/2016 e 2077/2017, reconhecendo a

Boletim Criminal Comentado Abril-2020-

(semana nº 01)

16

de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente é ínsito ao crime descrito

no art. 241-A da Lei n. 8.069/1999. O referido dado já foi sopesado pelo legislador para

criminalizar a conduta e estabelecer severa sanção penal, com o objetivo, justamente, de

proteger a dignidade das crianças e dos adolescentes, pondo-os a salvo de formas desviadas de

satisfação sexual”.