Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

26
T emas do S obrenatural Nesta edição... Artigo: ROMANCES SOBRENATURAIS, POR QUE FASCINAM TANTO? Jossi Borges ANJOS, SANTOS e MILAGRES: LAGARTIXA DE OURO Simões Lopes Neto BRUXAS e FEITIÇARIA: BRUXAS (EM STA. CATARINA) Lucas A. Boiteux COCA E CUCA Luís da Câmara Cascudo SERES FANTÁSTICOS: PRESENTE DE DUENDE Jossi Borges LOBISOMEM: O VELHO LOBISOMEM Leniria R. Silva NOITE DE PRATA M. Blannco Revista digital de Literatura, Folclore e mitos Edição 01 - 08 de junho de 2011

Transcript of Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

Page 1: Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

Temas do

Sobrenatural

Nesta edição...

artigo:rOMaNCeS SOBreNaturaiS, POr Que FaSCiNaM taNtO?Jossi Borges

aNJOS, SaNtOS e MiLagreS:Lagartixa de OurOSimões Lopes Neto

BruxaS e FeitiÇaria:BruxaS (eM Sta. CatariNa)Lucas a. Boiteux

COCa e CuCaLuís da Câmara Cascudo

SereS FaNtÁStiCOS:PreSeNte de dueNde Jossi Borges

LOBiSOMeM:O VeLHO LOBiSOMeM Leniria r. Silva

NOite de PrataM. Blannco

aNJOS, SaNtOS e MiLagreS:

BruxaS (eM Sta. CatariNa)

PreSeNte de dueNde

Revista digital de Literatura, Folclore e mitos

Edição 01 - 08 de junho de 2011

Page 2: Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

2

Temas do Sobrenatural

editOriaLTemas que Assustam

Mais uma ideia surgida do amor à literatura, ao folclore e à fantasia. To-dos nós temos em nosso âmago esse quê de esquisitos, que nós faz pro-curar pelo insólito e nos faz sentir prazer em filmes e histórias de terror. Esseéomotivopeloqualfilmeselivros de terror e fantasia tanto sucesso têm feito, e o por quê de tantos lançamentos literários baseados em temas como vam-piros, lobisomens, fantasmas, aparições. Como amantes do mistério e do insólito, nosso grupo de escritores, que se conheceram através de diversas re-des sociais e grupos de leitura na inter-net, resolveram criar esse zine eletrônico, abordando não apenas a literatura, mas também um pouco do folclore brasileiro e da literatura estrangeira também. Bem vindo, leitor, à nossa revista que vai abordar todos os temas sobrenaturais possíveis, desde mitos clássicos (vampiros e lobisomens), aos mitos nacionais mod-ernos(botos,iaras,sacis,curupiraseafins).

Jossi Borges________________________

temas do Sobrenatural - edição 018dejunhode2011

Criação: Comunidade Romance com Tema Sobrenatural (Orkut).

Colaboradores: Ceila Leite, Celly Mon-teiro,MayaBlanncoeRebisKramrisch.

Diagramação: Jossi Borges

Capa e imagens: Jossi Borges

rOMaNCeS SOBreNaturaiS, POr Que FaSCiNaM taNtO?

NO MUNDO dos romances, no-tadamente dos romances femininos, há hoje em dia um novo sub-gêne-ro. Nascido dos romances góticos do século XIX, com raízes em contos românticos-góticos ou de suspense, como “Frankstein” de Mary Shelley,“Carmilla”deJ.SheridanLeFanuedosro-manceságua-com-açúcardosanos50e60,o novo romance sobrenatural da literatura feminina engloba nomes e temas diversos.

Asmulheressempreoptarampelogênero romântico, desde que o mundo é mundo. Mesmo assim, com o advento do feminismo, da liberdade sexual e da maior ênfasedadaàexpressãodasmulheresnosmeiosdecomunicação-dosanos6opara cá - o romantismo feminino apimen-tou-se.Esqueceram-sedosantigosfolhe-tins só-açúcar (Corin Tellado, Barbara Cartland,M.Delly)paraembrenharem-senassagasfamiliarescheiasdepeque-nos dramas logo resolvidos ou sagas medievais, em que a mocinha-donzelanem é mais tão donzela assim, e o mo-cinho-heróié,àsvezes,umpoucovilão...Nomes como Diana Palmer, Nora Roberts, Lorah Leigh e ChristineFeehan despontaram no univeroliterário feminino, tingindo as an-tes tão róseas páginas dos romances com gotículas de... suor... e sangue.

Page 3: Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

3

Temas do Sobrenatural

Esurgiramosmocinhos-vampiros,diante dos quais a antiquada figura doConde Drácula de Stoker não é mais queumborrão,umafiguraempreto-e-brancodeumvelhoeempoeiradolivro,bizarra, feia e até um pouco ridícula.

Os mocinhos-vampiros atuaisnada tem do antiquado conde dos Cár-patos, com sua capa preta, corte de ca-belo curto e lambido, sangue escor-rendo no canto da boca, e mau hálito.Agora, as mulheres exigem vam-piros belos e aguerridos, mas sem vi-lania. Jovens, charmosos, roupas mod-ernas e, além das presas afiadas, ummembro viril dos bons. De morto, os novos vampiros só tem o nome...

Os novos romances sobrenat-urais trazem, além dos vampiros, outros temasigualmenteexcitantesecheiosdeadrenalina: Homens-animais genetica-mente modificados (Lora Leigh), lobi-somens criados por alterações genéticas ou maldições (Lori Handeland e Ronda Thompson), viagens no tempo (LynnKurland), magias antigas (Quinn Taylor Evans, Jill Barnett, Nora Roberts), fantas-masbonitões (SandyBlair,RachelLee),reencarnações (Margaret Chittenden)e até... o cúmulo da fantasia: Demônios com pinta de anjo (Jacquelyn Frank). A nova mania da literatura român-tica agora, são os “romances teen” e no-vas autoras voltadas para a literatura feminina adolescente destacam-se, como Meg Cabot, por exemplo. Na fantasia emgeral,temosafiguradoinesquecívelHarry Potter, de J. K. Rowling. E pegan-do carona nesse gênero, surgem diversos outros romances e sagas infanto-juve-nis ou femininas, que estão dispostos a qualquer coisa para conquistar os leitores.

No Brasil, o sub-gênero sobrenat-

ural começa a tomar forma, com no-vos talentos que, aos poucos, vão ganhando os leitores: Martha Arges(Relações de Sangue, vampírico), An-dré Vianco (diversos romances com temas sobrenaturais, desde vampiros até assombrações), Giulia Moon (Luar de Vampiros, A Dama Morcega, etc), Nelson Magrini (Anjo, a Face do Mal), Laura Maria Elias (diversos romanc-es com temas paranormais), Adriano Siqueira, do site “Adorável Noite”, e outros nomes de talentos incipientes. Entre os “monstros” sobrenat-urais brasileiros, alguns já se tornaram conhecidos do público: Os vampirosperigosíssimosesemcharme-eporissomesmo tão fascinantes - de André Vian-co, a graciosa vampira Lucilla de Mar-thaArgel e osmonstregos ora sensuais,ora repulsivos do site Adorável Noite.

Mas novos vampiros vêm por aí. Novos autores insinuam-se no cenário da ficção brasileira. Onde estão? Ain-da nas gavetas... esperando apenas que alguns editores abram os olhos, paraver, pelas frestas de tais gavetas, o brilho avermelhado dos olhos deles...

PARA SABER MAIS:

www.amorelivrosarte.justtech.com.br

http://contosefolhetins.blogspot.com

http://romance-sobrenatural.blogspot.com

http://alternativosindependentes.blogspot.com

Procuretambémconhecernovosau-tores na comunidade do Orkut,

Romance com Tema Sobrenatural.

Page 4: Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

4

Temas do Sobrenatural

Lagartixa de OurOSimões Lopes Neto

FREI SERAFIM DE CATABIA, da or-demdos capuchinhos, chegouaoRecifeem11de setembrode 1841, começandoa percorrer todo o Nordeste em prega-ção catequística. Foi o grande missionário dos sertões de pedra, dirigindo as “Santas Missões” que ficaram relembradas nasmemórias coletivas das regiões visitadas. Irradiava energia, persuasão, bondade. A fama de fazer milagres derramou-se.

O brigadeiro Dendé Arcoverde, rico, poderoso, com um exército de guarda-costas e um harém de seismulheres, domina o solar de Cunhaúcomo o derradeiro barão feudal. Frei Se-rafimfoivisitá-lo.Quandoodeixou,Den-dé Arcoverde dispersou seu bando guer-reiro,despediuasmulheres,desarmou-see nunca mais mandou matar alguém, ex-ceto a si próprio, pois suicidou-se, para não ser preso, a 26 de julho de 1857.

Frei Serafim, a 21 de fever-eiro de 1858, benze a primeira pe-dra da futura matriz do Ceará-mir-im, a mais linda igreja da província.

Foi de inexcedível dedica-ção na epidemia de cólera-morbo. Velho,doente,cansado,freiSerafimvoltou à Itália, para sua amada Catania, na Sicília,ondefaleceua14demaiode1887.

Veio várias vezes ao Rio Grande do Norte e, entre outras, deixou esta lenda de sua intervenção miraculosa.

Um homem de bem, pobre, comfamília numerosa, estava sendo im-paciente de receber os 100 mil réis, enão sabia que fazer para enfrentar a vidadifícil. Foi procurar frei serafimdeCatania no consistório da igreja de San-to Antônio, expondo, com lágrimas, sua desventurada situação. O frade ouviu-o, animou-o e erguendo-se, olhou ao der-redor, vendo apenas uma lagartixa que balançava a cabeça numa janela. O ca-puchinho fezo sinaldacruzeoanimalimobilizou-se como feito de bronze. Frei Serafimembrulhou-onumpedaçodepa-pel e entregou-o ao necessitado penitente.

“Peçadinheiroemprestadosobestepenhorelivre-sedamiséria.Daquiaumano volte, trazendo o objeto e o coloque no altar,nospésdeSantoAntônio.Promete?”

“Juro pela salvação da minhaalma!” — respondeu o pobre homem.

Correu ao agiota, pedindo a fortu-nade500mil,deixandoumdepósito.Oonzenárioabriuoembrulhoeencontrouuma lagartixa de ouro, com a boca de rubiseosdoisolhosdebrilhantes.Valiao triplo. Pesou, provou, experimentou e deuos500milréisaofreguês.Este,commenos de um ano, estava livre de preocu-pações. Possuía casa própria, gado, uma loja, a família tranqüila e feliz, cavalo de sela para o trato dos negócios. Foi ao usurário, liquidar o débito. Este propôs comprar a lagartixa de ouro. “Não é minha”,explicouoabastadonegociante.

Page 5: Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

5

Temas do Sobrenatural

Recebendo o penhor, foi à igrejade Santo Antônio e, feita a vênia, depôs o pacote aos pés do orago. Imediata-mente o papel mexeu-se e dele saiu, es-fomeada e rápida, uma lagartixa, viva e veloz, em desabalada carreira. O homem percebeu o milagre de frei Se-rafim de Catania e, ajoelhando, rezoulongamente, agradecendo a mercê.

O inimitável Ricardo Palma conta episódio semelhante ocorrido em Lima,no Peru. O taumaturgo é outro francis-cano, frei Gomez, nascido em 1560 naEstremadura e falecido a 2 de maio de1631. Era frade leigo, enfermeiro du-rante quarenta anos. (Ricardo Palma, Flor de tradiciones, “El alacran de Fray Gomez”, p.88-94, México DF, 1943).

Um castelhano honrado e velhoveioprocurarfreiGomez,suplicando-lheomilagredeumaesmolade500durosporseis meses. Frei Gomez nunca tivera uma peseta. Ouvindo o suplicante, comoveu-se e, arrancando uma página de um livro, en-colveu com ela um escorpião que atraves-sava o recanto. Era o lacrau agressivo, an-zol na cauda, tesouras abertas, pequenino e feroz.O homem levou o escorpião aoagiota pelo empréstimo de 500 duros.

Transformara-se numa jóia de rainha. Er aum broche, com forma delacrau. O corpo formado de uma esmeral-damagnífica,engastadaemouro,acabeçadebrilhantescomdoisrubisporolhos.Oagiotaofereceuemprestar-lheoquádru-plo.Ohomemaceitouunicamenteos500duros e tão bem os movimentou que estava fartoeserenodeeconomianofimdose-mestre. Foi pagar a dívida e recobrar a jóia.

Levou-a a frei Gomez. Este repôs o escorpião no peitoril da janela, abençoou-o:“AnimalitodeDios,siguetucaminho...”

E o lacrau recomeçou a an-dar livremente pelas paredes da cela.

Não ponho dúvidas em crerque a divina intervenção ter-se-á re-alizado na cidade do Natal na se-gunda metade do século XIX e na ci-dade de Lima nos princípios do XVII.Masháoutra,irmãebemexpressiva,RenéBasset (Mélanges africains et orientaux, p.307,Paris,1915),comentandoE.Gault-ier no Contribution à l’étude de la litté-raturecopté(Cairo,1905)divulgaocasoque na América do Sul tivera personagens comofreiGomezefreiSerafimdeCatania.É uma tradição cristã no Egito. Ligada ao ciclo taumatúrgico de São Basílios. Um pobre, protegido pelo santo, tomaemprestado40dinaresaseupadrin-ho, dando de caução uma serpente or-dinária que São Basílios tornara de ouro, comacabeçadeesmeraldaeosolhosderubis.Nofimdoano,oagiota,levadopelaavidezeaconselhadopelamulher,recu-sou devolver o penhor, raro e precioso.Mas a jóia voltou a ser serpente, venenosa e viva. O episódio dos coptas egípcios mantém as mesmas pedras, esmeralda, rubi e o ouro. O ensinamento moral cop-ta em nada altera a substância temáti-ca das tradições brasileira e peruana.

(Cascudo, Luís da Câmara. “Lagartixa de ouro”.OEstadodeSãoPaulo,12deoutubrode1958)

5

VOCÊ SABIA?

Luís da Câmara Cascudo foi um dos maio-res folcloristas e etnografi stas do Brasil e sua obra completa é vastíssima, possuindo mais de 150 obras. Sua obra mais impor-tante foi “Dicionário do Folclore Brasileiro”, obra que é referência no mundo inteiro.

Page 6: Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

6

Temas do Sobrenatural

BruxaS (eM Sta. CatariNa)Lucas a. Boiteux

QUANDO DE um casal nascem sete filhas,semnenhummeninodepermeio,a primeira ou a última será, fatalmente, uma bruxa. Para que isso não venha aacontecer faz-se mister que a mana mais velha seja a madrinha de batismo damais moça. São apontadas como tal cer-tas mulheres magras, feias, antipáticas. Dizem que têm pacto com o demônio, lançammaus olhados, acarre-tam enfermidades com os seus bruxedos, etc. Costumam transformar-se em mari-posas e penetrar nas casas pelo buraco das fechaduras. Têm por hábito chuparo sangue das crianças ou mesmo de pes-soas adultas, fazendo-as adormecer pro-fundamente.Amarcadochupãodeixadonapele, chamadoovulgode“melanco-lia”. Para que as crianças não batizadas não sejam atacadas pela bruxas, deve-se à noite conservar a luz acesa no quarto. Sabe-sequeumamulherébruxa,quandodáaapertaramãocanhotaesquerda.Para se descobrir a bruxa que chupa osangue da criança e ela logo apareça, soca-se, em um pilão a camisa da criança ou da pessoaporelachupada.Elalogoseapre-senta e pede para que não façam aquilo. Existe também uma oração contra elas; quem a possui consegue descobri-la e prendê-la e também não adormece quan-

do ela à noite penetra em casa. A pessoa assim premunida toma, para prendê-la, deumtachoouumamedidadealqueireelogo que a bruxa entra em casa, emborca o tachoouamedidaeelaficaincapazdesair. Há ainda outro processo de iden-tificar uma bruxa: vira-se a lingueta dafechadura de uma canastra. A bruxa,ao entrar em casa, a primeira coisa que faz é pedir para endireitar a lingueta.

FONTES:BOITEUX,LucasA.“Achegasàporan-duba Catarinense”. Em Boletim trimes-tral da sub-comissão catarinense de fol-

clore

Page 7: Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

7

Temas do Sobrenatural

COCa e CuCaLuís da Câmara Cascudo

A CUCA OU A COCA é um ente velho, muito feio, desgrenhado, queaparece durante a noite para levar con-sigo ps meninos inquietos, insones sones ou faladores. Para muitos a Coca ou Cuca é apenas uma ameaça de perigo informe. Amedronta pela deformidade. Não sabem como seja o fantasma. A maioria, porém, identifica-a como umavelha,bemvelha,enrugada,decabelosbrancos, magríssima, corcunda e sem-pre ávida pelas crianças que não querem dormircedoefazembarulho.Éumfan-tasma noturno. Figura em todo Brasil nas cançõesdeninar.Nãohásobreeleepisó-dios nem localizações. Está em toda a parte mas nunca se disse quem carregou e como o faz. Conduz a criança num saco. Leva nos braços. Some-se imediatamente depois de fazer a presa. Pertence ao cic-lo dos pavores infantis que a Noite traz.

Amadeu Amaral estudou a Cuca, exten-sa e sabiamente:

CUCA, s.f. — entidade fantástica, com que se mete medo às criancinhas:

Durma, meu benzinho, que a cuca j’ei vem

Diz uma cantiga de adormecer. Por ext., entre adultos, atos destinados a ate-mori-zar: “Eu cá não tenhomedo de cucas.”

A palavra e a superstição, está quase de todo delida já em S. Pau-lo, existem espalhadas pelo Brasil.

Num dos seus contos goianos, escreveu Carvalho Ramos: “Ah, sim, a bruxa...Essa, de certo, levou-a o Cuca, num pé devento,àhoradameianoite...EmPer-

nambuco significa mulher velha e feia,espécie de feiticeira, e é também o mes-mo que quicuca, ticuca, rolo de mato (Garcia). Beaurepaire Rohan regista asvariantes corica, curuca, corumba, das terras do Norte. A cuca paulista é em tudo semelhante ao vago papão luso-brasil,aobichoeaotutudeváriosEsta-dos, aonegrovelhodeMinas.Dizumaquadrinha popular portuguesa, citadapor Gonçalves Viana (Palestras Filológicas):

Vai-te papão, vai-te embora de cima desse telhado, deixa dormir o menino um soninho

descansado.

Diz uma quadrinha mineira, vi-sivelmente aparentada com a precedente:

Olha o negro velho em cima do telhado. Ele está dizendo, quer o menino assado.

Outra, ainda mais próxima da por-tuguesa, e também de Minas (citada, como a primeira, por Lindolfo Gomes):

Vai-te, Coca, sai daqui para cima do telhado; deixa dormir o menino o seu sono sossegado.

Vê-se desse exemplo que em Minas se

Page 8: Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

8

Temas do Sobrenatural

diz coca. As formas portuguesas são coca e coco. Na procissão de Passos, em Por-timão, havia um indivíduo vestido detúnica cinzenta e coberto com um capuz, aquemchamavamcoca(LeitedeVascon-celos, segundo Lindolfo Gomes). A essa figuracorrespondia,nasantigasprocissõesdo Enterro, em Minas (Lindolfo Gomes), e na dos Passos, em S. Paulo, o farricoco.

Lê-se no S. Paulo antigo: “Adiante dessa soleníssima procissão era costume, pa-rece que até o ano de 1856, ir o pre- goeiro, chamado Farricoco ou a Morte — vestido de uma camisola de pano de cor preta, tendo na cabeça um capuz do mesmo pano, que lhe cobria o rosto, com dois buracos nos olhos, e lhe caía sobre o peito... sendo que as crianças, ao avistarem esse feio personagem, fi cavam apavoradas, pois umas choravam e outras tapavam com as mãos os seus olhos”. — Em Espanha há coca, serpente de papelãoque, na Galiza e outras províncias, sai no dia de Corpus Christi; há tambémmala cuca, malicioso, de má índole. G. Viana (Palestras) refere-se ainda a uma palavra castelhanacoco,entidadefantás-tica,quesejulgahabituadaadevorarcriaturashu-manas, como o papão. A sinonímia entre papão e coco ou coca está estabelecida no seguinte dístico das Orações acadêmi-cas de frei Simão, citado por G. Viana:

O melhor poeta um coco, o melhor vate um papão.

Coco encontra-se ainda em Gil Vi-cente, no Auto da Barca do Pur-gatório, onde parece indicar o diabo:

Mãe, e o coco está ali.

Rubimparecequedavaacocoasignifica-çãogeraldeentidadefantástica;definindobitu,chama-lhe—“cocoparametermedo

àscrianças”,edefineidenticamenteboitatá.(Amadeu Amaral — O Dialeto Caipira,

pp.123/124.S.Paulo,1920) Fica, evidentemente, assentado que coco, coca, e cuca são uma e a mesma enti-dade. Mostra-se igualmente sua existên-ciaemEspanhaePortugal,emaplicaçãoirmã à que ouvimos em nossa meninice. Falta apenas o fio explicadordesse fantasma que nos recordamos saudosamente de sua existência. Sua significação escapa também aos estu-diosos porque os entes fabulosos que amedrontam as crianças têm sido exami-nados às pressas, sem maiores simpa-tias ou com notável indiferença erudita. É possível tentar alumiar a gênese desse monstro familiar, aju-dado por alguns bons dicionaristas.

FONTES:Cascudo, Luís da Câmara. Geografi a

dos Mitos Brasileiros. Amaral, Amadeu. O Dialeto Caipira,

pp.123/124.S.Paulo,1920

Page 9: Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

9

Temas do Sobrenatural

SereS FaNtÁStiCOS

PreSeNte de dueNde Jossi Borges

DURANTE ANOS DAN-NA sonhara com aquele homem.Nem saberia dizer ao certo como ou por que,massempresonharacomele...Quegêniomágico toca com sua varinha en-cantadaoserhumanopeloqualoutroserhumanoseapaixona?Haveriaumaexpli-cação racional para o fato de você – entre tantosseressemelhantes,maisoumenoscom as mesmas características físicas, psi-cológicas,sociais–escolherum,determi-nado?Porquejustamenteaquelehomem(oumulher)destacando-senamultidão?Se ele ou ela poderiam facilmente ser con-fundidoscomoutros...?Senãopossuemnada que os dintingua dos demais – como umabelezaextraordinária,ouunsolhosmagníficos... ou uma carreira brilhantegraças à uma personalidade carismáti-ca...? O quê exatamente tinha ele...? Danna estava sentindo-se muito sozinha naquela tarde, véspera de Na-

Uma noite de Natal... Uma mulher dividida entre um amor forte do passado e um idílio do presente. E uma estranha criatura que, na ma-

gia do Natal, resolve ajudar Danna a resolver aquele impasse!

tal,apesardesuacasaestarcheiadepes-soas – amigos e parentes. Apesar de sua recente separação do marido, Ulisses, a família fizera questão de visitá-la e re-solveram que passariam em sua casa a noite de Natal, talvez para animá-la e dar-lhe alguma forma de apoio emocional.Ela, entretanto, não estava triste... não ex-atamente. Apenas um pouco melancóli-ca, como se sua energia toda tivesse sido drenada e a exaustão física se refletisseem sua mente e até em sua aparência. Léia, sua prima, insistira em levá-la ao cabeleireiro, para dar um “up” no vi-sual, como ela dissera... fora uma ma-neira delicada de ajudá-la a livrar-se daquele cabelo que mais lembrava uma vassoura, sem corte e forma definida.Elaobservara-seaoespelho:Olhosfundos,pálida, ombros caídos, um ar de desleixo e abatimento. Sabia que era preciso mel-horar a aparência, pois talvez... talvez...naquela noite... ela o visse. Alexandre.

Page 10: Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

10

Temas do Sobrenatural

Desde que o conhecera, há cercade quatro anos atrás, sentira-se estran-hamente atraída por ele. Uma volúpiano ar... um perfume... um sorriso en-cabulado... uma troca de olhares... umtoque de mãos... outro sorriso. Uma es-pécie de magnetismo, uma aura dou-rada e azul em torno daquele rosto claro, daqueles olhos azuis, daquelesorriso que tinha um quê de infantil. Nisso resumiu-se o encan-tamento que a dominara desde então. E que crescera, enraizara-se, tornara-se uma paixão secreta. Alexandre era primo em segundo grau de Ulisses, e con-siderado quase um ir-mão mais novo pelo seu marido. Frequentava-lhesa casa, em finais de se-mana, quando comparecia com o restante da famí-lia: seus pais e irmãos. Dentre todos aqueles rostos, somente o de Al-exandre fulgurava para Danna, como se uma luz interior se refletisse emsua pele e uma doce e ave-ludada magia rodopiasse entre eles, transmitindo-lhes sem palavras o senti-mento e o desejo secreto... O casamento com Ulisses era uma história muito diferente. Ulissesera um homem prático, empreendedor,forte, pouco dado a romantismo. Ini-cialmente, houvera entendimento en-tre eles... mas o tempo e a rotina acaba-ra por separá-los. E talvez algo mais... Danna culpava-se pelo fim do casa-mento, pois fora a única causadora. Pensara muito em Ulisses nos últi-mos dias, quando ele fora embora, após uma briga violenta, em que ela o acu-

Alexandre era primo em segundo

sara de preteri-la pelos negócios. Não, ele dissera, ela sabia que os negócios – ele era o diretor de uma próspera agên-cia de propaganda em Curitiba – foram apenas o pretexto para ela. E que toda e qualquer atitude dele em relação a trab-alho e negócios visavam única e exclu-sivamente melhorar a vida de ambos... Ela sorriu para Léia, que arru-mava a árvore de Natal na sala. A pri-ma falou, retribuindo-lhe o sorriso: ― Vai vestir-se? Querida, aquelevestido vermelho rebordado commiçangas vai deixá-la deslumbrante... - piscou-lhe um olho, com ar maroto.

― E por que eu ia... ― Ah, meu bem. Nãonasci ontem. Sei muito bem que... o Natal é um dia espe-cial... e que coisas maravil-hosas...eaté inacreditáveisacontecem nesse dia... Pense bem. Capriche no visual. Ela mirou na prima um olhar confuso. Será queLéia... saberia de alguma coisa? Mas tinha absolutacerteza que não! Jamais con-tara nada, e fora um furtivo beijo trocado com Alexan-dre, uma vez – uma única vez–elesjamaistinhamtidoqualquer relacionamento.

Agora, enquanto observava Léia, notava nela alguma coisa estranha... es-taria vendo coisas...? A pele da primaparecia muito corada e clara, como a pele de uma européia, e Léia era more-na clara, de pele cor de canela. Havia ainda um brilho traquinas nos olhosdela, e o sorriso... Era brincalhão, cheiode uma energia que parecia contagiá-la. Léia era sua amiga, mas nunca fora mui-to de brincadeiras, ostentando sempre um ar sério, mesmo quando faziam co-

Page 11: Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

11

Temas do Sobrenatural

mentários jocosos sobre qualquer coisa. Ela deu de ombros. Tudo parecia cheiodebrilhohoje...talvezfossea“ma-gia no Natal”, ela riu-se consigo mes-ma. Até mesmo a fantasia de “Mamãe Noel” que Léia usava parecera-lhe ex-travagante e fora do “padrão Léia”... Subiu as escadas para seu quarto, onde procurou por seu vestido. Ver-melho,acordoNatal.Acordapaixão... Ela segurou o vestido diante de si, aoespelho,esorriuaprovando.Acorvi-brante parecia irradiar força e destacar o leve rubor de suas faces antes pálidas, o negroônixde seusolhos e infundirumbrilho de cobre aos cabelos castanhos elongos. Vouficarbonitapara...para...parao meu amor. Apesar da alegria, uma pequena pontadadetristezatoldou-lheosemblan-te.

*** Eleestavalá,comoelahaviaplane-jado... Alexandre, juntamente com sua mãe, seu pai e os irmãos... Ele viera. Ela desceu as escadas, para recepcionar os convidados,eficougratapeloarembeve-cido de todos os familiares diante dela, e os elogios à sua decoração de Natal. ― Devo tudo à Léia, claro – elaanunciava,olhandoparaaprima,incan-sável em arrumar os presentes debaixo do pinheirinho, trazer os arranjos de florespara a mesa, os pratos, o belíssimo peru dourado e rodeado de fatias de laranjas e maçãs. Sentiu-se grata à prima por todo aqueletrabalho. Então, sempre conversando com um e outro, ela dirigiu-se até um canto da sala, onde estava Alexandre, parado, com um pequeno embrulho arrematado porfitadecetim.

―Éparavocê,Danna. ―Obrigada...Alex. Os olhos dele mergulharam nosseus, em um afago silencioso, macio e erótico...elasentiuqueaspernasficaramtrêmulas. ―Nãovaiabrir,Danna?–Eleper-guntou. Quando ela meneou a cabeça e começou a desfazer o laço, Léia puxou-a de leve pelo braço, dando um sorriso de desculpas para Alex. ―Vocêprecisa fazero seupedidode Natal – anunciou Léia, com o mesmo rostocorado,olhosreluzentes,queDan-na notara antes. ―Como?Oquê...? ― Seu pedido de Natal, Danna! –Léia disse, sempre sorrindo. – Esqueceu-se que Papai Noel pode realizar algum desejoseuhoje...? Danna sorriu da brincadeira da pri-ma, e para livrar-se logo dela, assentiu. ―Claro,voufazer... ―Temqueseragora... Léiaolhouparaorelógio,quemar-cava quinze minutos para a meia-noite. ― Ora, que bobagem, Léia... Vocêhojeencarnoumesmooespíritodacoisa,heim...? – Danna brincou, lançando umolharnadireçãodeAlex. ―Danna,porfavor.Éasuachance!–TornouLéia, comumavozestranhaerouca. Danna fechou os olhos, e pensou:Minha prima está meio maluca hoje...bem, mas não custa brincar um pouco... queseja...desejoencontrarhojemeuver-dadeiro amor. E que seja eterno. ―Pronto! ElasorriuparaLéia,quesoltou-lheo braço e saiu alegremente, em direção à mesa da ceia. Mas quando voltou-se para Alex, nãooviumaisnolugarondeotinhade-

Page 12: Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

12

Temas do Sobrenatural

ixado.Olhoudesanimadaparaopacotede presente em suas mãos, e depois abriu-o, com um movimento nos ombros. Era um belo estojo de madeira artesanal, com a tampa esculpida emmotivos florais eforrado com um veludo cor de creme. Lindo,mas semnenhum significado es-pecial...bem,oquêelaqueria?ElaeAlexandremaltinhamconversado,nos últimos dias, mal tinham se visto...nem sequer tinham conversado sobre...sobre a situação atual dela. Procurou por Alex, entre os convi-dados, e não o viu. Então, ouviu um ruído às costas e percebeu a porta que dava para os jardins da casafechando-se. Suspirou. Co-locou o presente sobre um aparador e foi na direção da porta que se fecha-ra. E como se um filme começasse ase desenrolar den-tro de sua cabeça, ela reviu tudo... desde o começo. Lem-brou-se, não de Alex, mas de Ulisses. Lembrou-sedecomohaviamsecon-hecido...onamoro...ospasseiosnosdiasquentes de primavera, as mãos dadas, as trocas dos primeiros beijos...e depois... E depois a felicidade de um casamento que parecera perfeito... que fora perfeito... por que...porquetudoacabara? Ela sentiu de repente toda a onda de tristezaque,pordiasafio, tentaraman-ter estancada dentro de si... Mas a onda minou sua resistência, desceu com a fúria selvagem de uma tempestade, explodin-do dentro dela... Ela segurou o trinco da porta com mãos trêmulas, sem saber ao certoseaabria,seadeixavafechada,sevoltava para seu quarto...

E quando sentiu que as lágrimas inundavam-lheosolhos,elaabriuaportae saiu para o ar fresco da noite. Seu vulto esguio, elegante, era uma aparição espectral e rubra dentro da noite morna. Começou a andar sem rumo pelo jardim, respirando o ar perfumado pelas flores dos grandes pés de flamboyantsqueladeavamoscaminhosentreoscan-teiros. Deveria procurar Alexandre? Masparaquê,perguntavaumavozinhamal-dosa em sua cabeça. Durante anos ela es-perara por ele... e hoje chegara a hora...

Mas será mesmo que era por Alexan-dre que esperara?Ele fora, sem dúv-ida, o homem quepovoara sua imagi-nação, desde que o conhecera... Seurosto bonito e infan-til de olhos claros,cabelosfinos e lou-ros. ―Mas faleaver-

dade, Danna. O que mais tem Alexandre de especial, além de um belo rosto imber-be? Avoz agora não vinhade sua ca-beça, mas de alguém que, subitamente, esgueirava-seentreassombrasdosflam-boyants, uma criatura pequena, de voz finaeesganiçada,equeuminstanteatráselajulgouserLéia.Entãoelafirmouosol-hos,eviu:Eraafigurinhaquesepassarapor Léia, mas não era a prima na verdade. Eraumamulherzinhaderostosorridente,muito corado, cabelos anelados e brancos eolhinhosvivos. ―Quemévocê?–Eladeuumpassoatrás,semreconheceravelhinhadeolhosbrilhantes. ―Nãoétãoimportanteagorasaber

para os jardins da

sobre um aparador

ra. E como se um

às costas e percebeu

Page 13: Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

13

Temas do Sobrenatural

quem sou... Digamos que sou um duende deNatal–avelhinhadesatouarir. ―Issonãotemgraça! ―Danna,pense...OquetemAlex-andre de especial para que você esteja tão apaixonadaporele...?-Insistiuamulher. Danna ficou por instantes meiotonta... tinha tomado apenas um copode champanhe,nãoerapossívelque es-tivesse bêbada. Mesmo assim, sentia-se tomadaporumaestranhasensaçãodeir-realidade, e quando respondeu à criatura, era como se falasse consigo mesma, ou es-tivessesonhando: ― Alexandre...? Bom, nada... Eleé bonito... Embora, eu deva confessar, Ulisses também seja... Ela relembrou, com uma profun-dadorquelheesmigalhavaocoração,orosto moreno e anguloso de Ulisses, seus grandesolhoscastanho-esverdeados,oscabelos escuros e sedosos... E como ela sentia-seorgulhosaportersidoescolhidapor ele. E o sentimento de humilhaçãoquandopercebeuqueavidaprofissionalativa do marido, suas viagens constantes, a carreira de sucesso, sua escalada social, o estavam tirando dela... ―Porquêvocêdeixoudeamá-lo,Danna? – O pequeno duende femininoolhavaparaela,comoselesseseuspensa-mentos. ―Ulisses...?Sim,euachoquedeixeide amá-lo... – E uma súbita certeza cres-ceu dentro dela, engolfando-a como uma onda e abalando seus alicerces emocio-nais. – Não! Eu nunca deixei de amá-lo... Nunca... Para mim ele sempre foi o mais belodoshomens... Elasoluçoubaixinho. ―Eeletambémtinhaoutrasquali-dades, minha querida? – Perguntou amulherzinha,comumavozdoce. ― Sim... Sempre foi educado... egeneroso.

Ela relembrou de quanto Ulisses a mimara, quando percebera os ciúmes dela, o quanto ele tentara desfazer as más interpretações que ela fazia de suas viagens, acusando-o injustamente de ter outrasmulheres. Ele sempre tentaraapaziguá-la, agradando-a, fazendo-lhecarinhos,comprando-lhepresentes,sain-do com ela sempre que possível. Mas ela sempre estivera cega a tudo isso. Diante de seus olhos e de seu ciúme doentio,ele fazia tudo aquilo para compensá-la ou aliviar um pouco o peso da culpa que sentia. Ela achava que ele tinha que teroutrasmulheres,ouquenãopodiamaisamá-la... afinal, um homem em ascen-são profissional, bonito, elegantes, rico,nãopoderiaamarumamulhermedíocrecomo ela... Alguém que nada fazia além de gastar seu dinheiro e badalar pelomundo,semumaprofissãodecente,semum diploma universitário, uma carreira digna. ― Então, minha querida... O queseparouvocêsfoiseuciúme,estoucerta? ―Sim,foi...eletalveznuncatenhame enganado... não sei... ―Não,querida.Lembra-sedecomovocê contratou todos aqueles detetives paraseguirem-no...? Sim, ela se lembrava. Contratara de-tetives,eemboraelesjamaistenhamtra-zido prova alguma da culpa de Ulisses, aindaassimelacontinuoudesconfiada... ―EununcaacrediteinasinceridadedeUlisses...semprefuimuitomesquinha.Tornei-me tão irascível que ele não su-portou-me mais... brigávamos constante-mente... e tudo por que eu provocava... ―E foi assimquevocê criouparasi mesma a ilusão de amar Alexandre, o primo jovem e mais tímido de Ulisses... certo?–Perguntouaindaamulherzinha. ―Sim...Alexandrenuncateveumacarreiramuito brilhante. Sempre foi um

Page 14: Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

14

Temas do Sobrenatural

homemmaisreservado,tímido,pacato.Ébonito, mas creio que... só isso. E a idéia de apaixonar-me por Alex talvez tenhasido por isso... ele jamais me causaria tan-tos ciúmes, jamais me deixaria tão inse-gura... ―Ulissesnuncadeixoudeamá-la,querida. Só você mesma. Você deixou de amar-se, quando pôs em dúvida o amor de Ulisses por você. Quando acreditou ser uma mulher sem graça e medíocre.Quando imaginou-se feia e deselegante. Olheparasimesmaagora.Vaienxergaramulherbonitaqueé,amulhercharmosa,inteligente e graciosa que Ulisses amou e ainda ama... De repente, uma brisa mornou so-prou pelo jardim, fazendo com que as folhasdasárvores ressoassemcomomilsininhos, as flores esvoaçando por todolado, como pequenos flocos de neve.Danna piscou, atordoada... estivera con-versando...comquem...? Ela olhou à sua frente, e não viumais a mulherzinha de cabelos brancosque se passara por Léia. Onde estaria a tal criatura?Oqueacontecera?Quemera? Estou definitivamente louca, pen-sou Danna. Passados os feriados, irei con-sultar um médico... agora dei para con-versarsozinhaeteramigosimaginários,pensou ela, sentindo um frio no estôma-go. Notou um movimento atrás de si e virou-se, pronta para levar outro susto. Dessavez,seriaoCoelhinhodaPáscoa?OuaMula-sem-Cabeça? ―FelizNatal,Danna. O homem à sua frente sorriu-lhe,com seus dentes fortes, o rosto moreno com uma barba incipiente, os olhos es-verdeadosbrilhandodeemoção. ―Ulisses! Eraoutraalucinação? ―Eu...eufiqueipensando...muito

emnós,Danna–eledisse.–Echegueiàconclusão que não gostaria de passar soz-inhooNatal.Queriapassá-locomvocê. Elaolhouemtornodesi,umpoucoatordoada. ―Comigo...?Masnós... ―Eusei,eusei...masDanna.Penseum pouco. Tudo o que falamos aquele dia, um ao outro... as coisas de que você me acusou... doeram muito. Mas eu pos-so entender seus sentimentos de ciúme, coloquei-me em seu lugar. Eu também ficariaenciumadosevocêviajassetanto,passasse tanto tempo longe de mim. Eu gostaria de recomeçar tudo, Danna. Danna estava surpresa, e quando iaresponder,amulherzinhadoscabelosbrancos passou por eles, dando uma pis-cadela. Ulisses olhoupara ela, e franziu atesta. ―Hã...queméafigura...? ― Uma... vizinha... um pouco ex-cêntrica, mas uma boa pessoa...Ele também a viu, pensou Danna. Não era uma alucinação. Ulisses sorriu. E continuou, toman-do as mãos dela entre as suas: ―Eentão,meuamor?Vamostentarnovamente...? ―Ulisses... você sabe que sempreamei você. Mas a vida que levávamos... não, não suportarei continuar daquele jei-to. Você sempre viajando... eu me sentin-doaúltimadasmulheres...não... ― Meu amor, você sempre foi aprimeira e a única para mim – ele disse, puxando-a para o peito largo. Danna sen-tiu novamente a fragrância masculina que ele usava, com um arrepio de excita-çãotomando-lheocorpointeiro.–Maseupenseimuito... E se foiminha profissãoque se tornou a barreira entre nós, isso pode ser mudado. ― Como assim? – Ela perguntou,

Page 15: Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

15

Temas do Sobrenatural

sem acreditar no que ouvia. ― Eu tenho um capital guardado,vocêsabe...chegouahoradeabrirminhaprópria empresa. Nossa empresa, na ver-dade... e quero você comigo.Minha só-ciaediretora,oqueacha?Vocêestaráaomeu lado em toda parte... Ele riu, e ela também, sem acreditar no que ouvia. ―Suasócia...vocêquerdizerque...eutrabalhareidentrodaempresa...aoseulado? ― Exatamente. Você sempre tevetino para os negócios. E uma grande veia artística. Ninguém melhor para ajudar-me a administrar uma empresa de mar-keting, principalmente no que se refere às artesgráficas. Danna mal podia acreditar no que ouvia. Era mágica. Pura mágica. Pensou: amanhã vou acordar e perce-ber que tudo não passou de sonho... Mas então abraçou com mais força o seu marido, sentiu o perfume dele, e de-pois o roçar de sua barba em seu rosto, o toque de suas mãos, o beijo profundo, a língua dele enroscando-se na sua... e a excitação... e sentiu que era tudo real.

Mais tarde, tornou a reunir-se aos convidados para a ceia, ao lado de Ulisses.

Notou Alexandre também, que a olhavacomomesmoolharterno,porémsombreado por algum tipo de mágoa ou desapontamento. Lamentou por isso, lamentou por tê-lo feito imaginar coisas, mas ao mesmo tempo sabia que ele iria esquecer, e logo encontraria uma mul-her, alguém que o faria tão feliz quan-to ela estava sendo naquele momento.

Mais tarde, quando o último con-vidado deixava a casa, e a noite de Na-tal esvaía-se nas sombras da noite, ela e

Ulisses viram-na novamente: Um vulto pequenino e alegre, andando ligeira em direção ao portal e acenando para eles. ― A sua vizinha engraça-da está indo embora – disse Ulisses. ―Precisoconversarumminutinhocom ela... Dannacorreuatéamulherzinha,antes que ela saísse. ―Espere!Quemévocê,afinal?–Dannaperguntou,decenhofranzido. ―VocênãoacreditanememPa-pai Noel. Como vai acreditar na Mamãe Noel...? Disseela,dandoumarisadinhaeuma piscadela e saindo rápida através do portão.

***

Fonte:Jossi Borges,

Presente de Duende, conto publica-doem2009,nositeRomanZine.

Page 16: Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

16

Temas do Sobrenatural

O VeLHO LOBiSOMeM Leniria r. Silva

CAUSOS E TEXTOS enviados por minha amiga Leniria Santos.Como ela, eu também fiquei ar-repiada com as histórias narradas. Os mistérios sobrenaturais são mui-tos,omundoestácheiodeles.Vocêtam-bém está preparado para sentir alguns ar-reipios?Entãoleia.Masnãoleiaànoite…

VOUcontribuircomumahistóriaqueopovoládecasaconta...Quandoeutinhauns onze anos no bairo em que eu mora-va tinha um senhor bem idoso, que to-dos comentavam que era um lobisomem.

Embora existisse esse boato, não tinha ainda relatos de aparições.Minhahistória aconteceu em um daqueles in-vernos muito rigorosos aqui do sul, sabem... Tem noites muito escuras e geladas, que se você levanta de madru-gada não vê uma viva alma na rua.

De repente começaram os rumores sussurados sobre um enorme cão negro, queagitavaoscãesdetodaavizinhança.Uivos madrugada adenro, principalmentenaquelas em que a bruma tomava con-ta das ruas e a névoa branca não per-mitia ver um palmo na frente do nariz.

Minhacasaerabemna encru-zilhada,localondeduasruassecruzam,formando uma cruz. Bom, aqui no sul existe um misticismo que é o local exato onde ocorrem as transformações do lobi-somem, e para completar o quadro assus-tador, não existia cerca ou muros ao redor daminhacasa,costumedeumbairroan-tigoesemohitóricodeviolênciadehoje.

Em uma dessas noites geladas e soli-tárias,minhavizinhadolado,queeraumasenhorademuitaconfiançaeconceitua-da no bairro como pessoa séria, estavaaguardando o filho chegar do tra-balho, pois iria ficar até tarde eviria com o carro da empresa para casa, quando começou a agitação.

Nós tínhamos uma cachorra mui-to brava que não deixava cão algum se aproximar dela sem brigar.Conta essa minha vizinha que um enorme cão ne-groinvadiumeuquintalenenhumcãoseaproximava dele, que rosnava muito, bra-vo e fazia com que todos os outros se en-colhessemapavorados,atéanossaLassiese recolheu assustada para sua casinha.

Minha vizinha viu tudo pelafresta da janela e viu quando o bi-cho fez toda a volta na casa e ficouparado, encostado na parede do meu quarto, que eu dividia com minhas ir-mãs e lá ele ficou arranhando o chão.

Bom, os casos continu-aram até o final do inverno e só

“Odolobisomemocorreucomminhafamília quando eu era criança, o da

mulherdecinzadiziamqueassombra-vaoprédioondeeutrabalhavaeesse

dos ‘pés de pato’ ocorreu com uma amigaminha,quesearrepiavatodaao

contar!”

Leniria Santos

Page 17: Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

17

Temas do Sobrenatural

acabaram quando o tal velho faleceu...

Arrepiante, mesmo... Eu nun-ca tive um caso tão próximo, assim. Naturalmente, houveram relatos maisantigos sobre o tema ‘lobisomem’, como os que meus pais e avós con-tavam. Mas assim, tão recente, não.

FONTE:Leniria R. Santos

[email protected]

PARA SABER MAIS:Dicionário Seres Fantásticos,

J. Felipe AlonsoA besta de Exmoor: Fato ou lenda?

Countryside Productions.Dicionário do Folclore Brasileiro,

Luís da Câmara Cascudo.The History of Ghosts, Vampires and

Werewolves,Douglas Hill.

The Werewolf in Lore and Legend,Montague Summers.

Page 18: Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

18

Temas do Sobrenatural

Matilha

Noiteclara.Luacheianofundodocéu. Amatilhacorreemsilênciopelode-clive sinuoso, vencendo a larga distância atéaplaníciedeprata.Ochamadodeumdos seus é imperioso – um apelo angus-tiado, impactante. A voz do sangue vem até eles como uma corrente de fogo, im-pulsionando músculos, ossos, tendões. Breve o alcançarão – para socorrê-lo, ou lutar até a morte contra o invasor que ad-entrara seu território.

Kyeran enviou um comando ao grupo, apontando a trilha alternativaatravés da qual seguiriam dali em diante, paralela à imensidão branca e vazia, des-pida de vegetação. O manto de gelo acu-mulado sobre o solo mostrava-se intacto, semsinaldevida,humanaounão.Zel,àsua direita, volveu a cabeça ligeiramente por sobre o ombro, farejando os diversos aromasdoar.Acenou-lhe,umelevardis-cretodofocinho,informandoapresença

NOite de Prata

M. Blannco

de inimigos. Apressaram-se, as patas riscando o caminhonumsó ritmo.OpelodeKi-eran eriçou-se sob a intensa e repentina descarga de adrenalina.

A Forasteira

O líquido escuro alastrava-se sobre a superfície imaculada, lenta e ininter-ruptamente, como um rio, formando um rastro visível por quilômetros, alertando predadores, instigando a voracidade dos seres da noite. O ferimento na coxa era grave, o sangue jorrava em profusão – tênue vestí-gio de cor no tapete branco –, sugando preciosos calor e energia vital. Não so-breviveriaemtaiscondiçõesenãotinhacomo encontrar um abrigo seguro antes deesvair-senofluxovermelho,antesderender-se à inconsciência. Uivos. Agudos, assustadores, preenchendoovaziodovento,abafandoseu arfar descompassado, os batimentos erráticos de seu coração. Os espasmos

Page 19: Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

19

Temas do Sobrenatural

intermitentes de dor a pouco e pouco ar-refeciam, acusando a dormência e insen-sibilidade traiçoeiras, subsequentes ao es-gotamento da dor.Eladesgarrara-sedaequipehorasatrás, examinando as pegadas de um ani-mal. Perdera-se na extensão embriaga-dora da tundra. E, então, escutou o tiro – um estampido ressonante perturbando a noite –, e uma fisgada violenta acimado joelho a fezperder o equilíbrio, des-moronar. Mais disparos. E gritos, os dela, tentando-se fazer ouvir. E, novamente, o silêncio opressivo e absoluto. Não devia mexer-se – perderia as for-ças e tornaria mais difícil a possibilidade de resgate. Mas o pavor de ser abandona-da ali para morrer era mais premente, não permitia que parasse. Em meio ao estado de desorientação, à fraqueza crescente, distinguiu os vultos cinzentos acercando-se, velozes, determinados, para frearem bruscamente diante dela. Lobos. Lobos enormes, parados em for-maçãocircular,osolhospenetrantesfixosnela, o pelo denso do pescoço literalmente em pé. Notou a visão saindo de foco. Fiaposdenévoauniram-seamilharesdepontos negros minúsculos, formando um véu opaco, vago e disforme, que consum-iu a paisagem deslumbrante.

Kyeran

Caçadores.Kyeranconheceoodor,podeper-cebê-lo a muita distância.Aproximidadedoshumanosarrepiaseufarto pelo prateado, acelera a circulação, imprime uma velocidade louca ao pulso em sua nuca. Ordenou ao clã que assum-isse a forma animal tão pronto o cheirode pólvora e sangue agrediu as sensíveis

narinas de Zel, e o lamento de um dosseus foi emitido. O chamadodo sangue.O elomais poderoso que os unia, somente su-perado pela voz da noite, a mesma que os empurrava rumo às fronteiras da terra, a perseguir a caça, quando podiam libertar-sedavestimentahumanaeseintegraràplanícieselvagem.Estaerasuaherança,amarcadesuaancestralidade.Metadehu-manos, metade bestas. Mas o sangue que os interligava também seduzia e atiçava os caçadores. Perseguiam o povo de Kyeran por tantas erasquemalosvelhosselembravamdosdias em que sua gente andava livre pelo mundo. As lendas contavam que as matil-has se espalhavam por todos os cantos,divididas em clãs numerosos. Não mais. Agora se ocultavam entre seus inimigos, vivendo nas sombras. Kyeran liderava oclãdaGarradePrata,quehabitavaasregiõesextremasdonortecongeladoha-via gerações. O bando agrupara-se para sair em busca do irmão agonizante. Não perten-ciaanenhumdosclãs.Umforasteiro,ouum visitante, talvez, pois um clã não in-vadia o território de outro sem permissão do líder, o que aumentava a urgência do resgate. Seu irmão estava sozinho, umalvo fácil rodeado de predadores vorazes.Kyeran estacou, deteve-se para aspirar a mistura de odores carregada pela cor-rente fria. Calculou quanto tempo levaria para alcançarem o local e se podiam de-spistar os caçadores e as criaturas da noite que vagavam pela tundra. Virou-se para o grupo, avaliou cada um deles e desta-couZel.Deu-lheinstruçõesprecisas.O lobo branco aquiesceu e apartou-se da matilha,metendo-seporoutra trilha, aoabrigodamuralhaderochanua. Ele confiava emZel.A índoleindomável, o gênio irascível, causavam

Page 20: Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

20

Temas do Sobrenatural

atritosnobando,masela tinha instintosextremamente desenvolvidos e sua re-sistênciafísicaeranotável.Zelpodiaper-seguir uma presa por mais tempo e com mais eficiênciadoque elepróprio, líderdo clã, embora fosse a mais jovem do ban-do.Eleahaviaencontrado–machucada,atada por grossas correntes, a um passo da loucura. Custou a recuperar o vigor, a incorporar-se ao grupo. A brutalidade a que fora submetida subtraíra sua hu-manidade e lucidez. Kyeran não sabia da históriadeZel,masdesdeoprincípiofi-cou claro que ela sempre estaria por um fio,àbeiradoprecipício.Jamaisretornouà formahumana,preferindoa liberdadee a quietude do lobo. A única conexão que conservava com a outra metade de sua natureza era a lealdade que devotava aKyeran.Nuncafalharaemumamissãonemdesapontaraamatilha.

Caçadores

Lobos. Feras. Estavam perto. A familiar sensação de desconforto indicava a presença deles, nãoobstanteelenãohouvessedescobertovestígiosdamatilha.Adiantara-seaoscompanheiros,comodecostume,por seromelhor ras-treador, curtido nos rigores do ambiente inóspito da região gelada.Já se defrontara com a matilha antes.Anos atrás. Lembrou-se do líder, o impression-ante lobo cinzento de dorso prateado, e do fulgorqueemanavade seuolhar in-clemente. Kyeran. Haviam-se enfrentado uma vez. Seu oponente poderia tê-lo aniquilado, masdeixou-ovivo.Talvezhouvessepr-essentido os outros humanos, caçadorescomoele.Talvezoachasseinsignificante

demais, ou não o quisesse morto ainda. Compreendia que estavam destinados a encontrar-se muitas vezes naquele tem-po, até que um deles tombasse, ou ambos estivessem exaustos. Ele não sabia dizer.Nãolhetinhaódioourancor.Kyeranforaseu irmão um dia, andara a seu lado por muitastrilhas.Riram,trocaramconfidên-cias e esperanças, beberam e comeram juntos, dormiram ao redor do fogo, em-baixo do céu marejado de estrelas, em-balados pela música da noite. Ele amara Kyeran, talvez o amasse ainda. Sentia tanta falta dele que o peito lhe doía, aopensar no que haviam partilhado. Maso amigo, seu irmão de alma, não era um homem,nãocomoele.Nuncaderaouvidosàshistóriasqueoshomensdasmontanhascontavamnas noites frias, a ingerir aguardente, após a caçada, ou nas lendas que corriam de boca em boca pelas aldeias. Até ver Kyeran assumir a forma da besta diante dele – um monstro, uma aberração, algo que sequer devia existir.Atéconheceraverdade. Kyeran era uma criatura da noite, um ser dividido entre a luz e sombra, metadehomem,metadefera,descenden-te de um povo amaldiçoado, quase ex-tinto.Ochamadodosangue–comode-nominavamovínculoqueuniaamatilha,composta de indivíduos de uma mesma linhagemouclã–vieraaelecomamortedopai.Osmaisvelhosdogrupoprepara-vam a cerimônia de iniciação, quando o novo integrante era ungido com os óleos domistério e da visão, banhado com aágua negra resultante da maceração de er-vas e raízes, coberto com as vestes rituais e,porfim,levadoaocírculodepoder,emtorno do qual se reunia todo o clã para invocar o espírito ancestral do lobo. A transmutação que ocorria a seguir incor-poravaaformaanimalàformahumanae

Page 21: Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

21

Temas do Sobrenatural

permitiaqueohomemsetornasseloboeolobosetornassehomem.Masapenasolobopodiacaminharnanoite,sobapro-teção do luar, a luz de prata. A gente das aldeias não gostava de lobos. Lobos eram feras perigosas e fa-mintas, atacavamrebanhoseperegrinossolitários no inverno. Batedores como ele vasculhavam a tundra à procura depegadas, incansáveis, mortais. Dizima-rammatilhas inteiras.ExcetoadeKyer-an. Porque eles não eram como os outros. Tinham habilidades sobrenaturais, mis-turavam-se às pessoas comuns, passavam despercebidos na forma humana. Cap-turara um deles, uma fêmea, uma besta medonhaquedespedaçaraagargantadedois dos melhores caçadores da região.Mas Kyeran o impedira de exterminar a fera. Novamente, o inverno cobria a tundra. Os uivos longínquos denuncia-vam a vinda dos lobos. E a proximidade damatilha.Há dias perseguia um deles. Avistara-o na formahumana,masconseguiaidentificá-los muito bem. Todos exibiam a marca de suamaldição:aquelesolhosdescorados–um cinza metálico que paralisava os ner-vos e afugentava a coragem dos bravos – e a garra de prata tatuada no antebraço esquerdo.

Resgate

Olhosdeprata. A primeira coisa que surgiu em seu campo de visão. Como uma imagem refletidanoespelho.Elaprópria. Forçou-se a erguer o tronco, apoian-do-se nas mãos nuas, entorpecidas pelo frio. Precisara retirar as luvas para impro-visar um torniquete.Desmaiara, imaginou, pois sentiu que se ausentava da realidade, como num son-

ho.Nãoconseguiadizerquantotemposepassara desde o momento em que as per-nashaviamfalhado,nãomaissuportan-doseupeso.Tinhaumavagarecordaçãodetervistolobos,vários.Nãotinhacomoafirmar. Acordou debaixo de uma manta de peles, sentindo o calor no rosto, o suor grudando-se à pele. Ao fundo, o ruído de madeira estalando, sendo devorada pelaschamas.Tentoulibertar-sedocasu-lo formado pelas cobertas, mas a pontada súbita naperna tirou-lhe a estabilidade.Concentrou-se em regularizar a respira-ção para espantar a náusea e a vertigem. Uma mão áspera e endurecida pousou em sua testa, deslizou pelo maxi-lar até o pescoço, detendo-se no ombro. Suave como a carícia de um amante, acol-hedoracomoumrefúgioseguro. Elafitouodonodaquelamão,avaliou o homem atlético agachado aoseu lado. Notou os músculos rijos e volu-mosos que as roupas grossas não alcan-çavam esconder, a aura de poder e auto-ridade que se desprendia dele. Calculou que seria bastante alto, a julgar pelo com-primentodosmembros.Tinhaumagraci-osidade felina, elástica; ao mesmo tempo, transpirava ameaça e perigo. Um preda-dor. Nãodesgrudavaosolhosdele,dorostobemfeito,masgrave,delinhasretas, duras. Os cabelos lisos e bastos à al-tura do queixo, a barba por fazer, a cica-triz gravada na têmpora: detalhes queacentuavam o porte real, majestoso. Mas o traço marcante daquela face incomum eramdefinitivamenteosolhos,quecausa-vamestranhezaemal-estar,deumcinzamuitoclaro,metálico.Olhostranslúcidos,hipnóticos,implacáveis,cruéis.

Zel

Page 22: Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

22

Temas do Sobrenatural

Humanos. Caçadores.Zelfarejaraseurastro. O que ia à frente colocara boa distância em relação aos demais. Um bat-edor, talvez. Ela continuou margeando a paredederocha,devagar,nadireçãodovento, assim como o humano. Tambémele queria passar despercebido, tornar-se invisível. Era experiente. Mas não o bastante para os sentidos treinados do lobo branco. Zeloencontrariaemqualquerlugar.Reconheceuocheiro,aspisadasleves, a respiração pausada, o modo como os dedos alisavam a camada de neve fr-esca.Lembrou-sedaarmadilhacomden-tesdeaço,cortantescomonavalhasafia-das,quehaviamlaceradoepenetradosuacarne, triturando, rasgando. Lembrou-se dos olhos baços no semblante inexpres-sivo que observava sua agonia. Lembrou-se do sangue, seu sangue, tingindo de rubro o manto prateado que revestia a tundra. Recordou-se de afundar num mar escuro, à medida que se entregava ao ab-raço da morte. E da beleza inebriante da vastidão desértica e intocada, indiferente a seu sofrimento. Recordou-se do urro aterrador do lobo cinzento que se proje-tou sobre seu algoz, numa investida cer-teira e mortífera, e de como, no derradeiro segundo, abandonou a presa e voltou-se para ela.Com aqueles olhos hipnóticos,de tiraro fôlego, cheiosdecompaixãoeamor. Kyeran. Ele a salvara. Vira-o transformar-se, tomaraformahumana–alto,umamassade músculos, cabelos negros escorridos, pele morena de tom oliva. Mãos fortes e

destras reduziram a fragmentos inúteis a boca faminta que a devorava.Talvez se houvesse apaixonado naqueleinstante. Talvez o tivesse amado antes mesmodeconhecê-lo,poisumapartedelasempre estivera à espera dele, consciente ou não. Morreria por ele, mil vezes, se isso fosse possível. Mas Kyeran não podia retribuir esse sentimento, não comoZeldesejava.Oafetoquecompartilhavacomele era o mesmo que irmanava os mem-brosdamatilha,seusirmãosdesangue. Aprendeucomeleo chamadodo sangue. Ela a ensinou a ter orgulhode sua estirpe, a entender o que era, não uma monstruosidade, mas um ser ex-traordinário.Masnadadissofoisuficientepara recuperar sua sanidade. Talvez nem mesmo o amor de Kyeran fosse capaz de apaziguar seu coração atormentado, par-tido tantas vezes.Oestalardefolhassecastrouxe-ade volta ao presente.Tinharecebidoumamissão:dis-trair os caçadores. Mas o ódio que revi-rava suas entranhas reclamava justiça,ou vingança. O batedor era inimigo, uma ameaça a seu povo. Não devia estar vivo.Umsomdistintochegouatéela–asvozesdamatilha.O bando encontrara o irmão que precisava deajuda.Umafêmeanaformahumana,ainda não despertada. Sentiu sua dor. E outra emoção, intensa, avassaladora, que emanavadeKyeranparaamulher,algoqueZelnuncaexperimentara.Amatilhaestavaintimamenteconectada,nãohaviasegredosentreeles,anãoserquefechas-sem suas mentes. E somente Zel faziaisso. Essa ligação era essencial para a so-brevivência do clã. Entrar na mente de Kyeran foi um golpe excruciante. Ficou sem ar. As patas dianteiras arriaram, frouxas, enquanto

Page 23: Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

23

Temas do Sobrenatural

ela tentava acalmar o pulso desgoverna-do. Kyeran encontrara sua parceira, des-tinadaaelepordireitoelinhagem,aindaqueamulhernãosoubessedisso.Masoafeto e o vínculo que se formava entre os dois, a maneira como ele a tocava e seus olharessefundiam,nãodeixavamdúvi-da. Eles pertenciam um ao outro. Zel foi engolfada pela alegriae contentamento que tomavam conta da matilha – Kyeran não mais caminhariasozinho, e seufilhoguiariao clãdepoisdele. Queria ter sido escolhida por Ky-eran,estarcomeleatéofimdeseusdias.Sufocou um gemido torturado. E todo o rancor, mágoa e desesperança resumi-ram-senoódiopelohumano. Sacudiu a cabeça para clarear o cérebro. Os olhos prateados chispavam,amentedesligou-sedamatilha.Cegadapela dor lancinante, em seu destino, ago-ra, só existia o caçador. Propositadamente, fez-se pressen-tir por sua presa. Soltou um uivo rouco e aterrador e venceu o declive num átimo, interceptandoarotadefugadohumano.Manteve-se imóvel, à espreita. Ohomemvirou-sesempressa,firmouospés,curvoulevementeotóraxpara frente.Zelimpulsionouocorponumsaltoperfeito e caiu graciosamente às costas do caçador.Girouocorpo,rosnou,chaman-do o adversário para o combate. Homem e animal enfrentaram-se – caçaecaçadoremfacedeumfinalimpre-visto. Na tundra, os papéis se invertiam rapidamente.

Acampamento

Operfumedacarnetostadaencheuseu olfato, fez salivar a boca seca. Estava faminta. Acomodara-se como pudera no

abrigo de peles que fora arranjado para ela junto à enorme fogueira. Haviam trat-ado de sua ferida – o homem de olhosatordoantes aplicara um ungüento recen-dendo a cânfora e mel que amainara a o latejar debilitante e estancara o sangue. Não imaginava que tipo de medicina usa-vam, mas, no pouco tempo que passara, recuperara a sensibilidade da perna. En-saiou alguns movimentos, examinada at-entamente pelo grupo. Especulou se seriam nômades ouexploradores, emboraficasse eviden-tequetinhamalgumparentesco,poissepareciam fisicamente, apesar de peque-nasdiferenças,detalhesmínimos,impos-síveis de serem apreciados num primei-ro olhar. Todos possuíam aqueles olhoscinzentos, prateados, a tonalidade oliva dapele,físicosemelhante–músculosim-pressionantes,flexíveis,esculpidos,agili-dade e destreza inumanas. Pouco falavam entresieofaziamnumidiomadesconhe-cido.Ohomemque cuidarade seus ferimen-tos com uma delicadeza que não combi-nava com as mãos fortes e grandes, mais preparadasparao combate eo trabalhoárduo, cortou fatias da carne assada, de-positou-asemfolhasverdesedirigiu-seaela. O aroma era delicioso, com um toque de especiarias. Observou enquanto ele se sentava sobre as pernas dobradas, partia a carne em pedaços e os envolvia em mi-galhasdepão.Elaadmirouosdedoslon-gos e bem feitos. Viu que ele sorria, um sorriso torto no canto da boca carnuda. Sentiu-se corar. Poderia perfeitamente comersozinha,masasensaçãoeserali-mentadaporaquelehomemmortalmenteatraente, no acampamento esquecido em meio à tundra deserta e gelada, era certa-mente a coisa mais erótica e sensual que já vivenciara.Kyeran.Eracomoochamavam.

Page 24: Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

24

Temas do Sobrenatural

Por mais absurdo que pudesse pa-recer, sentiu-se imediatamente conectada com ele e com os outros. Kyeran a contemplou de uma maneira que fez todo o sangue estacionar em seu rosto, com uma intensidade que a deixou muda. E ela perdeu-se naquele olhar.Umburburinhodevozes começoua in-sinuar-se. Vozes cheias de entusiasmo,risonhas,elevando-seacimadosbarulhosdatundra.Paraseuespanto,verificouqueasconversasvinhamdoshomensreuni-dos ao redor do fogo, embora suas bocas não se mexessem. Um arrepio percorreu suaespinha.Talvezestivessefebril.Kyeran separou outro pedaço de carne. Ela interceptou sua mão, enlaçou os de-dos em torno de seu pulso, um aperto débil, mas que disparou uma corrente elétricaporcadafibradeseuser. – Anna. Meu nome é Anna – falou. – Anna. – a voz era modulada, pro-funda, terna. Ouvi-lo repetir seu nome a aqueceu por dentro. Se não estivesse enfraquecida dev-ido à perda de sangue, abalada pelo frio epelomedoquesehaviaapoderadodelapouco antes, acreditaria estar sofrendo alucinações, porque estava apaixonada por ele. Como se o tivesse amado sem-pre.Tinhatantacertezadepertenceraelecomo de estar viva. Não importava. Optou por embar-car naquele desvario com a sofreguidão de um náufrago ao ser resgatado do mar ciumento.

Confronto

O lobo branco. Reconheceriaabestamesmosenão estivesse diante dele, mirando-o com aquelesolhosaguados,deprataliquefei-ta. A fêmea. Kyeran o privara de seu prê-

mio,tirando-lheoprazerdeacabarcoma vida miserável da criatura. Mas a sorte lheofereciaumasegundachance. O animal o testava, incitava, provo-cava, esperando que cometesse um erro, um deslize. Saltara sobre sua cabeça num movimento inesperado. Para confundi-lo, é claro. Mas ele era um caçador. Apren-dera com seu pai, e com o pai de seu pai, e comoshomensdaaldeiaqueperseguiameexterminavamasmatilhas.Ao contrário dos caçadores, porém, ele sabia que o lobo branco pertencia ao Demônio, assim como todos os que vivem entredoismundos.Nuncachegouareve-lar a ninguém o que sabia, porque não compreenderiam, não conheciam comoele os mistérios e os segredos da noite. Puxou a faca da cintura. Preferia en-frentar o inimigo num combate corporal. Umalutalimpa,leal,honrada.Nãoteriavitóriafácil.Oolharvidradodaferadiziaque o embate somente terminaria após a morte de um deles. Escutou o rosnado do animal. Avançou com cautela. Uma pas-sada curta. A brisa gélida soprou o pelo do lobo. Nem um movimento de seu ad-versário, como se até a respiração da fera estivesse contida.Elecontinuouhesitante,atensãore-tesando seus nervos. Um pouco de medo também.Ohálitoardentedoanimalba-teu-lhenorosto. Um rugido ecoou pela vastidão datundra,seguidodeoutro.Oshomenstinhamlocalizadoseurastroeatiravam,mirando o lobo. Um ímpeto de fúria o invadiu. Praguejou. Girou sobre os cal-canhares, vociferando contra aquelesqueseintrometiamemsualuta,irrefleti-damenteficandode costaspara a besta.Um terceiro disparo passou zunindo por sua orelha esquerda, raspouo corpodoanimal, que emitiu um uivo ensandecido e, sem mais vacilar, pulou sobre ele, en-

Page 25: Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

25

Temas do Sobrenatural

ganchandoamandíbulaemseupescoço,comprimindo sua jugular com garras de ferro. O sangue esguichou de sua gar-ganta aberta. O peso do animal o empur-rou para baixo, enquanto os caçadores derrubavamaferacommachados,facas,paus. A pressão em sua garganta aumen-tou, apagando a tênue réstia de luz, ob-scurecendo o céu espetacular da tundra.

OChamadodoSangue

Zel. Kyeran soube que a perdera. Sentiu a quebra de energia, como um elo partido na corrente.Nãopressentiuoperigo,Zeldesco-nectara-se da matilha – ela gostava dosilêncio, preferia manter seus pensam-entos em segredo, uma atitude perigosa paraogrupo.Contrariandoosconselhosdosmaisvelhoseseuprópriojulgamen-to,KyeranaceitavaarebeldiadeZel,erasua forma de amá-la. Se a pressionasse demais, poderia esvair-se de vez. Ondas de frio. Dor.Eledeixou-secairdejoelhos,mor-tificado, levando as mãos ao ventre, aoburaco que se abria em sua carne. Sentiu-seasfixiar,ocoraçãoconstrito.Osbraçosamorosos de Anna enlaçaram seus om-bros, amparando-o, acolhendo-o emseucolo macio. Lágrimas brotaram de seus olhos e desceram abrasadoras, umede-cendo o rosto distorcido pela ira. Seu pranto convulsivo calou a tundra. Por um instante, a felicidade de en-contrar sua parceira foi ofuscada pelo de-sespero.AmaraZel,maisqueanenhumoutro, não o amor que ela esperava e que nuncalhepertenceria,porqueelanãoerasuacompanheiradealma. Anna enxugou suas lágrimas com beijos, afagou sua testa, correu os dedos por seus cabelos, aqueceu seus lábios com

osdela.Kyeranquismergulharnaqueleolhar de prata, de um brilho incandes-cente,osolhosdeseupovo,olhosquees-tariam para sempre com ele. E apesar da agonia insuportável,maravilhou-se comas dádivas do Universo, que enviara uma mulherdosconfinsda terrapara cruzarseucaminhoexatamenteali,naquelepre-ciso momento.

Alvorada

Humanos. Caçadores. Assassinos. Nunca os deixariam em paz, nunca osdeixariamviver,criarseusfilhos. O ódio cru e primitivo reclamou sua alma.Jamaisviveriamjuntoaoshumanos,como iguais. Parte dessa crença desapare-ceuquandoseumelhoramigoorenegou,como se ele fosse indigno. A expressão dehorrorcomqueofitara,omodocomocuspira seu desprezo, o asco que vira nele, embruteceram-no. Rolan era seu irmão, a quem ele amou incondicionalmente, o mesmoamorquededicouaZel.Não,nãohaveriapaz,porqueoshomens eram vítimas da ignorância, deDeuses e Demônios, enxergavam o mun-do em branco e preto, incapazes que eram de distinguir os variados matizes de cinza existentes no mundo.

A noite esmaecia, faixas avermel-hadassubindonohorizonte.Annaador-mecera em seus braços, exausta, encol-hidaemtornodele.Poucohaviamfaladoehaviamuitoadizer,elaaindanãodes-pertara–nãoconheciaoespíritodolobo.Mas Kyeran podia ver seu futuro com ela. Um dos dons de seu povo: a visão. Embo-ranenhumdelesfizesseusodessepoderem vão. Antever o que está por vir trazia mais sofrimento do que esperança. Por isso, recusara-se a espiar o fu-

Page 26: Temas do Sobrenatural Revista digital de Literatura ...

26

Temas do Sobrenatural

turodeZel.Tinhamencontradoocorpo,ouoquerestara dele, destroçado, esquartejado, a cabeça decepada, carregada como um troféu,certamente,namochiladealgumcaçador.Haviasanguehumanotambém,em quantidade, misturando ao sangue de Zel.Talvezelativessesidoacuada,talveztivesseatacadoohumanonatentativadefugir. Mas o coração de Kyeran contava outra coisa,diziaqueZelpartirapara amortecomumafirmeresolução,comosenãohouvesseamanhã. Ele e os outros entoaram cantos, entregaram sua irmã aos elementos, enviaram preces aos antepassados, ui-varam para a lua. E reuniram-se para re-cepcionaraalvorada,outroamanhecernosolo inóspito da tundra, seu lar, enquanto os derradeiros suspiros da noite esgueira-vam-se para longe da planície de prata.

Maya Blannco nasceu no Rio de Janeiro, cidade onde vive até hoje. Formada em Arquitetura e Direito, trabalha, atualmente, na área jurídica. Expõe seus textos na internet, em blogs, sites, co-munidades e em seu próprio blog, criado para divulgar um folhetim que está escrevendo. Conheça o site Contos e Folhetins.

Conheça novos autores brasileiros de ficção, fantasia e sobrenatural!

Pelo Clube de Autores,:BEIJOS & SANGUE

Uma antologia com o melhor do conto so-brenatural moderno do Brasil. Novos autores mostram o lado fantástico, sombrio e bizarro

do amor: Romances de tirar o fôlego, ao mesmo tempo comoventes e assustadores. Na presente coletânea, quatorze contos apresen-tam mitos ligados às histórias e lendas urba-nas de terror, todos com seu toque misterioso de romantismo. Os novos autores brasileiros chegam trazendo novas facetas do vampir-ismo, da magia e do horror. Com seu estilo

inovador e inusitado, nos apresentam ao mun-do fascinante do amor mórbido entre humanos e monstros, vampiros, lobisomens, fantasmas, demônios e bruxos. Prepare-se, porque eles

vão invadir sua vida e seu coração!

Contatos com autores e/ou editores desse zine:[email protected]